jueves, 5 de noviembre de 2015

2011 - BALADA LITERÁRIA



Comemoração aos 80 anos do poeta

AUGUSTO DE CAMPOS
 
homenageado da Balada Literária 2011





- A Balada começa na noite do dia 16/11, no SESC Pinheiros, com um show de Augusto de Campos, Cid Campos e Adriana Calcanhoto. 

- Dia 17/11, às 17h30, o Centro Cultural b_arco recebe Caetano Veloso e o homenageado do evento para uma conversa sobre “O pulsar – concretismo e tropicalismo”. 




quarta-feira, 16 de novembro de 2011
Balada Literária começa hoje em São Paulo 

Sara Saar

Do Diário do Grande ABC





Um dos principais eventos literários de São Paulo começa hoje e segue até o dia 27. Em sua 6ª edição, a "Balada Literária" se espalha por oito endereços em homenagem ao poeta, tradutor e crítico Augusto de Campos.

Idealizada pelo escritor pernambucano Marcelino Freire, a iniciativa tem entrada franca, exceto a sua abertura com a apresentação de Augusto de Campos, Cid Campos e Adriana Calcanhotto, que subirão ao palco do Sesc Pinheiros (Rua Paes Leme, 195, São Paulo. Tel.: 3095-9400) às 21h.



Um dos convidados principais desta edição é o músico Caetano Veloso, que participará de bate-papo com Augusto, mediado por Claudynei Ferreira. O encontro está marcado para amanhã, às 17h30, no Centro Cultural b_arco (Rua Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, 426, São Paulo. Tel.: 3081-6986).






18 de novembro de 2011

Augusto de Campos: Vanguarda não é só o que é do nosso tempo

Claudio Leal

Homenageado da Balada Literária 2011, o poeta Augusto de Campos, 80 anos, apresentou uma síntese de sua trajetória intelectual, nesta quarta-feira (16), no Sesc Pinheiros, em São Paulo. Acompanhado do filho, o músico Cid Campos, e da compositora Adriana Calcanhotto, o concretista comandou a "showversa", durante a qual seus poemas e suas traduções ganharam acompanhamento melódico. 



Co-autor de "Teoria da Poesia Concreta", com Haroldo de Campos e Decio Pignatari, Augusto de Campos é um dos principais criadores em atividade no Brasil. O poeta de "O rei menos o rei" (1951) e "Poetamenos" (1953) conversou sobre vanguarda, concretismo, Pedro Kilkerry, João Gilberto, Webern, Pound e Bahia, além de expor o nascimento de poemas como "cidade/city/cité", de 1963.

"Vanguarda não é só o que é do nosso tempo. Muitos outros foram inventivos, poetas especialmente inventivos no seu tempo", declarou Campos, tradutor de Maiakóvski, Pound, John Donne, John Keats, Rimbaud e Emily Dickinson, entre outros. Na tarde desta quinta-feira (17), ele também dialogou com Caetano Veloso sobre "Concretismo e Tropicalismo".

João Gilberto e Webern
"Quando surgiu a Bossa Nova nós já tínhamos uma experiência de dez anos de ouvir esse tipo de música - no caso do (Anton) Webern, uma música muito sucinta, sintética, cheia de espaços que funcionam como notas. E eu vislumbrei uma semelhança entre os dois. Eu dizia que o João Gilberto era o Webern da música popular brasileira e que o Webern era o João Gilberto da música moderna. Resolvi fazer um dos meus primeiros morfogramas, que são composições a base de retratos, que você deve justapor para que um passe para o outro. Nesse caso, a resposta a esse morfograma é uma junção da música do João Gilberto com o quarteto para saxofone do Webern".

dias dias dias
"Aqui vocês estão vendo a primeira versão, ou uma das primeiras versões de um dos poemas do 'Poetamenos', feita ainda a mão, com tintas. É o "dias dias dias". O que aconteceu foi muito interessante em relação a esse poema (...) Em 1973, houve uma exposição de Poesia Concreta na Bahia, organizada pelo (poeta e antropólogo) Antonio Risério, então ainda muito jovem. E ele, para minha surpresa, pediu ao Caetano (Veloso) que compusesse alguma coisa sobre um desses poemas. E Caetano escolheu "dias dias dias", sobre o qual eu tinha pouco conversado com ele. Apenas tinha, naturalmente, conversado, introduzido um pouco o Webern e dito pra ele que, nessa ocasião, eu ouvia Webern ao lado de Lupicínio Rodrigues. E ele fez uma coisa extraordinária. Ele mudou o andamento da canção do Lupicínio Rodrigues. Ele tinha um pequeno estúdio, apenas com um teclado elétrico, quatro canais, e ele deformou essa melodia, de modo que ela só aparece no final. De certa maneira, usando espaços, ele aproximou Webern do Lupicínio Rodrigues. Ele webernizou a melodia do Lupicínio Rodrigues e interpretou lindamente esse poema que diziam que não podia ser lido".

Poesia Concreta, Bahia, 1973
"Aqui vocês estão vendo um grupo de amigos, escritores... Risério muito jovem ainda, Caetano, Paulo Cézar (de Souza), Lygia, na entrada da exposição de Poesia Concreta, que ocorreu naquela ocasião. Ao fundo a nota do poema do Décio, 'Cristo é a solução'".

(A fotografia mostra Risério, Tuzé de Abreu, Erthos Albino de Souza, Caetano Veloso, Paulo Cézar de Souza, Pedro Novis, Lygia e Augusto de Campos, Nando Barros. Em conversa com Terra Magazine, por telefone, o poeta e antropólogo Antonio Risério conta que a exposição foi "uma festa baiana" para Augusto de Campos, em comemoração aos 20 anos de "Poetamenos". O evento aconteceu no estúdio Lambe-Lambe, numa casa da avenida Princesa Isabel, em Salvador).

"Essa foto do Caetano virou uma coisa interessante. Porque aconteceu algo muito interessante. Quando eu recebi as fotos... Eu estou aí com um cabelo um pouco maior, mais longo, pra poder ao menos dialogar com os baianos, que tinham esses cabelos todos africanos... Aí deixei crescer um pouco o cabelo (risos). Mas aconteceu uma coisa muito interessante. Quando eu recebi essas fotos, uma delas, por uma questão puramente casual, sobrepôs dois negativos e saiu essa fotografia em que o Caetano aparece dentro da minha cabeça. Quando eu ouvi o 'dias dias dias', falei pra ele: 'Mas, Caetano, você radiografou a minha cabeça e aconteceu isso!'. Era o que Jung chamava de "sincronicidade". Em 1990, como eu disse, no início, eu e Cid começamos a trabalhar mais sistematicamente com esse tipo de proposta, de unir as estruturas complexas e encontrar um tratamento sonoro a essas coisas que exigiam superposições de som e deformações de sílabas, palavras. Ao mesmo tempo, também, confrontar aspectos inerentes à música popular, mas que, estranhamente, davam uma comunicabilidade a essas peças tão laboratoriais, dando-lhes uma comunicabilidade muito inesperada. Então, começamos a trabalhar juntos, numa série de poemas. Vocês estão vendo um trecho de uma apresentação que fizemos na TV Cultura. A seguir, fizemos em 1994/95 nosso primeiro CD, com cerca de trinta composições do Cid sobre os meus textos e sobre os textos do Kilkerry. "Poesia é risco", aliás, depois de tantos anos, está sendo reeditado agora pelo selo Sesc. Não vimos o disco ainda, nem eu nem o Cid, mas deve ser pelo menos razoável".

Bahia, Kilkerry, 1969
"Bom, eu falei de Bahia, 1973. Mas eu havia estado antes em 1969, creio, quando eu estava fazendo uma pesquisa sobre um grande poeta baiano, Pedro Kilkerry. Era um poeta desconhecido, praticamente, porque ele não havia publicado livro em vida. Os seus poemas estavam esparsos em revistas, alguns jornais. Eu, com o auxílio do Erthos Albino de Souza, poeta e ao mesmo tempo editor da revista 'Código', juntamente com Risério, fui completar uma pesquisa na Bahia. Por coincidência, na época em que Caetano e Gil estavam sendo obrigados a deixar o País. Eu o encontrei lá (Caetano), estava em prisão domiciliar, e poucos antes de partir eles fizeram o último show, que eu lá assisti. O Pedro Kilkerry era um poeta extraordinário. Ele pertence à segunda geração do simbolismo brasileiro, mas é o mais radical dos poetas simbolistas ou o que mais se aproxima da linguagem do Mallarmé e de Rimbaud. Eu também fiquei particularmente tocado, uma coisa pessoal, porque o Kilkerry tem esse nome estranho porque é descendente de irlandeses também, além de baiano. Somos descendentes de baianos e irlandeses. Meu avô, por parte de mãe, era baiano. E meu bisavô, irlandês. Minha bisavó, baiana. Então, eu também sou baiano, embora não pareça. Cid compôs uma melodia que apresentamos em nosso primeiro CD, 'Poesia é risco'".

Cid Campos complementa: "Na época, justamente começo dos anos 90, eu havia acabado de chegar de dois anos vivendo na Europa, envolvido com estúdios. Voltei para cá animadíssimo. Montei o primeiro estúdio onde a gente desenvolveu esse projeto que o Augusto está falando. E nessa época também eu conheci a Adriana (Calcanhotto). Fui apresentado a Adriana por Péricles Cavalcanti - músico, compositor, muito amigo e querido. E, de lá pra cá, eu e Adriana sempre fazemos trabalhos, um participando de CDs do outro, produzindo e fazendo coisas juntos. Ela gravou essa música e algumas outras, que a gente vai mostrar pra vocês".

(Adriana Calcanhotto é chamada ao palco e passa a integrar o espetáculo).



Arnaut Daniel
"Arnaut Daniel. Esse roteiro é estranho, não é? Mas nós vamos assim: pra frente e pra trás. Vanguarda não é só o que é do nosso tempo. Muitos outros foram inventivos, poetas especialmente inventivos no seu tempo. Arnaut era um poeta dos trovadores provençais do século 12. Estava muito esquecido. Quem o trouxe para o mundo das letras, fora do âmbito dos pesquisadores, mais restrito, foi Ezra Pound. Através dele, tomamos conhecimento dos trovadores provençais. Dentre eles todos, grandes poetas, o Arnaut Daniel era o que mais chamava a atenção, era o preferido do Pound e também foi o nosso preferido, porque é, segundo o próprio Pound, o protótipo do poeta inventor. Que era aquilo que nós queríamos ser. Então, foi através de um dos cantos, o canto 20 dos 'Cantos' do Pound, que nós nos aproximamos desse poeta e logo fomos tocados por uma deferência que ele fazia, no canto 20, à palavra 'noigandres'. Aparentemente, pelo que nós sabíamos na época, havia muita discussão entre os provençalistas, mas não se tinha chegado a dar o significado dessa palavra. O Ezra Pound, na Europa, estudou e esteve em Milão. Em Milão, ele encontrou duas das poucas canções que sobraram desse grande poeta (18 canções), duas que tinham melodia própria. A melodia feita pelo próprio trovador e jogral Arnaut Daniel.

Ele conta, com muita graça, esse episódio. Ele foi procurar Emil Lévy, que era um sábio provençal, tinha feito um dicionário extraordinário... E começa a conversar com Lévy sob o pretexto de trazer pra ele fotocópias das melodias desses antigos manuscritos - não dos provençais, porque os manuscritos não são deles, foram feitos um século depois, pelo menos. Mas ele, a pretexto de levar essas melodias, que o Lévy ficou muito curioso de conhecer... Eles travam um diálogo que aparece no canto 20 em que ele pergunta ao Lévy qual é o significado da palavra 'noigandres'. E ele dá a entender que o Lévy não tinha conseguido ainda, àquela altura, descobrir o significado. Eles achavam que era noz-moscada. Mas não fazia sentido dentro do contexto, que era de umas árvores, de flores, que tinham requisitos que levavam ao amor... E, dentre elas, esses olores de 'noigandres'. Olor de noz-moscada não fazia sentido nenhum no contexto. Ele descobriu depois de muito tempo. Ele dividiu a palavra em noi gandres e descobriu que era um perfume que livrava do tédio. Quando fizemos a nossa revista, que intitulamos 'Noigandres', não tínhamos a mínima ideia desse significado. Nós achamos que era uma palavra indecifrável e que simbolizava um pouco o desconhecido que nós procurávamos. Mas, para a nossa felicidade, 'livrar do tédio' é positivo. Ficamos contentes quando soubemos disso, anos depois. Nós aqui vamos ver um clipezinho com a conversa do Pound com o Lévy".

Cidade
"Eu fui com Lygia e Haroldo aos Estados Unidos para uma série de apresentações da poesia concreta. Estive em várias universidades. Em Nova Iorque, fiquei hospedado no Chelsea Hotel. Isso foi em abril de 1968. Eu não sabia, mas no mesmo período lá estava Janis Joplin, que estava gravando 'Cheap Thrills'. Ela sempre ia, quando ficava em Nova Iorque, nesse hotel famoso, célebre ponto da cidade mas também um hotel barra pesada. Então, naturalmente, conheci o primeiro disco da Janis, fiquei impressionadíssimo e, na mesma ocasião, em 68, eu fui para Austin, no Texas, e fui também pra Bloomington, Indiana. Em Bloomington gravei, na rádio da universidade, uma primeira versão do poema "cidade" ( 'cidadecitycité'). (...)

"Bom, aí está o poema 'cidade', que, na primeira versão, a de Bloomington, era muito mais longa do que esse. Nesse poema - digo que foi influenciado pelo (John) Cage -, me dei muita liberdade aleatória, tomando a palavra 'cidade' e outras palavras que terminavam com essa parte vocabular. Decidi fazer um poema com todas elas, que tivessem alguma relação com a ideia de grande metrópole. Adotei um critério puramente casual. Coloquei as palavras em ordem alfabética, sem me preocupar com o sentido que tivesse. Mas tive a sorte de que, no fim, a última palavra vinha a ser 'voracidade'. E eu percebi que ela como que engolia as palavras anteriores, ela fechava o poema, que ameaçava não ter fim. Na primeira versão, ele foi crescendo, virou uma espécie de monstro, que eu não conseguia mais controlar. Então eu tive a ideia, percebendo que a origem latina dessas propiciava que elas existissem em várias líguas, vários idiomas, inclusive o anglo-saxão... Resolvi encolher esse poema numa medida até que ele pudesse ser publicado numa página, em duas páginas. Ele foi reduzido de modo que apenas sobrevivessem as palavras que tivessem a mesma grafia nas três línguas: português, francês e inglês. Ficou 'cidade city cité'. A primeira gravação que eu fiz dava uma ideia do monstro que eu tinha em mãos. Àquela altura, eu conseguia ler de um só fôlego, era jovem. Hoje não dá mais". 





VILA MUNDO
18/11/2011
Caetano Veloso e Augusto de Campos pertinho do público
Mayara Penina




 
Os convidados debateram as relações entre o concretismo e o tropicalismo.

Em que outro lugar Caetano Veloso ficaria assim, pertinho de você, quase que num tête-à-tête? Só mesmo na Balada Literária! Na última quinta-feira (17), o público da Vila Madalena pôde ver de perto e gratuitamente um dos maiores nomes da música popular brasileira num clima mais que descontraído. E não é só isso: o poeta Augusto de Campos (homenageado desta edição) estava bem ao lado.


Isso prova o que Marcelino Freire, criador da Balada, sempre diz: “A Balada Literária é como festa de apartamento, tudo gratuito e entre amigos”.

De forma descontraída e intimista, o evento acontece há seis anos exatos na Vila Madalena, sem patrocínio, e nas palavras de Freire com “capital afetivo”, feito por pessoas que acreditam na proposta.


Quem conseguiu chegar cedo ao Centro Cultural b_arco bateu um papo sobre os movimentos tropicalista e concretista e sobre a amizade entre os artistas que os viveram. O tema da mesa: “O pulsar – concretismo e tropicalismo”.

Em meio aos “deixa a gente entrar” de quem ficou para o lado de fora do Centro, Claudiney Ferreira iniciou a medição lembrando que o seu papel era apenas o de pontuar uma conversa livre, entre amigos.


Augusto de Campos ouviu falar de Caetano Veloso pela primeira vez no Festival de Música Brasileira da TV Record. “Quando vi aquele menino, percebi que havia um Deus nele.” Na conversa, falaram sobre amizade e a admiração que ambos tinham pelo compositor gaúcho Lupicínio Rodrigues e pelo cantor baiano João Gilberto. 

Lembraram os poemas de um musicados pelo outro e as visitas dos concretistas ao apartamento dos baianos. “O apartamento de Caetano era uma loucura. Todo mundo que passava por lá vestia batas brancas”, disse o poeta.

O Centro Cultral b_arco ficou pequeno para tanta gente.

Augusto também contou sobre os entraves que o pessoal da poesia concreta encontrou: “O Drummond, por exemplo, ficou desconfiado. Ele deve ter pensado: ‘Quem são esses vigaristas que apareceram com essas letrinhas?’. Mas como um bom mineiro ele acabou não falando nada”, explicou. “As críticas diziam que precisávamos ser alfabetizados. Para José Lins do Rego, o que resolveria nosso problema seria um banho de burrice”, divertiu-se ao lembrar.

Caetano citou os personagens do universo literário que chamaram o trabalho dos concretistas de “rock n’roll da poesia”. “Augusto é mais soul”, disse o cantor. “Ele é mais Erykah Badu e Amy Winehouse.”





17/11/2011 - Fotos: Marlene Bergamo 



















com Glauco Mattoso - Foto: Luciana dal Ri



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