“Adoro a palavra. Terminou aparecendo na letra de uma das canções. Acho bonito esse aumentativo em aço. Que tem em espanhol também, como em “golazo”. No caso de abraço, esse aumentativo em aço dá um eco, parece que a pessoa errou na digitação. É bonito também de ver. É um abração. Como é bonita a palavra, parece um abraço que abrange mais, como círculos concêntricos, como uma onda que expande. Um abraço grande que se expande”
(Caetano Veloso, 29/10/2012, O Globo)
. . .
Ei …
Hoje eu mando um abraçaço
Ei …
Hoje eu mando um abraçaço
Ei …
Hoje eu mando um abraçaço
Ei …
Hoje eu mando um abraçaço
Ei ...
(Um abraçaço, 27/11/2012)
2012
ABRAÇAÇO
Universal Music CD 602537209675 [Brasil]
Universal Music CD 60253726802 [Argentina, Enero 2013]
Producción Universal Music dirigida por Moreno Veloso y Pedro Sá
BandaCê: Pedro Sá, Ricardo Dias Gomes y Marcelo Callado
Lanzamiento: 4/12/2012
1. A BOSSA NOVA É FODA (Caetano Veloso)
2. UM ABRAÇAÇO (Caetano Veloso)
3. ESTOU TRISTE (Caetano Veloso)
4. O IMPÉRIO DA LEI (Caetano Veloso)
5. QUERO SER JUSTO (Caetano Veloso)
6. UM COMUNISTA (Caetano Veloso)
7. FUNK MELÓDICO (Caetano Veloso)
8. VINCO (Caetano Veloso)
9. QUANDO O GALO CANTOU (Caetano Veloso)
10. PARABÉNS (Caetano Veloso/Mauro Lima)
11. GAYANA (Rogério Duarte)
Caetano Veloso fala sobre sua relação com o prêmio Grammy Latino
O cantor terá músicas suas interpretadas por artistas brasileiros e internacionais em jantar de gala, em novembro, em Las Vegas
RIO - Caetano Veloso estava em Los Angeles quando foi acordado por gente que anunciava e garantia que o mundo ia se acabar. E não era por estar na cidade que consagrou Carmen Miranda cantando sambas como os de Assis Valente, mas sim porque estava nos Estados Unidos no dia 11 de setembro de 2001.
— Tínhamos nos hospedado em um hotel em que os quartos eram uma espécie de chalé. Isolados uns dos outros. Tranquilos. Acordamos assustados, com Conceição Lopes (produtora executiva dos shows) batendo à porta dizendo que o mundo iria acabar, porque começaria uma nova guerra mundial — lembrou o cantor e compositor.
Caetano estava em Los Angeles para o que seria sua primeira apresentação no Grammy Latino, o maior prêmio da indústria fonográfica das Américas.
Ensaio de "13 de Maio" |
— Eu me preparei para fazer uma bela participação em 2001. Fui para Los Angeles de Nova York em 10 de setembro. Ensaiei. No dia 11, faríamos a apresentação. Ensaiei, com a banda do show “Noites do Norte”, a canção “13 de Maio”. Lindíssima. Estava orgulhosíssimo. Era uma apresentação muito bonita. No ensaio, o pessoal que estava trabalhando na montagem daquele negócio gigantesco parou e aplaudiu. A música era muito bonita, com um ritmo de timbalada sobre a abolição da escravatura no Brasil. Mas aí meteram aqueles aviões no World Trade Center e não houve apresentação.
Escolhido a personalidade de 2012 pela Academia Latina de Gravação, será homenageado em noite especial do Grammy Latino em 14 de novembro, desta vez em Las Vegas. No jantar de gala para cerca de 1.500 pessoas na MGM Grand Garden Arena, convidados interpretarão dez canções de Caetano ou que tenham marcado seu repertório.
Seu Jorge, Ivete Sangalo, Maria Gadú e Alexandre Pires são os brasileiros escolhidos para cantar com nomes internacionais como Nelly Furtado, Natalie Cole, Lila Downs, Juanes, Juan Luis Guerra, Tania Libertad, Natalia LaFourcade, Mala Rodriguez e Enrique Bunbury.
A noite de gala em homenagem a Caetano é um evento fechado, em que convites serão vendidos a patrocinadores. A renda revertida irá para a Fundação Viva Cazuza, a pedido do artista. Caetano é o segundo brasileiro a ser escolhido personalidade do ano pelo Grammy Latino. O primeiro foi Gilberto Gil, em 2003. No dia 15 de novembro, acontece a entrega do prêmio, no Mandalay Bay Events Center, também em Las Vegas, esta sim uma festa com transmissão pela TV, para audiência estimada em 80 milhões de pessoas em todo o mundo, sendo 11 milhões nos EUA, por meio do canal latino Univisión. Para o Brasil, a transmissão será pelo canal fechado TNT.
— No Grammy, vou cantar uma canção para agradecer. Estamos escolhendo, talvez escolham para mim — afirmou.
Em conversa com jornalistas em um hotel, no Leblon, na noite de sexta-feira, Caetano contou ainda ter concluído a gravação de seu 45º álbum, que terá 11 canções e será batizado como “Abraçaço”.
— Adoro a palavra. Terminou aparecendo na letra de uma das canções. Acho bonito esse aumentativo em aço. Que tem em espanhol também, como em “golazo”. No caso de abraço, esse aumentativo em aço dá um eco, parece que a pessoa errou na digitação. É bonito também de ver. É um abração. Como é bonita a palavra, parece um abraço que abrange mais, como círculos concêntricos, como uma onda que expande. Um abraço grande que se expande.
O
Programa do Jô desta terça-feira será especial todo dedicado a Caetano Veloso.
Jô Soares fará três blocos de entrevista com o cantor e ainda apresentará
quatro musicais imperdíveis. O programa vai ao ar logo após o Jornal da Globo.
Aos 70 anos, Caetano Veloso diz se sentir um adolescente de 14
27 de Nov. de 2012
Caetano Veloso gravou uma edição especial do 'Programa do Jô', que vai ao ar nesta terça-feira, 27. O artista está lançando seu novo disco, 'Abraçaço', e falou sobre Bethânia, Gil e o escândalo do mensalão com Jô Soares
Lançando o 31º disco
de sua carreira gravado em estúdio, Caetano Veloso
(70) ganhou uma edição especial do Programa
do Jô, gravado nesta terça-feira, 27, para divulgar o novo trabalho
e relembrar momentos de sua vida. O filho de Dona Canô (105) disse
que ainda se sente jovem e sempre foi assim.
“Sou um adolescente
de 14... 15 anos no máximo”, declarou o artista,
que justificou a escolha da faixa etária dizendo que é nesta idade que os
jovens se sentem mais narcisistas e exibicionistas.
A conversa com Jô Soares (74)
resgatou memórias de momentos vividos por Caetano, que relembrou parte de sua
trajetória musical com um colega em especial, Gilberto Gil (70). “A primeira vez que eu vi Gil foi na
Rua Chile [em Salvador], ele vinha com Roberto Santana. Ele era meu ídolo da
televisão, cantava em um programinha de tarde na Bahia. Eu assistia e ficava
maravilhado”, contou.
“Acho que se juntar
eu e o Gil, dá alguma coisa respeitável”, brincou Caetano, que cantou com o colega recentemente na festa em
homenagem a Ulysses
Guimarães, em Brasília.
Sobre a época da Tropicália,
Caetano lamentou a falta de arquivo nacional que foi apagado. “Lá fora eles sabem que o que fazem
podem ser importante, mas brasileiro tinha essa coisa de apagar. Hoje em dia as
coisas estão diferentes. O Brasil está tomando vergonha”, afirmou.
Família
Com um sorriso no
rosto, Caetano disse que com o passar dos anos parou para pensar sobre seu pai,
Seu Zeca,
que morreu em 1983, com 82 anos. “Meu
pai era um gênio. Um homem único”, declarou o cantor, que contou
como ajudou na escolha do nome de uma de suas irmãs, Maria Bethânia (66).
“Tinha 4 anos e
gostava de uma música do Nelson Gonçalves [‘Maria Bethânia’, gravada em 1945].
Quando ela nasceu, meu pai disse para os cinco irmãos sugerirem um nome.
Sugeriram Cristina, Gislaine... e eu escolhi Maria Bethânia. Meu pai escreveu
todos os nomes em um papel, colocou no meu chapéu e pediu para eu tirar uma
papelzinho. Eu tirei o nome que tinha escolhido”, disse.
Mensalão
Sobre o julgamento do
mensalão, Caetano mostrou uma visão positiva.
“Sinaliza uma mudança sim”, afirmou. “É interessante ver que hoje existe essa ideia da
população de exigir que a lei cumpra seu papel”, disse o artista,
que comparou o escândalo com o impeachment de Fernando Collor (63), em 1992. “Naquela época já sinalizava isso”, argumentou.
Caetano definiu a
sentença dada aos políticos envolvidos como
‘dores do crescimento’ e confessou não estar feliz. “Não dá para dizer que eu fiquei
contente. Você vê um cara que foi preso no regime militar, que dizer, que lutou
contra o regime militar e agora é preso por isso...”, declarou.
Para ele, o ‘povo precisa deixar de ter uma visão
infantil e antiquada de que só porque o cara usa um terno não pode ser preso’.
Caetano também criticou aos que dizem ser o mensalão um golpe da mídia. “O próprio Lula disse que se sentia
traído em um primeiro momento, depois virou caixa dois, depois golpe da
mídia.... Isso empobrece, parece que a população é burra. Tem que amadurecer”,
afirmou.
Abraçaço
Caetano Veloso
apresentou algumas músicas do novo disco,
Abraçaço. Entre elas, Império
da Lei e Quero
Ser Justo. O álbum foi produzido por Moreno Veloso (40),
filho do artista, e Pedro
Sá.
O programa vai ser
exibido nesta terça-feira, 27, logo após o Jornal da Globo.
1/12/2012
Programa “Altas Horas”
Caetano Veloso
comenta citação de feras do UFC em música do novo disco
Cantor
conta que não gostava de lutas, mas seus filhos são fãs do esporte
Quem
vê o jeito pacato de Caetano Veloso falar não pode imagina que ele gosta de
lutas. E não gosta. Apesar disso, o cantor baiano fez uma homenagem aos
lutadores brasileiros do UFC na música “A Bossa Nova É Foda”, que está no
repertório de seu novo disco “Abraçaço”.
“Eu
não gostava de luta nenhum, porém meus filhos mais novos gostam e às vezes a
gente vê junto. Eu menciono os lutadores, porque eles são uma coisa, como a
Bossa Nova, de invenção brasileira”, comenta Caetano Veloso no Altas Horas.
O
GLOBO
Cultura
‘Abraçaço’:
a melancolia do medalhão rebelde Caetano Veloso
Compositor encerra a
trilogia com a Banda Cê com homenagens à bossa nova, a Marighella e ao pagode
romântico
Caetano Veloso sobre a Banda Cê: “Adoro essa banda, tocar com ela. É miraculoso. Nunca tive com eles 10 segundos de atraso, de dizer uma ideia e esperar para que ela se resolva. Quando vai, já é” - Michel Filho
Leonardo Lichote
30/11/2012
RIO - A guitarra marcada de “Odeio” é uma das marcas mais fortes — de uma das canções mais fortes — do álbum “Cê”, lançado em 2006. Seis anos depois, ela ecoa nos primeiros segundos de “A bossa nova é foda”, primeira faixa do novo CD do baiano, “Abraçaço” (Universal). A ligação explícita é uma piscadela indicando uma ponte entre os discos da trilogia que, iniciada em "Cê" e seguida por "Zii e zie" (2009), chega agora à sua conclusão — definindo o fim da fase Banda Cê, formada por Pedro Sá (guitarra), Marcelo Calado (bateria) e Ricardo Dias Gomes (baixo).O trajeto traçado pelo artista e o trio de jovens músicos desde o primeiro até agora pode ser descrito como o que vai do rancor de “Outro” (primeira de “Cê”) ao amor puríssimo de “Gayana” (última de “Abraçaço”), do indie-rock de 2006 ao violão que guia o disco que chega semana que vem às lojas. Ou da raiva à melancolia, como descreve o compositor:
— O “Cê” é mais pau duro — diz, em referência aos versos “Feliz e mau como um pau duro/ Acendendo-se no escuro”, de “Outro”. — Tem até esse tema da amargura agora, que tinha no “Cê”. Mas o “Cê” era mais alegre. “Abraçaço” tem uma melancolia que não tinha antes. O “Cê” tinha raiva, até angústia, mas não melancolia. Tinha a canção “Minhas lágrimas”, que era triste. Mas “Estou triste” (do novo disco, de versos como “Por que será que existe o que quer que seja?/ O meu lábio não diz, o meu gesto não faz/ Eu me sinto vazio/ E ainda assim farto”) é a mais triste da trilogia. A canção “Um abraçaço” é bonita e melancólica. É muito simples, ela quase não existe, mas tem emoção. E essa emoção é cheia de melancolia, marcada pela melancolia.
A canção trata de um desencontro que se prometia encontro (“Você não se deixou ficar/ No meu emaranhado/ Foi parar do outro lado/ Do outro lado de lá de lá”). Mas se em outros tempos Caetano já transformou o tema em alegria rock (“Eclipse oculto”), agora ele escolheu o caminho da dor.
— Nem me lembrei de “Eclipse oculto”, mas tem a ver. Tem um “não deu certo” na letra de “Um abraçaço”: “Tudo que não deu certo/ E sei que não tem conserto/ Meu silêncio chorou, chorou”. Em “Eclipse oculto” era “Nosso amor não deu certo/ Gargalhadas e lágrimas” — canta animadamente, rindo.
Na canção, abraçaço (despedida que Caetano usa às vezes nos e-mails) é o que ele manda para a musa — como a única coisa que restou a ele fazer após o desencontro. No nome do disco, traz uma ideia mais ampla:
— Abraçaço é uma palavra muito bonita e tem essa reverberação, parece um eco, mais ainda quando escrito, esse a-ce-cedilha duas vezes. É como se fossem círculos concêntricos de abraços, que vão se expandindo. Não é apenas grande ou maravilhoso como é um golaço, por exemplo. É expansivo.
No disco, o abraçaço abarca desde cena íntimas até o fato que "o império da lei há de chegar ao coração do Pará".
“O império da lei” é uma das canções do disco que abandona a melancolia e abraça a contundência. Composta em homenagem a figuras como Dorothy Stang, missionária assassinada em 2005 no Pará, a música é um pedido de justiça — sobre uma batida marcada da Banda Cê que faz referência aos festivo ritmos paraenses. Caetano a compôs inspirado no filme “Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios”.
— Vendo o filme, fiquei muito emocionado e pensando nessa situação do interior do Pará, que a gente acompanha pela imprensa há muitos anos, com a sensação de que o império da lei ainda não pôs seus tentáculos ali de modo firme. No filme, Dona Onete canta sobre uma batida, eu queria essa batida para essa música. Falei com a banda e eles entenderam logo. No filme, a batida estava discreta, eu queria trazê-la para a frente. Queria algo bem forte pra ser um brado mesmo. Pelo ritmo, tem um certo caráter de canção de festa, mas é nitidamente um brado de luta — afirma Caetano, que louva a parceria com a Banda Cê. — Adoro essa banda, tocar com ela. É miraculoso.
Nunca tive com eles 10 segundos de atraso, de dizer uma ideia e esperar para que ela se resolva. Quando vai, já é. É incrível. mais do que qualquer outra banda com a qual eu já tenha tocado.
Marighella também é homenageado com uma canção no disco. Citando livro (“Marighella, o guerrilheiro que incendiou o mundo”, de Mario Magalhães), filme (“Marighella”, de Isa Grinspum Ferraz) e música (“Mil faces de um homem leal”, dos Racionais MC's) lançados recentemente, Caetano acredita que se chegou a um momento de olhar novamente para o personagem, descrito na canção como “Um mulato baiano/ Muito alto e mulato”.
— É o tempo natural da respiração histórica a respeito da memória de Marighella. Jorge Amado passou a vida sonhando em ver um monumento a Marighella em Salvador, mesmo apoiando Antonio Carlos Magalhães — lembra o músico. — Pedaços desse monumento inexistente são o livro, o filme, a música dos Racionais e a minha canção, que são completamente diferentes. A dos Racionais é uma típica peça de hip hop. A minha parece uma canção de protesto da época das canções de protesto. E eu quis que fosse assim. É uma resistência da canção.
A raiva com que se refere aos assassinos da missionária e do guerrilheiro nas letras aparece também quando ele se dirige à musa de “Funk melódico”. Sobre a batida do gênero, Caetano evoca a “mulher indigesta” do samba de Noel Rosa (“Merece um tijolo na testa”, rima o Poeta da Vila) para se dirigir a uma personagem que “produz raiva, confusão, tristeza e dor”, provando que “o ciúme é o estrume do amor” (citação ao Vinicius de Moraes e seu verso “O ciúme é o perfume do amor”).
— Nas três canções, a raiva é muito forte. Mas com a mulher há uma conversa que é de outra natureza, isso é suavizado (“Nem com cheiro de flor/ Bateria em você”). Com esses outros caras (os assassinos, que, no caso de Marighella, eram o poder militar da ditadura) não tem conversa.
O interesse de Caetano pelo funk carioca — que ele já cantara em shows e já usara para compor “Miami maculelê”, gravada por Gal Costa — divide espaço no disco com outro gênero popular. “Quando o galo cantou” se inspira no pagode romântico.
— O funk me interessa mais como construção estética, é algo muito sofisticado. Mas gosto do pagode romântico por aquela brincadeira rítmica, uma corridinha na letra, que faço um pouquinho na canção, mas diferente do que os pagodeiros fazem. Não queria uma imitação. É mais uma homenagem, até mais no dizer a expressão “pagode romântico” na letra — avalia Caetano.
— Mas o principal é que Tom, meu filho, adora os dois gêneros, como bom jogador de futebol.
Outro gênero que Caetano envolve em seu “Abraçaço” é um velho conhecido. Nos versos cifrados de “A bossa nova é foda”, é como se ele cantasse novamente para a bossa nova, como fez em 1968 em “Saudosismo”: “Eu, você, nós dois/ Já temos um passado meu amor”. Mas agora o passado inclui MMA e Bob Dylan. O americano, aliás, aparece na letra como “o bardo judeu romântico de Minnesota” — João Gilberto é “o bruxo de Juazeiro”, e Carlos Lyra, “o magno instrumento grego antigo”. Chamados pelo nome, apenas lutadores como Minotauro, Victor Belfort e Anderson Silva.
— João Gilberto sempre gostou de boxe e gosta de MMA. Numa entrevista a Tárik de Souza quando voltou ao Brasil, a imagem que usou para descrever seu estilo foi “um golpe de caratê”. Gosto muito disso — diz Caetano. — Esse tipo de luta tem uma formação que é semelhante a da bossa nova. O amálgama foi feito no Brasil, os Graice com o jiu-jitsu... E hoje o maior número de lutadores dessa categoria é de brasileiros. A bossa nova foi uma criação assim, um golpe de caraté com uma capacidade brasileira encarnada no João Gilberto de fazer determinadas misturas impiedosoamente bem achadas. Todo mundo pensa que a bossa nova é passarinho, mar azul, doce, suave. Mas não é. É um gesto de grande força combativa e foi vivido conscientemente assim pelo seu inventor.
O show de “Abraçaço” chega aos palcos em março de 2013. Encerrando uma trilogia que estabeleceu novos parâmetros para sua música numa idade em que muitos artistas se ocupam em — na melhor das perspectivas — apenas depurar seu estilo, Caetano procura driblar o papel de mito intocável da música popular brasileira. Papel que vem sendo intensamente reafirmado nos tributos aos seus 70 anos e em homenagens como o prêmio Pessoa do Ano do Grammy Latino, que ele acaba de ganhar.
— Não queria homenagem por fazer 70 anos. Mas algumas coisas aconteceram. Procurei descaracterizar as manifestações como tendo sido pretextadas pela data redonda. Acho um pouco chato isso, parece que só o que você tem é uma idade. É uma tolice, não gosto. Mas sabe o que podia ser feito e não foi? Um esforço pelas redes sociais para descobrir quem no mundo tem a edição inglesa do meu primeiro disco gravado em Londres. Porque a edição brasileira tem um corte em “A little more blue”, feito pela censura. Eu fazia uma menção à (atriz argentina) Libertade Lamarque e eles pensaram que eu estava pedindo liberdade para Lamarca (risos). Queria essa gravação original nem que fosse em MP3 — diz o baiano, que comenta o atrito entre os papéis do mito (que alcançou a perfeição) e do artista (que é movido pela busca). — Enfrento essa questão. Sou um medalhão rebelde, essa ideia já me ocorreu.
— O “Cê” é mais pau duro — diz, em referência aos versos “Feliz e mau como um pau duro/ Acendendo-se no escuro”, de “Outro”. — Tem até esse tema da amargura agora, que tinha no “Cê”. Mas o “Cê” era mais alegre. “Abraçaço” tem uma melancolia que não tinha antes. O “Cê” tinha raiva, até angústia, mas não melancolia. Tinha a canção “Minhas lágrimas”, que era triste. Mas “Estou triste” (do novo disco, de versos como “Por que será que existe o que quer que seja?/ O meu lábio não diz, o meu gesto não faz/ Eu me sinto vazio/ E ainda assim farto”) é a mais triste da trilogia. A canção “Um abraçaço” é bonita e melancólica. É muito simples, ela quase não existe, mas tem emoção. E essa emoção é cheia de melancolia, marcada pela melancolia.
A canção trata de um desencontro que se prometia encontro (“Você não se deixou ficar/ No meu emaranhado/ Foi parar do outro lado/ Do outro lado de lá de lá”). Mas se em outros tempos Caetano já transformou o tema em alegria rock (“Eclipse oculto”), agora ele escolheu o caminho da dor.
— Nem me lembrei de “Eclipse oculto”, mas tem a ver. Tem um “não deu certo” na letra de “Um abraçaço”: “Tudo que não deu certo/ E sei que não tem conserto/ Meu silêncio chorou, chorou”. Em “Eclipse oculto” era “Nosso amor não deu certo/ Gargalhadas e lágrimas” — canta animadamente, rindo.
Na canção, abraçaço (despedida que Caetano usa às vezes nos e-mails) é o que ele manda para a musa — como a única coisa que restou a ele fazer após o desencontro. No nome do disco, traz uma ideia mais ampla:
— Abraçaço é uma palavra muito bonita e tem essa reverberação, parece um eco, mais ainda quando escrito, esse a-ce-cedilha duas vezes. É como se fossem círculos concêntricos de abraços, que vão se expandindo. Não é apenas grande ou maravilhoso como é um golaço, por exemplo. É expansivo.
No disco, o abraçaço abarca desde cena íntimas até o fato que "o império da lei há de chegar ao coração do Pará".
“O império da lei” é uma das canções do disco que abandona a melancolia e abraça a contundência. Composta em homenagem a figuras como Dorothy Stang, missionária assassinada em 2005 no Pará, a música é um pedido de justiça — sobre uma batida marcada da Banda Cê que faz referência aos festivo ritmos paraenses. Caetano a compôs inspirado no filme “Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios”.
— Vendo o filme, fiquei muito emocionado e pensando nessa situação do interior do Pará, que a gente acompanha pela imprensa há muitos anos, com a sensação de que o império da lei ainda não pôs seus tentáculos ali de modo firme. No filme, Dona Onete canta sobre uma batida, eu queria essa batida para essa música. Falei com a banda e eles entenderam logo. No filme, a batida estava discreta, eu queria trazê-la para a frente. Queria algo bem forte pra ser um brado mesmo. Pelo ritmo, tem um certo caráter de canção de festa, mas é nitidamente um brado de luta — afirma Caetano, que louva a parceria com a Banda Cê. — Adoro essa banda, tocar com ela. É miraculoso.
Nunca tive com eles 10 segundos de atraso, de dizer uma ideia e esperar para que ela se resolva. Quando vai, já é. É incrível. mais do que qualquer outra banda com a qual eu já tenha tocado.
Marighella também é homenageado com uma canção no disco. Citando livro (“Marighella, o guerrilheiro que incendiou o mundo”, de Mario Magalhães), filme (“Marighella”, de Isa Grinspum Ferraz) e música (“Mil faces de um homem leal”, dos Racionais MC's) lançados recentemente, Caetano acredita que se chegou a um momento de olhar novamente para o personagem, descrito na canção como “Um mulato baiano/ Muito alto e mulato”.
— É o tempo natural da respiração histórica a respeito da memória de Marighella. Jorge Amado passou a vida sonhando em ver um monumento a Marighella em Salvador, mesmo apoiando Antonio Carlos Magalhães — lembra o músico. — Pedaços desse monumento inexistente são o livro, o filme, a música dos Racionais e a minha canção, que são completamente diferentes. A dos Racionais é uma típica peça de hip hop. A minha parece uma canção de protesto da época das canções de protesto. E eu quis que fosse assim. É uma resistência da canção.
A raiva com que se refere aos assassinos da missionária e do guerrilheiro nas letras aparece também quando ele se dirige à musa de “Funk melódico”. Sobre a batida do gênero, Caetano evoca a “mulher indigesta” do samba de Noel Rosa (“Merece um tijolo na testa”, rima o Poeta da Vila) para se dirigir a uma personagem que “produz raiva, confusão, tristeza e dor”, provando que “o ciúme é o estrume do amor” (citação ao Vinicius de Moraes e seu verso “O ciúme é o perfume do amor”).
— Nas três canções, a raiva é muito forte. Mas com a mulher há uma conversa que é de outra natureza, isso é suavizado (“Nem com cheiro de flor/ Bateria em você”). Com esses outros caras (os assassinos, que, no caso de Marighella, eram o poder militar da ditadura) não tem conversa.
O interesse de Caetano pelo funk carioca — que ele já cantara em shows e já usara para compor “Miami maculelê”, gravada por Gal Costa — divide espaço no disco com outro gênero popular. “Quando o galo cantou” se inspira no pagode romântico.
— O funk me interessa mais como construção estética, é algo muito sofisticado. Mas gosto do pagode romântico por aquela brincadeira rítmica, uma corridinha na letra, que faço um pouquinho na canção, mas diferente do que os pagodeiros fazem. Não queria uma imitação. É mais uma homenagem, até mais no dizer a expressão “pagode romântico” na letra — avalia Caetano.
— Mas o principal é que Tom, meu filho, adora os dois gêneros, como bom jogador de futebol.
Outro gênero que Caetano envolve em seu “Abraçaço” é um velho conhecido. Nos versos cifrados de “A bossa nova é foda”, é como se ele cantasse novamente para a bossa nova, como fez em 1968 em “Saudosismo”: “Eu, você, nós dois/ Já temos um passado meu amor”. Mas agora o passado inclui MMA e Bob Dylan. O americano, aliás, aparece na letra como “o bardo judeu romântico de Minnesota” — João Gilberto é “o bruxo de Juazeiro”, e Carlos Lyra, “o magno instrumento grego antigo”. Chamados pelo nome, apenas lutadores como Minotauro, Victor Belfort e Anderson Silva.
— João Gilberto sempre gostou de boxe e gosta de MMA. Numa entrevista a Tárik de Souza quando voltou ao Brasil, a imagem que usou para descrever seu estilo foi “um golpe de caratê”. Gosto muito disso — diz Caetano. — Esse tipo de luta tem uma formação que é semelhante a da bossa nova. O amálgama foi feito no Brasil, os Graice com o jiu-jitsu... E hoje o maior número de lutadores dessa categoria é de brasileiros. A bossa nova foi uma criação assim, um golpe de caraté com uma capacidade brasileira encarnada no João Gilberto de fazer determinadas misturas impiedosoamente bem achadas. Todo mundo pensa que a bossa nova é passarinho, mar azul, doce, suave. Mas não é. É um gesto de grande força combativa e foi vivido conscientemente assim pelo seu inventor.
O show de “Abraçaço” chega aos palcos em março de 2013. Encerrando uma trilogia que estabeleceu novos parâmetros para sua música numa idade em que muitos artistas se ocupam em — na melhor das perspectivas — apenas depurar seu estilo, Caetano procura driblar o papel de mito intocável da música popular brasileira. Papel que vem sendo intensamente reafirmado nos tributos aos seus 70 anos e em homenagens como o prêmio Pessoa do Ano do Grammy Latino, que ele acaba de ganhar.
— Não queria homenagem por fazer 70 anos. Mas algumas coisas aconteceram. Procurei descaracterizar as manifestações como tendo sido pretextadas pela data redonda. Acho um pouco chato isso, parece que só o que você tem é uma idade. É uma tolice, não gosto. Mas sabe o que podia ser feito e não foi? Um esforço pelas redes sociais para descobrir quem no mundo tem a edição inglesa do meu primeiro disco gravado em Londres. Porque a edição brasileira tem um corte em “A little more blue”, feito pela censura. Eu fazia uma menção à (atriz argentina) Libertade Lamarque e eles pensaram que eu estava pedindo liberdade para Lamarca (risos). Queria essa gravação original nem que fosse em MP3 — diz o baiano, que comenta o atrito entre os papéis do mito (que alcançou a perfeição) e do artista (que é movido pela busca). — Enfrento essa questão. Sou um medalhão rebelde, essa ideia já me ocorreu.
Crítica: ‘Abraçaço’ é um ‘discaço’ no tempo lógico
da incerteza
Novo álbum de Caetano Veloso é cheio de gargalos filosóficos
por Arnaldo
Bloch
30/11/2012
“Por que será que existe o que quer que
seja?”, indaga Caetano, num dos versos de “Estou triste”, a mais pungente
canção do seu novo CD. “Sinto o peito vazio/ e mesmo assim farto”, canta,
adiante. Descrição exata do estado de alma provocado pela depressão, diz o
crítico Marcus Preto, no release. Ou seria o contrário? Não são o vazio, a
náusea, o insight que deprimem?
É uma chave
para abrir as portas de “Abraçaço”, disco cheio de gargalos filosóficos em suas
11 faixas, nove com letra e música de Caetano. Moldado pelo laboratório
eletroacústico da Banda Cê, o esqueleto do disco balança no tempo lógico do
violão de Caetano, herdeiro singular do princípio da incerteza joão-heisenberg-gilbertiano.
E dá-lhe
dialética nas curvas do samba. Em “Quando o galo cantou”, o homem, num
monólogo, se espanta: “O que fiz pra merecer esta paz/que o sexo traz?”. A
felicidade é tão improvável que assusta. Ele roga: “Deixa esse ponto brilhar/
no Atlântico Sul”. Pois querer esticar o ponto (instante) e fazer da
felicidade moto contínuo é aguar o gozo. “Tem que sofrer pra poder amar”,
dizia Vinicius. Mesmo assim, é preciso inverter os axiomas do poeta, como no
obstinado “Funk melódico”: “O ciúme é só o estrume (e não o perfume) do
amor”. A tristeza não é deusa: ela é só o motor da transformação.
A busca de
felicidade infinda é totemizada nas cinco linhas de “Parabéns”, que reproduzem
um e-mail de aniversário transfigurado em hino tribal à velocidade e ao paroxismo
tecnológico, bombado de maracatu: “Tudo mega bom, giga bom, tera bom/Uma
alegria excelsa pra você/No paraíso astral que começa /Hehehe”.
O cortejo passa
pelo longo enredo de “Um comunista”, samba-blues de exaltação à memória do
baiano Carlos Marighella. Aqui não se trata de adesão ou protesto, mas de
constatação: “Os comunistas guardavam o sonho”.
O sonho
independe da ideologia. Não morre. Está, sempre, em algum lugar. Caetano,
utopista do Brasil no devir que já é, manda aquele abraçaço e traz na comissão
de frente a matriz: “A bossa nova é foda”, diz o refrão-título da canção que
abre o disco, endiabradamente. Endiabrados são os nossos tempos, em que “as
raças tristes” emergem, novas, em pistas e ringues, como João, ao fazer a
síntese das sínteses desse Brasil de Villa-Lobos, Noel e Tom.
Cotação: Ótimo
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En la 2da. Edición del Prêmio Contigo!, entregado el 19 de agosto de 2013, Caetano recibió los tres premios en las categorías en que participaba.
"O
disco [Abraçaço, lançado no ano passado] pra mim vale por
causa da banda. Não é brincadeira, não! Eu toco com três músicos mais jovens do
que eu e o disco ficou bonito por causa deles", declarou Caetano, enquanto
aceitava o título.
Depois, o baiano foi modesto ao dizer que receber um prêmio como "cantor" parecia "uma piada". "Mas obrigado mesmo assim", disse, bem humorado.
Antes da cerimônia, logo que chegou à festa, Caetano já revelou estar surpreso com a quantidade de indicações. "Não esperava tanto sucesso do meu CD", confessou.
Além do prêmio de Melhor Cantor segundo o júri oficial, Caetano Veloso levou os troféus de Melhor Álbum MPB, por Abraçaço, e Melhor Música, pela faixa Um Abraçaço.
Depois, o baiano foi modesto ao dizer que receber um prêmio como "cantor" parecia "uma piada". "Mas obrigado mesmo assim", disse, bem humorado.
Antes da cerimônia, logo que chegou à festa, Caetano já revelou estar surpreso com a quantidade de indicações. "Não esperava tanto sucesso do meu CD", confessou.
Além do prêmio de Melhor Cantor segundo o júri oficial, Caetano Veloso levou os troféus de Melhor Álbum MPB, por Abraçaço, e Melhor Música, pela faixa Um Abraçaço.
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En
la 14a. Entrega Anual del Grammy Latino, celebrada el 21 de
noviembre de 2013 en el Mandalay Bay Events Center de Las Vegas, Abraçaço
recibió el premio en dos categorías:
Mejor Álbum de Cantautor y
Mejor
Proyecto Gráfico (Tonho
Quinta-feira y Fernando
Young)
Caetano Veloso
Álbum “Abraçaço”
Universal Music / Polysom LP 33189-1
Lanzamiento: 17/2/2014
Lado A
2. UM ABRAÇAÇO (Caetano Veloso)
3. ESTOU TRISTE (Caetano Veloso)
4. O IMPÉRIO DA LEI (Caetano Veloso)
5. QUERO SER JUSTO (Caetano Veloso)
Lado B
2. FUNK MELÓDICO (Caetano Veloso)
3. VINCO (Caetano Veloso)
4. QUANDO O GALO CANTOU (Caetano Veloso)
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