miércoles, 19 de octubre de 2016

1998 - BELA DONNA




Dirigido por Fabio Barreto e baseado no livro "Riacho Doce", de José Lins do Rego, o filme 'Bela Donna' conta a história de um casal de norte-americanos que acaba de se mudar para o Brasil e vê o casamento desmoronar com a aproximação de um pescador local. 




Título original: BELA DONNA
Elenco: Natasha Henstridge, Eduardo Moscovis, Sophie Ward, Letícia Sabatella, Florinda Bolkan, Andrew Mccarthy
Roteiro: Fábio Barreto, José Almino, Amy Ephron
Direção: Fábio Barreto
Produção: Lucy e Luiz Carlos Barreto
Nacionalidade: Brasileira
Gênero: Drama












FOLHA DE S.PAULO
São Paulo, sexta, 14 de agosto de 1998 

“Brasileiro não aguenta ver sucesso”

DENISE MOTA
da Redação


Fábio Barreto está irritado com a crítica brasileira. Após ter o dialeto de "O Quatrilho" tachado de "italiano macarrônico", em 96, questões idiomáticas colocam o cineasta novamente na mira do que ele chama de "falta de auto-estima" brasileira.
 
"Bela Donna", quinto longa do diretor, pré-estreou em maio, no 8º Cine Ceará, e sua trama vem sendo criticada, desde então, pelo excesso de desenvoltura com que personagens rústicos falam inglês e português.
O filme -que tem, além de Eduardo Moscovis, a canadense Natasha Henstridge (de "Experiência 2", em cartaz em São Paulo) e Andrew McCarthy (de "A Garota de Rosa Shocking") nos papéis principais- é uma adaptação de R$ 5,5 milhões de "Riacho Doce", de José Lins do Rego, filmada em sete semanas e quatro dias, no Ceará.
 
Mas, se o inglês garantiu a discórdia entre diretor e crítica, por conta do elenco internacional Barreto afirma ter vendido "Bela Donna" para 40 países "antes mesmo de rodar o primeiro fotograma".
 
"O crítico brasileiro sofre de colonização. Cinema é indústria, faço filme para o público. Meu negócio é "mainstream' mesmo. Eu quero é fila", diz.
Leia, a seguir, trechos da entrevista que Fábio Barreto concedeu, em São Paulo, com exclusividade, à Folha.

Folha - Da roteirista, Amy Ephron (de "A Letra Escarlate"), à escalação de atores para os papéis principais, transparece uma preocupação em tornar o filme inteligível nos Estados Unidos...
Fábio Barreto -
A Amy Ephron é uma roteirista que pesquisa como as pessoas falavam em determinadas épocas, e foi escolhida por causa disso. A tentativa foi a de fazer um filme que tivesse aceitação vertical, que fosse interessante para qualquer tipo de público, de qualquer nacionalidade.
 

Folha - No caso brasileiro, a procura dessa "aceitação vertical" não vai acabar causando estranhamento na platéia, com diversos personagens de baixa instrução falando inglês, por exemplo?
Barreto -
Fiz esse filme porque a história dele me deu oportunidade de fazer um longa em inglês, língua que te possibilita penetração em todo o mundo.
Pessoas que trabalham para gringo, como os pescadores da história e a empregada de Donna (interpretada por Letícia Sabatella), têm de saber falar inglês. Se você vai a qualquer praia, encontra pescador falando inglês, isso nos anos 40, nos anos 30.
 
Folha - Seu filme já recebeu críticas por conta disso...
Barreto -
Isso é implicância, brasileiro é assim, não aguenta ver ninguém fazer sucesso. Fica com inveja. As pessoas têm isso no Brasil, falta de auto-estima. Os americanos não têm feito a vida inteira filmes com Cleópatra falando inglês? As pessoas acham que a gente tem de fazer filme sobre miséria. Não faço filme para crítico, faço para o público. Eu quero é fila.
 
Folha - Quais foram os critérios de escolha dos protagonistas estrangeiros, uma vez que Henstridge, por exemplo, não tinha experiência em filmes românticos?
Barreto -
Antes da Natasha, tentamos Elizabeth Shue, Cameron Diaz, Uma Thurman. Por problemas de outros trabalhos e cachê, não acertamos. Para o papel do Andrew, também tentamos James Spader, Matt Dillon, Gary Oldman. Natasha foi uma das primeiras pessoas que eu mencionei na ICM, a agência que me ajudou a levantar o elenco. O Andrew me foi oferecido e foi ótimo, é um grande ator, me ajudou com a Natasha. Ela deu muito trabalho.
 
Folha - O objetivo desse filme é familiarizar seu nome no mercado norte-americano?
Barreto -
Queria fazer o meu projeto. Não estou no ponto ainda de fazer filme de estúdio lá. Para que eu possa dar as cartas, tenho de me impor, de fazer um filme que faça muito sucesso nos EUA. Eles são os donos do mundo.
 
Folha - "Bela Donna" está talhado para fazer esse sucesso? Concorrer ao Oscar, por exemplo?
Barreto -
Para concorrer ao Oscar, "Bela Donna" tem de enfrentar os filmões de lá, como "O Resgate do Soldado Ryan" etc. Não pode concorrer como filme estrangeiro, é 85% falado em inglês.
O filme que deve ser indicado pelo Brasil agora é "Central do Brasil". E não acho que "Bela Donna" seja filme para concorrer ao Oscar, ele é muito "mainstream", não é dado a arroubos de genialidade. Não agrada ao votante da Academia, que é velhinho, gosta de coisa comportada. Mas está entregue às mãos da Pandora, se acharem que é um longa para indicação, tudo bem.
 
Folha - Não é cansativo estar sempre à sombra do Oscar, a cada filme?
Barreto -
É chato, mas é uma contingência. Cinema é indústria. O dia em que eu quiser fazer um filme de arroubo autoral, o filme que os críticos querem que eu faça, eu faço e exibo na minha casa, com meia dúzia de amigos. Faço filme para público, para passar no mundo inteiro. Meu negócio é esse, é "mainstream" mesmo.
Folha - O problema, então, é a crítica nacional?
 
Barreto - É. Ela não vê o filme brasileiro como algo industrial. O crítico sofre de colonização, quer ter o bom gosto cinematográfico sofisticado do crítico francês, europeu, não é nem o gosto americano. O crítico americano tem o gosto público, não se mistura com quem faz filme, não vai a festinha. Ele vai ver o filme no cinema, não é amigo de ninguém.





 



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