19 de junho de 1944
Novembro de 1966 |
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Maria Bethânia e Chico Buarque |
Acervo digitalizado de la obra de Caetano Veloso, organizado por Evangelina Maffei [Buenos Aires, Argentina] Fecha de inicio: 2/12/2010. Sitio oficial de Caetano Veloso: http://www.caetanoveloso.com.br
ARCHANJO,
Neide. Pequeno Oratório do Poeta para o Anjo, 1ª edição. Rio de Janeiro: N.
Archanjo, 1997; 60p.
Acompanha
o CD da Blue Studios com quatro poemas do livro gravados por Maria Bethânia.
Capa e imagens: Lucia Sartori
31 de março de 1997
Quatro poemas do livro Pequeno Oratório do Poeta
para o Anjo
de Neide Archanjo
Meu nome é Maria Bethânia
Era o mar
E parecia ser o mar.
Era o mar.
Dois mil anos
Esperei por aquele
que febre alguma
ou olhar
moedas escárnios
anseios desejos
amores confessos
puderam tocar.
À minha frente
ei-lo intato
suspenso sobre meus lábios
aureolado suplicando
o nome do seu nome.
Era quimera
e parecia ser o amor.
Era quimera.
Graça flutuante
figurava estar sentado.
A cabeça era magra
coberta de cachos
junquilhos
de onde o sol jorrava.
As asas
mantidas fechadas
tocavam o chão
longas emplumadas
o corpo intangível.
Seus olhos
Castanhoverdecinzadourados
escarlates me olhavam
como se fossem
desde sempre
a límpida palavra.
Era belo e assim se apresentava.
Era o caule
e parecia ser a flor.
Era o caule.
Veste-se de blue
e um fio transparente
costura-lhe
asas e costas.
Os pés
traz escondidos
calçando botas.
Não voa
Não cumpre seu nome.
Quer ser apenas
azul e belo
como é a paixão.
Era a Beleza
e parecia ser a Beleza.
Era a Beleza.
Filho pródigo
abandonou a casa.
De seus vestígios de musa
de seus lampejos de Anjo
brotaram todas as lágrimas.
A dor
incrustada na curva da porta
esperou por muito tempo
a volta.
Depois no rubi deste coração
escreveu seu nome.
São Paulo, quinta-feira, 22 de maio de 1997
Bethânia lê obra de Neide Archanjo
ALVARO MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Portugueses de fino trato já afirmaram que Maria Bethânia lhes revelou o espírito mais genuíno de Fernando Pessoa -como nos poemas ditos em seu último álbum, "Imitação da Vida".
Porém há um outro lado desse interesse da intérprete por poesia que poderá ser melhor conhecido hoje, quando Bethânia comparece à Biblioteca Nacional, no Rio, para interpretar o "Pequeno Oratório do Poeta para o Anjo", mais recente produção da poeta paulistana Neide Archanjo.
Esse recital, sob a batuta da diretora teatral Bia Lessa, marca o lançamento nacional do livro, que chega ao leitor em embalagem requintada: acompanhado de CD no qual Bethânia lê poemas e ilustrado pela pintora paulista Lucila Sartori.
Em São Paulo o lançamento será no dia 17 de junho, no teatro Maria Della Costa, com outras afinidades eletivas da autora: Regina Duarte será a intérprete, sob direção da artista plástica Denise Millan.
Em ambos os eventos estarão expostos os quatro dípticos em óleo sobre tela de Sartori, que acompanham a temática do livro com "anunciações angélicas" em cores rebaixadas e folhas de ouro.
Atualmente radicada no Rio, Neide Archanjo estreou em poesia em 1964, com "Primeiros Ofícios da Memória". Tem outros sete livros publicados em várias editoras, premiação da APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) em 80 e indicação para o prêmio Jabuti em 95 ("Tudo é Sempre Agora", ed. Maltese).
Assessora do Departamento Nacional do Livro, Neide Archanjo é bastante atuante em mesas-redondas e apresentações de poesia em todo o Brasil, dentro de um panorama recente que se configura quase como um movimento informal de revitalização da produção e amostragem poéticas.
Entusiasta do contato direto com o público, que ela se refere como "opção
política", criou nos anos 69/70 os "Varais de Poesia" e o
movimento "Poesia na Praça", com os poetas Ilka Brunhilde, José Luís
Archanjo, Álvaro de Farias e outros.
Na feira hippie da Praça da República e em cafés do centro de São Paulo
pendurava-se e declamava poemas sobre fatos acontecidos na véspera.
Drummond
Archanjo pertence à vigorosa família poética feminina de Hilda Hilst, Renata
Pallotini, Mariajosé de Carvalho, Dora Ferreira da Silva e outras autoras
paulistas.
Carlos Drummond de Andrade, que tinha por elas
grande admiração, escreveu para Archanjo: "Você alcança a justa e vibrante
expressão que deixa marca no leitor".
"Pequeno Oratório..." tem influência explícita de Rilke, que com
Jorge de Lima e Saint-John Perse está entre os autores preferidos da poeta.
Conforme o plano original da autora, o livro chega
com o encarte de CD, papel e ilustrações especiais, e por isso foi produzido de
forma independente.
"Pequeno Oratório..." terá uma tiragem de
3.000 exemplares e distribuição comercial pela Tempo (tel. 011/240-1027).
Os 16 poemas falam, segundo Archanjo, sobre "a
visitação, a presença da musa, ou da beleza, que é sempre 'pré-ante-perdida'. O
que fica é a poesia que relata essa aparição e o clamor da perda".
Os títulos dos poemas são haicais que, em sua
sequência, configuram um poema em movimento.
Compõem-se de afirmações que vão se metamorfoseando por meio de seus contrários:
"Era quimera/ e parecia ser o amor./ Era quimera."
Para a autora, "o
êxtase da visitação é como um diamante bruto que deve ser lapidado, ou
revelado, em seus diversos prismas, até a catarse do poema, da obra".
Livro: Pequeno Oratório do Poeta para o Anjo, de Neide Archanjo (60 págs.)
Lançamento: hoje, às 18h, na Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (av. Rio
Branco, 219, tel. 021/262-8255)
Quanto: R$ 25, incluindo encarte com CD
Distribuição: Tempo (tel. 011/240-1027)
Revista Manchete - 26/7/1997 |
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Foto: Lívio Campos |
"A leitura ou releitura da obra de Neide Archanjo deve
ser feita, para que (em meio aos seus labirínticos itinerários) se revele a
unidade invisível que fez dela o singular universo poético que, já há muito,
conquistou espaço próprio nos quadros de Poesia Brasileira Contemporânea e na
poesia de língua portuguesa”
Nelly Novaes Coelho
Trilha Musical por: Sylvia Patricia e Paulo Rafael