Foto: Maria Lúcia Souza |
JORNAL A TARDE, 2 de março de 1979.
Salvador, Bahia.
Entrevista
a Reynivaldo Brito
O cantor e compositor Caetano Veloso
está revoltado com as últimas
críticas dirigidas por algumas pessoas
através de artigos publicados
em jornais e revistas do Sul do país,
que tentam
impingir-lhe a idéia de alienado, que
apresenta um trabalho fora
da realidade brasileira e sem uma
conotação política.
Enfim,que pertence à “patrulha Odara”,
que estaria a fim de divertir. Mas
Caetano desabafou à Manchete
em sua casa no tranqüilo bairro de
Ondina, num intervalo de seu
show que apresentou recentemente no
Teatro Castro Alves, com
grande
sucesso de público e crítica. Ele disse
que pertence mesmo à tal
patrulha Odara que nunca se propôs a
resolver a questão
social do Brasil. “Estou a fim de
encantar e divertir as pessoas”.
Para ele o brasileiro é muito ignorante
e está tudo confuso no
Brasil. Disse ainda que “enxerga é uma
minoria privilegiada
racista que quer impor seus
comportamentos e idéias e que é um
homem livre, não pertence a partido
político e ideológico.
E que muitos artistas serão molestados
por esses que integram hoje
esta meia dúzia que faz restrições a
seu trabalho. Outros serão
alvo muito breve de críticas injustas.
Para Caetano Veloso as “pessoas são
muito burras esteticamente , e chegam ao ponto de criticar por criticar. Mas, a
música popular brasileira que está sendo feita , e consumida por aí, é a melhor
coisa que se produz atualmente no Brasil. A música popular é melhor que a
literatura, que o cinema e tudo mais. E esta crítica que vem se desencadeando
tende a cair no vazio porque não é de esquerda, nem de direita. É uma coisa
confusa e mal informada. Essas pessoas são burras esteticamente e não têm
respaldo necessário para uma discussão maior, em outro nível. Daí passam ao
ataque pessoal que é ridículo e inconcebível. Nós, os músicos, somos sagrados.
Eu sou sagrado, o Gil é sagrado, o Milton é sagrado , o Chico Buarque de
Holanda é sagrado. Nós somos sagrados”. Continuando seu desabafo Caetano
afirmou que “se fôssemos fazer uma caricatura da sociedade civil brasileira
poderíamos colocar esta pequena minoria racista como a corte e nós somos os
bárbaros.Daí teria surgido a idéia de “Doces Bárbaros”,porque isto é coisa de
Roma e África do Sul. Uma minoria privilegiada que não aceita a nossa
presença.E falo aqui em nome de nós os músicos , aqueles que produzem.E,
falando por mim, devo dizer que eu Caetano Veloso sou um homem puro. As pessoas
têm medo disto.Imagine que as pessoas têm nojo até da própria mãe.Basta lembrar
que a crítica caiu em cima de mim porque apareço na capa do meu disco deitado
no colo da minha mãe. Eu não tenho vergonha da minha mãe.Tenho Orgulho, e é por
isto que estou em pânico e ao mesmo tempo maravilhado com isto tudo que está
ai.”
FUNÇÃO DO ARTISTA
Caetano acha que “ a função do artista
na sociedade é produzir arte. As sociedades produzem este tipo de personalidade
porque precisam de pessoas que façam arte.Elas forjam estas personalidades,
pedem. Há uma demanda dessas psicologias, pessoas que estejam destinadas a
produzir arte. O resto é corolário.Com isto não quer dizer que no meu caso,
basicamente trabalho para o divertimento, para o entretenimento. Eu não vivo mais
no tempo onde se tem uma noção assim muito pura da arte. Assim como um objeto
intocável,muito puro. Eu acho que a gente faz entretenimento para um grande
número de pessoas e esse é o nosso trabalho.Tanto eu como o Gilberto Gil, o Glauber
Rocha, a Elizeth e muitos outros”.
- Ächo que existem grandes massas e que se faz um trabalho de entretenimento. E, se faz isto. Eu faço isto.Todo mundo faz isto. Todo mundo que faz disco faz isto.Isto é a realidade básica da nossa profissão e ninguém pode tentar esconder porque é isto. Agora eu não sou consumista no sentido de atender ao consumo imediato.Acho isto uma coisa boa.As sociedades são de massas. Há uma quantidade imensa de gente no mundo.As coisas são produzidas para esta gente.Um disco é uma coisa que é reproduzida e vendida para milhões de pessoas. Uns vendem 50 mil, outros 90 mil até 300 mil . Nos Estados Unidos tem gente que vende 5 milhões e 10 milhões de discos e assim por diante. Não sei, no mundo todo as pessoas vendem muitos discos. Não sei.
É verdade isto, isto existe e a gente trabalha nisto. E isto é arte. Não sei diferençar exatamente. Há uma demanda para a existência disto. Agora, que dentro disto os temas políticos apareçam ou não para mim pode acontecer. É uma coisa natural. Como os temas políticos são de interesse das pessoas e há uma demanda muito grande que também eles sejam tratados nas obras de arte. Agora, o que acho , é que há assim um consumismo. Trabalho dentro disto,dentro deste lance sabendo o que é, com a minha liberdade, na minha profissão e na minha função dentro da sociedade . Como não estou preso e obrigado a fazer música de discothéque , a fazer baião. Nada. Não sou obrigado a tratar de determinados temas porque estão na moda. Acho que há uma moda de esquerda, uma moda consumista de esquerda. Isto é, você vende uma moda de bandeira política de esquerda. Pode ser de maneira mais primária possível e algumas pessoas aceitam. Revelou ainda Caetano Veloso “que na verdade muitos estão nessa porque dá muita grana. Ficam dizendo : Ah ! Caetano não sei o que mais.É da Patrulha Odara. E daí? Sou mesmo da Patrulha Odara .”
- Ächo que existem grandes massas e que se faz um trabalho de entretenimento. E, se faz isto. Eu faço isto.Todo mundo faz isto. Todo mundo que faz disco faz isto.Isto é a realidade básica da nossa profissão e ninguém pode tentar esconder porque é isto. Agora eu não sou consumista no sentido de atender ao consumo imediato.Acho isto uma coisa boa.As sociedades são de massas. Há uma quantidade imensa de gente no mundo.As coisas são produzidas para esta gente.Um disco é uma coisa que é reproduzida e vendida para milhões de pessoas. Uns vendem 50 mil, outros 90 mil até 300 mil . Nos Estados Unidos tem gente que vende 5 milhões e 10 milhões de discos e assim por diante. Não sei, no mundo todo as pessoas vendem muitos discos. Não sei.
É verdade isto, isto existe e a gente trabalha nisto. E isto é arte. Não sei diferençar exatamente. Há uma demanda para a existência disto. Agora, que dentro disto os temas políticos apareçam ou não para mim pode acontecer. É uma coisa natural. Como os temas políticos são de interesse das pessoas e há uma demanda muito grande que também eles sejam tratados nas obras de arte. Agora, o que acho , é que há assim um consumismo. Trabalho dentro disto,dentro deste lance sabendo o que é, com a minha liberdade, na minha profissão e na minha função dentro da sociedade . Como não estou preso e obrigado a fazer música de discothéque , a fazer baião. Nada. Não sou obrigado a tratar de determinados temas porque estão na moda. Acho que há uma moda de esquerda, uma moda consumista de esquerda. Isto é, você vende uma moda de bandeira política de esquerda. Pode ser de maneira mais primária possível e algumas pessoas aceitam. Revelou ainda Caetano Veloso “que na verdade muitos estão nessa porque dá muita grana. Ficam dizendo : Ah ! Caetano não sei o que mais.É da Patrulha Odara. E daí? Sou mesmo da Patrulha Odara .”
RESPONSABILIDADE E PÚBLICO
Disse Caetano Veloso que “não
identifica o seu público como universitário. Há muitos estudantes evidente que
se interessam por mim e muita gente já deixou a universidade, e também
estudantes secundários e mesmo gente que nunca foi à escola. Muita gente que
não é estudante. O meu público não é basicamente de estudantes.”
Quanto à responsabilidade para com este seu público ele revelou que “minha única responsabilidade com o público que me acompanha é de manter a mesma responsabilidade, relação como o que faço e com o que atraiu essas pessoas a gostarem e acompanharem o que estou produzindo. Como comento isto, como trabalho, minha liberdade , minha coragem. Isto é uma coisa boa. A minha sinceridade, é isto que está ai. A minha responsabilidade. E sou cem por cento responsável por isto. Por outro lado, não tenho muita responsabilidade para fazer aquilo que o público quer. Seja lá que público for. Ele pode estar com a opinião mais certa do mundo, quer que eu diga aquilo.Podem querer, mas eu não quero.Só faço aquilo que acho que devo fazer. Se não estou para dizer aquilo, não vou dizer.Quanto mais que não é isto que se passa.O que se passa é uma porção de gente confusa.O brasileiro é muito ignorante. Poucos chegam numa universidade precária, ( e nós somos um pequeníssimo número de pessoas que consegue chegar lá ). As universidades são precárias. É tudo confuso no Brasil. As pessoas não têm muitas informações .As universidade não são boas. Não existe um nível aceitável de informação. Quero dizer que não há, assim, platéias bem formadas,grandes minorias de massas que possam sustentar uma opinião. Mas ,não existe nada disso.É preciso até ter um cuidado no que falar. Eu mesmo sou confuso quando falo e devo ter cuidado para que não haja tantos mal entendidos. O que existe muito é mal entendido. O Brasil é muito grande, muito confuso e muito pobre “.
Quanto à responsabilidade para com este seu público ele revelou que “minha única responsabilidade com o público que me acompanha é de manter a mesma responsabilidade, relação como o que faço e com o que atraiu essas pessoas a gostarem e acompanharem o que estou produzindo. Como comento isto, como trabalho, minha liberdade , minha coragem. Isto é uma coisa boa. A minha sinceridade, é isto que está ai. A minha responsabilidade. E sou cem por cento responsável por isto. Por outro lado, não tenho muita responsabilidade para fazer aquilo que o público quer. Seja lá que público for. Ele pode estar com a opinião mais certa do mundo, quer que eu diga aquilo.Podem querer, mas eu não quero.Só faço aquilo que acho que devo fazer. Se não estou para dizer aquilo, não vou dizer.Quanto mais que não é isto que se passa.O que se passa é uma porção de gente confusa.O brasileiro é muito ignorante. Poucos chegam numa universidade precária, ( e nós somos um pequeníssimo número de pessoas que consegue chegar lá ). As universidades são precárias. É tudo confuso no Brasil. As pessoas não têm muitas informações .As universidade não são boas. Não existe um nível aceitável de informação. Quero dizer que não há, assim, platéias bem formadas,grandes minorias de massas que possam sustentar uma opinião. Mas ,não existe nada disso.É preciso até ter um cuidado no que falar. Eu mesmo sou confuso quando falo e devo ter cuidado para que não haja tantos mal entendidos. O que existe muito é mal entendido. O Brasil é muito grande, muito confuso e muito pobre “.
RACISMO
- Estou querendo e ganhei consciência
que aqui é muito África do Sul. A sociedade civil brasileira, enfim, a vida
civilizada, urbana brasileira é uma pequenina nata.As pessoas que chegam à
universidade, que escrevem nos jornais e lêem as revistas são assim os brancos
da África do Sul.Uma minoria racista, privilegiada e de direita ou de esquerda,
distante completamente do que seja a verdadeira realidade do país Brasil. Esta
é a angústia que sente Caetano Veloso que diz a seguir: “é uma angústia muito
grande que sinto por tudo isto. Gostaria de compartilhar com meus compatriotas
para ver se a gente amadurece esta colocação minha. Compartilhar para ver o que
existe realmente”. Continua o seu desabafo duro e sincero . “Daí atribuir às
críticas e uma campanha que algumas pessoas ditas de esquerda vêm tentando
fazer ao grupo baiano como racistas. Acho que é uma metáfora da realidade.Acho
que o fato de eu me dizer mulato, como eu disse numa canção, é o modo de
traduzir uma coisa, que digo com meu modo de ser e, o fato de reagirem ao meu
modo de ser, é também um modo de reagir à mulatice verdadeira que há em tudo
isto. Acho racista esta coisa toda. Mas, não caracterzaria com tanta facilidade
assim esta crítica como de esquerda. Esta crítica pretensiosa que se faz no
Brasil procura se dizer de esquerda. Eu pessoalmene não caracterizaria como
sendo de esquerda. Não há uma clareza muito grande nisto. Acho que, por
exemplo, o que me revolta é ler um artigo como eu li do Mauricio Krusbusli, que
escreveu no jornal do Brasil em que ele falava de mim e dava eu como morto. De
mil ele disse que o Caetano era desde mil e novecentos e pouco. Ai eu já sou um
gato escaldado. Já li aquilo, com muita tranqüilidade, estava também no artigo
uma crítica ao Milton Nascimento que não corresponde também à realidade. O
Milton Nascimento é um sujeito maravilhoso. Ele é um sujeito inspirado. É uma
pessoa que porta o maravilhoso. Eu percebo sinto como artista e achei o disco
novo dele “Clube da Esquina no. 2”algo maravilhoso, muito bonito.E ele tinha
feito uma apresentação no Festival de Jazz e ,eu vi na televisão no Rio. Eu vi
ali o maravilhoso. Embora estivesse ali uma apresentação do ponto de vista
profissional cheia de defeitos, com todos os defeitos que você possa imaginar,
porque já estava uma `coisa desleixada, já que eles tinham feito um show tarde,
tinham feito uma grande farra e o show saiu confuso. Mas, os críticos que
esculhambaram com ele tinham visto o show na parte da tarde. Mas, só falaram da
noite. Neste artigo o Maurício diz que o Milton já começa a sua descida. E, falou
mal do disco do Milton de uma maneira injusta e incoerente. Esquece de coisas
boas que ele vinha falando até então. Isto é esquerda? Não é esquerda, nem
direita. Isto é baixo nível moral.Para mim é isto, baixo nível moral. É uma
coisa destrutiva e doentia. Estou dando este caso como exemplo, mas milhões
desses estão acontecendo por ai.
Falando também de algumas críticas por ele consideradas injustas dirigidas por Maria Helena Dutra , o cantor Caetano Veloso disse que recentemente ela elogiou o meu show mas de maneira burra.Ela disse que neste, eu tirei os enfeites feios dos show Bicho, do “Bicho Baile Show”. Na verdade as roupas do Baile Bicho Show eram lindíssimas. É porque as pessoas são muito burras e praticamente não conhecem nada.Todas as fotos que vejo do Bicho Baile Show são lindas. As roupas são lindas, e no entanto falou que eram feias e que agora estou bem. Isto porque estou discreto vestido de short e camiseta, que é uma coisa simples. Pensando certamente que estou renegando aquela roupa maravilhosa do Bicho Baile Show, quando não é verdade. Não existe este negócio de renegar”.
Caetano volta a falar das críticas dirigidas a Milton Nascimento e confessa ter ficado muito contente por Milton ter falado, “ele que não é de muito de falar. Agora ele está falando botando pra fora. Acho isto genial.Mas o que sinto em música popular brasileira é que está tudo maravilhoso. Acho mesmo que o Chico é maravilhoso, vai ser atacado em breve por este pessoal.Vão demonstrar quão inimigos eles são do que tem de maravilhoso em Chico Buarque. A mesquinhez também o vai atingir, porque eu me sinto identificado com Chico, com Hermeto Pascoal, com Elizeth Cardoso, Isaurinha Garcia,Maria Bethânia,Dominguinhos, Jackson do Pandeiro. Acho que a música popular do Brasil é a única fresta. É realmente por onde passa alguma coisa assim, seja da força que vem de baixo do Brasil, seja do futuro do Brasil, do mundo ou do planeta ou do inconsciente do Brasil. Alguma coisa disto se passa atualmente pela música popular brasileira e fazem tudo isto para impedir que aconteça. É isto o que está acontecendo , porque elas representam a repressão. Se dizem ser de direita ou de esquerda, na verdade esses que se arvoram de críticos representam a repressão a isto que acontece, que não sei o nome, mas que eu represento. Não sozinho, mas juntamente com Chico Buarque, Lúcio Alves, Dóris Monteiro , Antônio Carlos Jobim e muitos outros. Eu tenho uma verdadeira mística em relação à música popular brasileira”.
Diz Caetano que “nossa música popular brasileira é melhor que o cinema, que a literatura, do que a política, do que a religião, do que tudo. Eu acho. Tenho uma relação mística com música popular do Brasil. E me sinto sagrado, porque faço parte de música popular do Brasil, porque componho , canto, e atuo nesta área. Vejo misticamente. Acho que nós que fazemos música popular no Brasil, seja originário do interior da Paraíba, entendeu? Ou filho da família Buarque de Holanda, nós somos todos sagrados e portadores de ma coisa extraordinária que não sei o que é, mas que está no futuro, mais embaixo, dentro, escondido no Brasil. E todos aqueles que fazem as coisas mesquinhas contra nós, porque falo em nosso nome, são inimigos de uma verdade grandiosa que eu não sei o que é, não sei dizer o que é, mas`que eu vivo. E que eles não querem que nem se insinui e e pronto ! É isto que vejo no Milton Nascimento eu revolto, quando o Mauricio Krusbusli diz que Milton teve ascensão e ubiu, desceu. Eu sou paranóico, sagrado. Acho que Milton é sagrado, que Chico é sagrado e que ninguém tem direito de ser louco . Eles têm seu emprego escrevem o que quiser. Eu falo o que quiser. Esta é a minha opinião”.
Falando também de algumas críticas por ele consideradas injustas dirigidas por Maria Helena Dutra , o cantor Caetano Veloso disse que recentemente ela elogiou o meu show mas de maneira burra.Ela disse que neste, eu tirei os enfeites feios dos show Bicho, do “Bicho Baile Show”. Na verdade as roupas do Baile Bicho Show eram lindíssimas. É porque as pessoas são muito burras e praticamente não conhecem nada.Todas as fotos que vejo do Bicho Baile Show são lindas. As roupas são lindas, e no entanto falou que eram feias e que agora estou bem. Isto porque estou discreto vestido de short e camiseta, que é uma coisa simples. Pensando certamente que estou renegando aquela roupa maravilhosa do Bicho Baile Show, quando não é verdade. Não existe este negócio de renegar”.
Caetano volta a falar das críticas dirigidas a Milton Nascimento e confessa ter ficado muito contente por Milton ter falado, “ele que não é de muito de falar. Agora ele está falando botando pra fora. Acho isto genial.Mas o que sinto em música popular brasileira é que está tudo maravilhoso. Acho mesmo que o Chico é maravilhoso, vai ser atacado em breve por este pessoal.Vão demonstrar quão inimigos eles são do que tem de maravilhoso em Chico Buarque. A mesquinhez também o vai atingir, porque eu me sinto identificado com Chico, com Hermeto Pascoal, com Elizeth Cardoso, Isaurinha Garcia,Maria Bethânia,Dominguinhos, Jackson do Pandeiro. Acho que a música popular do Brasil é a única fresta. É realmente por onde passa alguma coisa assim, seja da força que vem de baixo do Brasil, seja do futuro do Brasil, do mundo ou do planeta ou do inconsciente do Brasil. Alguma coisa disto se passa atualmente pela música popular brasileira e fazem tudo isto para impedir que aconteça. É isto o que está acontecendo , porque elas representam a repressão. Se dizem ser de direita ou de esquerda, na verdade esses que se arvoram de críticos representam a repressão a isto que acontece, que não sei o nome, mas que eu represento. Não sozinho, mas juntamente com Chico Buarque, Lúcio Alves, Dóris Monteiro , Antônio Carlos Jobim e muitos outros. Eu tenho uma verdadeira mística em relação à música popular brasileira”.
Diz Caetano que “nossa música popular brasileira é melhor que o cinema, que a literatura, do que a política, do que a religião, do que tudo. Eu acho. Tenho uma relação mística com música popular do Brasil. E me sinto sagrado, porque faço parte de música popular do Brasil, porque componho , canto, e atuo nesta área. Vejo misticamente. Acho que nós que fazemos música popular no Brasil, seja originário do interior da Paraíba, entendeu? Ou filho da família Buarque de Holanda, nós somos todos sagrados e portadores de ma coisa extraordinária que não sei o que é, mas que está no futuro, mais embaixo, dentro, escondido no Brasil. E todos aqueles que fazem as coisas mesquinhas contra nós, porque falo em nosso nome, são inimigos de uma verdade grandiosa que eu não sei o que é, não sei dizer o que é, mas`que eu vivo. E que eles não querem que nem se insinui e e pronto ! É isto que vejo no Milton Nascimento eu revolto, quando o Mauricio Krusbusli diz que Milton teve ascensão e ubiu, desceu. Eu sou paranóico, sagrado. Acho que Milton é sagrado, que Chico é sagrado e que ninguém tem direito de ser louco . Eles têm seu emprego escrevem o que quiser. Eu falo o que quiser. Esta é a minha opinião”.
ESTÃO COM MEDO
Para Caetano Veloso “eles estão com
medo e gostam muito de se identificar com a esquerda. Eu sinceramente não vejo
esquerda, direita. O que vejo é uma confusão e falta de informação total. Eles
pretendem falar em nome do povo, mas o que vejo é uma coisa muito vaga. Vejo
muita gente por aí, com milhões de coisas. Sou do interior da Bahia já morei em
Salvador, em São Paulo com e sem dinheiro, moro no Rio de Janeiro com dinheiro
e tenho muitas visões e sensações do Brasil. Quase nunca vi alguém falar alguma
coisa que se parecesse com o que vejo, exceto nas canções populares e nos
filmes de Glauber Rocha e em alguns filmes e livros de outros autores, mas são
poucos. A maioria das coisas não tem nada a ver com as coisas que vejo e sinto
. Muito menos nestas críticas. Como sou vítima de um problema deles lá, eu
reajo. Claro que reajo e é uma questão de honra, uma questão moral, também, não
posso deixar de reagir”.
"PATRULHA ODARA"
Falando sobre a conotação que estão
dando chamando os baianos de integrarem a uma tal de “Patrulha Odara” Caetano
revela que “realmente pertence a esta patrulha. Quanto ao centralismo no Rio de
Janeiro é uma coisa que existe e é utilizada por eles. “Eu acho que é. Que tem
um peso esse negócio do Sul ou seja, o centro da sociedade civil brasileira ,
que é o Rio de Janeiro e São Paulo contra o subdesenvolvimento. Quer dizer ,
principalmente o Rio de Janeiro, já que São Paulo é um centro mais industrial,
e, o Rio é um centro mais social, um centro cultural, social. É a Corte. O Rio
é a Corte. Ali fica todo mundo nos bares, etc. Numa caricatura representaria
muito bem os brancos da África do Sul. Mas acho que há muito racismo contra os
baianos, contra o Nordeste. O Pasquim naquela época em que voltei de Londres
fazia uma brincadeira constante de esculhambar com os baianos e nos chamavam de
baiunus como se o Rio fosse a Roma e nós fôssemos os bárbaros. Isto até influiu
em eu botar o nome de nosso grupo de “Doces Bárbaros” . Acontece que acho que a
coisa toda é centrada no Gil, no Caetano e no Glauber. A coisa toda contra os
baianos . Por ser baiano a gente tem uma certa união, coincidência de atitudes,
uma coragem maior de mexer com esta coisa toda , a gente é independente, de
apresentar um Brasil livre, de procurar que o Brasil se expresse de verdade.
Então os caras ficam contra nós e a reação fica forte. Fica uma moda. É moda
falar de Caetano, Gil, etc. Isto é péssimo porque vai desprestigiando, embora
não pareça nada. Na verdade desprestigia. Quando falei do negócio do Milton
Nascimento eu queria mostrar que é a mesma coisa. Não existe uma secção . A
secção está no racismo, no preconceito. Acho que os baianos faziam o mesmo com
os sergipanos numa situação semelhante. Mas acontece que não há uma situação
semelhante”.
INVESTIDA DOS CEARENSES
Disse Caetano que “há tempos atrás , o
chamado Grupo Cearense fez uma investida contra os baianos, mas que foi uma
investida burra. Eles tentaram utilizar (foi uma coisa suicida ) esta reação
que existe contra nós, este racismo. A gente não é mau. Senão eu e o Gil
teríamos acabado com isto. Mas ,a gente viu que foi uma coisa muito burra. Eles
tentaram utilizar o preconceito contra nós como a catapulta de lançamento
deles. Quer dizer, no momento que os cariocas estavam dizendo assim no Pasquim
e naqueles bares de noite e nas ruas. Chega desses baianos. Tem que acabar com
esses baianos. O Fagner , por exemplo, usa muito essas de dizer, vou pegar. É
uma coisa meio sabida. Vou dizer que eles passaram, que é preciso vir gente
nova. Mas ele falou tão burro, que apresentou como gente nova Capinam e Abel
Silva. Ora, Capinam além de ser baiano e ter trabalhado no Tropicalismo é mais
velho que eu. Então, ficou ridículo ele declarar isto na Revista Veja. Então o
próprio Belchior fez uma coisa mais inteligente porque não criou inimizade e
botou a brincadeira dentro de sua música, das letras deles. Uma coisa assim de
“é preciso renovar o elenco”. É consumismo, tudo isto é consumismo. Eu sou
puro. Eu. Caetano Veloso sou um homem puro. E escrevi esta frase numa carta que
enviei a Revista Veja: Eu, Caetano Veloso sou um homem puro e a Veja cortou
esta frase. Gostaria até que você contasse isto na sua revista ( Na época fiz
esta matéria para a Revista Manchete, onde era repórter) . Não sei se pode.
Mas, eu pergunto qual a razão de ter cortado a frase? Eu sou um homem puro. Mas
diante desta estória do Fagner, isto é , falar como se eu fosse modelo de
automóvel para todo ano ser renovado e jogado fora, acontece que não sou
automóvel, nem sabonete. Sou um homem. Sou do Recôncavo da Bahia, nasci em
Santo Amaro da Purificação , tendo pai e mãe , coisa que essas pessoas têm
dificuldade enorme de admitir. Basta lembrar, porque fiz uma capa de disco onde
aparece uma foto imensa minha com minha mãe, a crítica esculhambou, também o
público não comprou um pouco por causa disto. As pessoas têm nojo da mãe. Eu
não. Eu existo. Sou de carne e osso, tenho emoções , entendeu? Não estou a
serviço de nenhuma ideologia. Sou uma pessoa. Estou em pânico e deslumbrado com
tudo que existe ao mesmo tempo. Agora, este papo furado de que está certo e
errado. É tudo mentira. Olho e ouço os caras falando e não acredito. Sou puro
neste sentido. Não estou ai para ser sabonete e automóvel,não. Não estou nesta
de que esses caras têm que mudar. Mas, se mudar estou aí. Encontro a nova
realidade e ajo como ela tá. Vejo o que é que vou fazer aí no lance, e tudo
bem. A gente nasce no mundo e não numa folha de papel em branco. Não. O homem
não é parado. É neste sentido que acho uma loucura este negócio de consumismo.
Acho um absurdo isto tudo”.
PRESO E EXILADO
Lembra Caetano que “a censura é prejudicial a seu
trabalho. Diretamente para o meu trabalho tem prejudicado pouco. Porém
indiretamente muito. É aí que estou com Chico Buarque quando ele falou que se
você passa anos com a divulgação das obras muito limitada,você vai perder o
diálogo , o nível do diálogo da criação. Explico: você deixa de ver várias
peças de teatro onde acontecem determinadas e várias coisas, você não é
estimulado a fazer outras, que vão além. Acho que a limitação da divulgação e de
obras é uma coisa que lesa os artistas, mesmo que não seja diretamente. Acho
isto ainda uma coisa mais profunda em relação a isto. Não fui muito censurado,
mas é preciso não esquecer que fui preso e exilado . Então é uma coisa muito
desparatada porque ao mesmo tempo que a censura atua assim, por outro lado, em
determinados aspectos ela se mostra ( e é por isto que Glauber tem se mostrado
meio simpatizante das possibilidades do governo militar no Brasil, entendeu?
Porque a censura , como o governo militar tem um aspecto positivo neles, e acho
que o Glauber vê isto assim como uma metáfora) em luta contra a sociedade civil
brasileira. É aí que está a identidade”.
“DISCOTHÉQUE”
Diz Caetano Veloso que “esses críticos têm medo.
Têm muitos problemas com relação as coisas que acontecem. Na semana passada uma
moça que trabalha num jornal de Salvador veio com uma pergunta, era uma
enquete, onde estava escrito para ela perguntar a mim o seguinte: o rock and
roll foi tipicamente um movimento musical de forte conteúdo social e
revolucionário, enquanto que a discothéque é conservadora e alienada. Fiquei
chocado, porque isto é uma loucura, este tipo de pauta que estava me mostrando
( e a menina ria muito, achando aquilo muito ridículo), mas, me disse, eu estou
aqui com a pauta, que é uma pergunta do jornal. Ora, o rock and roll é uma
coisa muito velha, eu era criança quando apareceu. O rock and roll foi
considerado na época o máximo do conservadorismo e da alienação. Nunca ninguém
achou que aquilo era revolucionário, não. Até os Beatles que eram rivais do
rock and roll, que surgiram dez anos depois ainda eram considerados
conservadores e alienados. Ainda era uma coisa alienada e conservadora, no
Brasil alguém se interessar pelos Beatles. Hoje, vinte anos depois as pessoas
dizem que o rock and roll era revolucionário e a discothéque reacionária. Então
fico vendo que é uma coisa de ter medo pelo que está acontecendo. Eu acho a
discothéque na maioria das vezes chata. Não gosto de ouvir Donna Summers, acho
que tem muita música igual. Agora gostava daquela discoteca Dancing Days’s que
tinha no Rio. Adoro “soul music “ . Adoro ver e ouvir preto cantando. Preto
americano. E mais, do eu tudo gosto de Bob Marley, da Jamaica. Eles não seriam
nem capazes de diferençar se você botar um disco de Donna Summers e do Bob
Marley e do James Brown, e dizem que tudo é discothéque e que está aí para
destruir as características culturais brasileiras. Agora, eu não sou do MEC,
não sou da censura. Não trabalho no MEC e nem na censura. Então não sou eu que
vou controlar. Agora, eu tenho minhas escolhas e eleições. Quer dizer. Eu gosto
do que gosto. Eu sou democrata, sou mulato democrata”.
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