miércoles, 21 de noviembre de 2012

1992 - POEMAS FORA DA ORDEM - PRÊMIO CAETANO VELOSO ● CONCURSO DE POESIA


En 1992, para conmemorar los 50 años de Caetano Veloso, fue lanzado el Concurso Nacional de Poesia - Prêmio Caetano Veloso.






31 de dezembro 1993.

Cultura: Derrumbando muros e alambrados

Teoria e Debate nº 23 - dezembro93/janeiro/fevereiro de 1994


A ordem não é sairmos do gueto ao qual as classes dominantes tentam nos relegar e satisfazermos todas as necessidades humanas, "provenham elas do estômago ou da fantasia"? A ordem é Poemas fora da ordem

por Alípio Freire*

Primeiro, um sexteto de câmera e dois sopranos apresentaram um conjunto de peças de música erudita. Ainda na programação, uma sofisticada performance dando conta do cotidiano de um casal, dilacerado entre as seduções da mídia eletrônica, o desejo e o sentimento do mundo. Por fim, um ousado audiovisual contraponteando com imagens, músicas de compositores contemporâneos brasileiros.

Tudo isto ao ar livre, nos bem cuidados jardins da antiga mansão que hoje abriga uma associação cultural no Corredor da Vitória, área nobre de Salvador, Bahia.

Era a noite de lançamento de um livro de poemas, terça-feira, 30 de novembro de 1993 e, não sabemos se por acaso ou por intenção deliberada dos organizadores, do alto, uma lua cheia assistia o evento.

Surpreendendo a expectativa dos que "raciocinam" por estereótipos, falamos do lançamento do livro Poemas fora da ordem, reunindo trabalhos dos vinte autores premiados no Concurso Nacional de Poesia, Prêmio Caetano Veloso, organizado pelo Sindicato dos Petroleiros da Bahia, Associação dos Engenheiros da Petrobrás (BA) e Sindicato dos Químicos e Petroquímicos (BA), com apoio da Fundação Gregório de Mattos (Prefeitura de Salvador) e CUT/BA. O local do lançamento do livro e da entrega de prêmios foi a sede da Associação Cultural Brasil - Alemanha.

Os organizadores de todo o processo - iniciado com o estabelecimento de critérios e com as inscrições para o concurso ainda em 1992 - foram Júlio César de Andrade e José Pinheiro Almeida Lima. A comissão julgadora dos trabalhos: José Carlos Capinam, Jorge Portugal e Ruy Espinheira Filho.

Na noite do evento, mais de quinhentas pessoas, reunindo artistas das diversas áreas, operários, intelectuais, trabalhadores em geral, estudantes, sindicalistas (militantes e dirigentes). O homenageado, Caetano Veloso, também estava lá.

Difícil distinguir uns dos outros naquela confraternização. E, para quê? A palavra de ordem não é unir?

A ordem não é derrubar os muros e alambrados das fábricas e escritórios, das escolas e academias e unir todos aqueles que, por ciência e/ou sensibilidade, acreditam na construção de uma nova sociedade sem exploradores e explorados, e sem opressores e oprimidos?

A ordem não é sairmos do gueto ao qual as classes dominantes tentam nos relegar e satisfazermos todas as necessidades humanas, "provenham elas do estômago ou da fantasia"?

A ordem é Poemas fora da ordem.

E é com eles que esse conjunto de entidades do movimento sindical baiano dá um alerta e sinaliza caminhos para a classe trabalhadora: a construção/concretização da "utopia" passa necessariamente tanto por atividades do tipo da que ali promoviam, quanto pelas reivindicações e greves.

Apesar de uma capa discutível, o livro resultante do concurso é irrepreensível enquanto antologia de poetas: em sua qualidade; em sua diversidade temática e de caminhos literários. Procurava-se uma boa poética e, portanto, descartou-se (não sem alguma discussão) a constituição de dois corpos de jurados como chegou a ser proposto: um para os operários, iniciantes e "humildes", e outro para (certamente) os poetas. Procurava-se a poética, e não a demagogia, o paternalismo, a pieguice. Por isto, deu certo. Deu certo também porque não se ateve à hierarquização e/ ou exclusão de tendências de expressão literária ou temas: "que cem flores desabrochem, que cem escolas rivalizem".

A leitura do livro é o melhor atestado da correção das premissas que orientaram o concurso. Ele reúne autores de diversos municípios dos estados da Bahia, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. São professores, médicos, engenheiros, operários, funcionários públicos, arquitetos. Homens e mulheres. Todos, bons poetas.

A poesia invisível
A organização do evento, por sua vez, foi resultado da arte de profissionais de obra-vida. Desses que não escrevem poemas, mas constroem condições para a emergência da poesia. Arte efêmera, mas essencial, ainda que geralmente desapercebida, invisível.


E a poesia emergiu, estava lá.

Estava lá quando, com um gesto delicado e insinuante, um mulato alto, na platéia, ofereceu uma tragada do seu cigarro a uma jovem loira e esta, depois de uma breve surpresa, aceitou, selando assim - sabe-se lá! - um velho romance, ou inaugurando um novo.

A poesia estava lá, quando o homenageado subiu ao palco para entregar o prêmio não ao primeiro, mas ao quarto colocado no concurso (a primeira das seis mulheres premiadas) e por ali ficou entre os "mortais", ciente da admiração de que era alvo, pois esta não se manifestou através de badalação ou "tietagem". Homenagem e reconhecimentos que não se traduziram em subalternidade.

A poesia estava lá também quando dos discursos dos premiados se depreendia - em síntese - que, sem poesia, chegaremos no máximo (e numa hipótese otimista) a uma reforma "sanitária": a revolução estava lá.

Mas a revolução e a poesia jamais freqüentarão os espaços das disputas dos Zezés e Oswaldos Cruz. Os espaços da fisiologia e do vale-tudo. Os espaços da caricatura, do grotesco, do vaudeville político. Oswaldo e Zezé, embora sujeitos, co-autores e protagonistas centrais da tragédia, são também - não vítimas - o resultado mais acabado de concepções desastradas e irresponsáveis. Não basta, portanto, deles nos apiedarmos, ou execrá-los como bodes expiatórios. É necessário, mais que nunca, uma profunda reflexão, que se traduza em política, em ação. Zezé e Oswaldo eram de um sindicato da CUT, entidade da qual o segundo era fundador. Oswaldo era também do PT.

Mas, se a revolução e a poesia não freqüentam o espaço dessa tragédia, menos ainda estarão nos discursos farisaicos daqueles que tentam faturar o episódio através de uma luta política igualmente fundada no vale-tudo. Uma guerra semelhante àquela desfechada pelo senhor Fernando Collor e seus celerados no segundo rumo da eleição de 1989, quando tentaram transformar a senhora Miriam Cordeiro numa anti-Medéia de subúrbio tropical.

Ou seja, a revolução e a poesia não freqüentam os discursos dos dirigentes da CGT, da Força Sindical ou dos seus aliados, como o prefeito de São Paulo, acólito do regime militar. Conivente com as torturas e assassinatos perpetrados contra os opositores naqueles anos, ele hoje se traveste de vestal em suas investidas contra a CUT e o PT.

Uma cultura centenária
Oswaldo e Zezé também são o resultado dessa cultura política assentada no tripé corrupção/chantagem/ perseguição e eliminação física dos opositores, tríade que conflui para a privatização da coisa pública e que a direita impôs à Nação. Uma cultura, que se estabeleceu desde a conquista, em 1500, trazida pelas civilizadas potências européias, e teve como epígono a ditadura. Esta promoveu seu agiornamento tecnológico e deu-lhe status de modernidade, com financiamento e treinamento oferecidos pelo não menos civilizado, democrático e moderno sistema norte-americano.


Renegar a poesia, renegar o saber, a cultura, os métodos democráticos, a ética, a crítica, é o caminho da barbárie, da bestialidade. É adotar o destino que as classes dominantes tentam nos impor: entre muros e alambrados.

Afirmar a poesia, afirmar o saber, a cultura, os métodos democráticos, a ética, a crítica, é derrubar muros e alambrados. É tomar o destino nas próprias mãos e romper com uma cultura política e uma ideologia que só servem à reprodução de sistemas de exploração e opressão.

Assistindo ao evento promovido pelos sindicalistas da CUT em Salvador, à tragédia dos rodoviários do ABC e às manifestações das centrais sindicais adversárias da CUT, só podemos concluir que alguma coisa está destoando no meio sindical.

Será a poesia?


·         Alípio Freire é editor da revista Teoria e Debate.





Poemas fora da ordem. Concurso Nacional de Poesia - Prêmio Caetano Veloso. Salvador: STIEP/AEPET/Sidiquímica/Fundação Gregório de Mattos, 1993.

20 autores premiados:
ROLLO DE RESENDE
STELLA DE RESENDE
MÁRIO CÉSAR VINHAS
CARMEN MORENO
ROBERVAL PEREYR
GERALDO MAGELA
 

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