miércoles, 5 de diciembre de 2012

1984 - VELÔ









14/11/1984 - Folha de S.Paulo


Julho 1984


1984


Foto: Gilda Midani



"Foi muito falado. Foi até escolhido por uma lista dos melhores da década. "O Homem Velho" é a mais bonita. Tem "Língua" e "Podres Poderes". "Quereres" é também muito bonita."



[Caetano Veloso, 16/5/1991. Entrevista con Márcia Cezimbra - JB]




El cuarto Disco de Oro.



Banda Nova

RICARDO CRISTALDI: teclados
ZÉ LUÍS: saxo y flauta
TAVINHO FIALHO: bajo
TONI COSTA: guitarra
MARCELO COSTA: batería
MARÇAL: percusión


Marcelo Costa, Ricardo Cristaldi, Marçalzinho, Caetano, Tavinho Fialho, Zé Luis e Toni Costa





1984
VELÔ
PolyGram / Philips LP 824.024-1 / CD 824.024-2

Producción: Caetano Veloso y Ricardo Cristaldi


Lado A
1. PODRES PODERES (Caetano Veloso)
2. PULSAR (Caetano Veloso/Augusto de Campos)
3. NINE OUT OF TEN (Caetano Veloso)
4. O HOMEM VELHO (Caetano Veloso)
5. COMEU (Caetano Veloso)
6. VIVENDO EM PAZ (Tuzé Abreu)

Lado B
1. O QUERERES (Caetano Veloso)
2. GRAFFITI (Caetano Veloso/Antônio Cícero/Waly Salomão)
3. SORVETE (Caetano Veloso)
4. SHY MOON (Caetano Veloso) Participación Especial: Ritchie
5. LÍNGUA (Caetano Veloso) Participación Especial: Elza Soares






DISCO - ENTREVISTA
ENTREVISTA COM CAETANO VELOSO
SOBRE O LANÇAMENTO DO LP "VELÔ"
A. 21:45
B. 21.05
Philips 2809 165 [Promocional]


Duración: 42:50
Entrevista con Ana Lúcia Novaes, realizada en noviembre de 1984.



Texto completo

P - AO CONTRÁRIO DO QUE VOCÊ FAZ ANUALMENTE, ESSE ANO VOCÊ LANÇOU O SHOW ANTES DO DISCO. O QUE VOCÊ PRETENDEU COM ISSO E QUAIS OS RESULTADOS PRÁTICOS OBTIDOS COM ESSA EXPERIÊNCIA?

R – É esse ano eu resolvi fazer assim. Olha, o resultado – pra começar pelo final da pergunta – me pareceu o melhor possível, porque o espetáculo, o show com as canções nova funcionou ao mesmo tempo como estímulo pra platéia, estímulo pra mim, pros músicos e também como treinamento para a gravação do disco. De modo que, quando a gente chegou no estúdio a gente estava mais ou menos com os arranjos afiados. Foi so super elaborar em cima do que já estava feito. Então eu acho que foi bom. Eu resolvi fazer porque eu estava com vontade de fazer um espetáculo que valesse por si mesmo como espetáculo pra dai então tirar o repertorio do disco.


P – O DISCO VELÔ, ASSIM COMO O SHOW, TAMBÉM CHEIRA MAIS A TRABALHO DO QUE OS DISCOS ANTERIORES?

R – O disco também tem cheiro de trabalho, eu suponho, Eu estou ouvindo as faixas mixada depois da coisa pronta, tou achando que ele tem cheiro de trabalho, gosto de trabalho, diferente dos últimos discos que eu vinha facendo, que tem muito mais gosto de lazer e prazer. Esse, embora tenha muito prazer, mas tem gosto e cheiro de trabalho, que não tinha nos outros muito. O disco também tem.


P – VOCÊ MESMO OBSERVOU QUE A EXPRESSÃO ROCK AND ROLL APARECE EM QUATRO DAS NOVAS CANÇÕES. COMO VOCÊ SE COLOCA DIANTE DO ROCK E QUAL O PAPEL QUE ELE DESEMPENHA, NA SUA OPINIÃO, NA M.P.B.?

R – Eu gosto de rock desde o meio dos ano 60. Desde que eu comecei a me interessar por Roberto Carlos e pelos Beatles. Então eu fiquei super interessado na coisa do rock and roll, mesmo do que tinha acontecido antes do Robero Carlos e dos Beatles. Eu comecei com o Roberto Carlos, sinceramente, e deposi passei pros Beatles e daí para os Rolling Stones e tudo mais que veio deposi e que também já tinha acontecido antes. Eu sou uma dessas pessoas em que o rock and roll bateu, como se diz. É uma coisa que aconteu, que começou nos anos 50, que eu tenho conhecimento desde menino, mas que no meio dos anos 60 bateu pra mim. Deu como uma dimensão nova pra minha cabeça. Desde então, desde muito antes, o rock tem sido considerado uma coisa descartável e já esiste desde os anos 50 e já estamos nos anos 80 e ainda é uma palavra que significa força, que significa vitalidade, capacidade de criação. E agora no Brasil, como no mundo, também houve um recrudescimento, quer dizer, um refortalecimento dessa onda de atitude rock. Eu fico contente. Eu me sinto muito identificado com esses periodos mais rock.


P – MAS O ROCK NUNCA FOI A BASE DO SEU TRABALHO...

R – Agora, é evidente que não é a base do que eu faço, porque a minha base vem de música brasileira tradicional e também da bossa nova. Mas, a coisa do rock deu uma virada pra mim, inclusive para eu ver essas coisas que eu já conhecia desde pequeno. Agora, o fato de aparecer a expressão rock and roll em quatro canções do meu repertorio novo, eu atribuo ao fato de ser uma coisa tão importante e no momento estar renascendo assim como força. Então apareceu inconscientemente como um modo de festejar isso.


P – VOCÊ FALOU EM ATITUDE ROCK. VOCÊ NÃO ACHA QUE AQUI NO BRASIL O MOVIMENTO ROCK CHEGA DILUÍDO, SE LIMITANDO A UMA PROPOSTA MAIS MUSICAL DO QUE SOCIAL OU POLÍTICA?

R - Não, não acho. Eu acho que também no Brasil, o que a gente chama de rock esse tempo todo ë uma coisa bem mais - por isso eu falei atitude rock - ligada a uma atitude perante ao mundo e um modo de ver as coisas, do que propriamente uma forma musical. Se a gente for querer ser estritamente musical com relação ao rock, a gente vai terminar tendo que dizer o que o Mick Jagger me disse na entrevista que eu fiz com ele em Nova York, mais ou menos ironicamente, quer dizer, que o rock não é música, que o rock estã para a música assim como a ilustração de revista está para a pintura. E no entanto ele faz rock até hoje e a gente acha uma maravilha e ë uma maravilha. Se a gente for pensar do ponto de vista estritamente musical, a gente vai reduzir ao rock ao "twelve bop blues", quer dizer, aos blues de 12 compassos, que é uma forma que tem desde o inicio do blues nos Estados Unidos. Não é uma coisa que apareceu nos anos 50 e muito menos nos anos 60 com os Beatles. Não apareceu com o Elvis, nem com o Little Richard, nem com Chuck Berry, nem com os Beatles e os Rolling Stones. É tradicional da música americana. Como forma musical não seria tão importante. O que fez do rock uma coisa muito importante foi a atitude de determinadas pessoas em determinadas época de,usando a música, transar com o mundo de una maneira diferente. Isso transformou o rock numa coisa forte e importante, mais do que a música, como música em si.


P – VOCÊ SENTE QUE O ROCK QUE SE FAZ NO BRASIL TEM ESSA FORÇA DE TRANSFORMAÇÃO?

R - Eu acho que também no Brasil tem. Eu, modéstia a parte, acho que o rock desempenhou no trabalho meu e do Gil e do pessoal da época do Tropicalismo, da Gal, um papel determinante, assim muito importante, porque a gente de uma certa forma tomou a peito uma atitude de aprovação do rock e de identificação assumida com o estilo rock and roll de ver e transar o mundo. Na verdade isso resultou muito forte no Brasil. O fato de nós termos nos interessado pelo rock naquele período - 66, 67, 68 – da gente ter exposto o nosso interesse pelo rock ao público e através do nosso próprio trabalho musical, causou transformações importantes no Brasil. Então, sem modéstia, eu sei que mesmo através de mim o rock causou transformações importantes no Brasil. E depois de mim continua causando. E no momento tem toda uma nova geração de gente muito nova, bem ligada ao rock, super interessantes, que tão trazendo assim uma força nova para a sensibilidade pública no Brasil. Quando eu ouço a Marina, o Lobão, ouço o Barão Vermelho, a Blitz, eu sinto que isso está acontecendo, que isso tem uma importância social , sobretudo social, até mais do que musical.


P – VOCÊ DISSE QUE NÃO PENSAVA MAIS EM FAZER CANÇÕES EM INGLÊS E QUE VOCÊ SE ENVERGONHAVA DA MAIORIA DELAS, COM EXCEÇÃO DE NINE OUR OF TEN. ENTRETANTO ACONTECEU EM VELÔ DE VOCÊ COMPOR SHY MOON EM INGLÊS. QUE OUTRAS SURPRESAS ACONTECERAM EM VELÔ , COMO ESSA DE COMPOR EM INGLÊS?

R - É, uma surpresa igual a essa,eu acho que não tem no disco não, de eu ter feito uma coisa que eu não esperava, como fato de ter feito essa canção em inglês. Porque eu tinha realmente me prometido nunca mais fazer nenhuma canção em inglês. Mas ai eu fiz essa em Salvador não profissionalmente. Não foi uma canção que eu fiz pra uso profissional. Eu fiz pensando que nunca ia nem gravá-la ou cambá-la em show, nem utilizá-la como canção pra valer. Mas, o Vinícius Cantuária, que tem muita intimidade comigo, foi passar uns dias no verão em Salvador, ouviu eu cantando essa música e achou linda. Ficou tão entusiasmado, que eu falei, pois é, eu fiz , mas eu não me interesso em cantar isso, porque eu não quero mais lançar nenhuma canção em inglês. Eu fiz canções em inglês quando eu estava em Londres. Fora Nine Our of Ten eu acho que nenhuma tem uma beleza que justifique. Também tem necessidade de fazer. A língua inglesa tem milhões de canções maravilhosas, não precisa de mim. E eu não preciso da língua inglesa, porque eu tenho a língua portuguesa, que eu trato bem quanto posso. Mas acontece que ele foi ficando tão entusiasmado, falando que a música era tão linda, que acabou me convencendo a cantá-la no show, E o pessoal da banda também adorou, mas eu ainda não tinha certeza de que iria gravar no.disco. Quem me deu certeza de que eu iria gravar no disco foi o Ritchie. Ele foi assistir ao show em São Paulo e ele é inglês. Ele viu o show e adorou, sobretudo essa canção, achou a letra linda e foi ver uma segunda vez e me disse é realmente genial e quis gravar comigo. Eu convidei ele pra gravar no disco e ele gravou a canção comigo. De modo que uma das vezes quem canta é o Ritchie. A canção vai três vezes cantada inteira no disco e a segunda vez quem canta é o Ritchie sozinho. É lindo. Bem eu achei, ele é um músico maravilhoso, um compositor muito bom, maravilhoso, tã no Brasil, é inglês, tá fazendo sucesso cantando na minha lingua e achou que o que eu compus na língua dele está muito bem composta. então eu achei que estava liberado para gravar a canção e gravei.


P – JÁ QUE VOCÊ COMENTOU A PARTICIPAÇÃO ESPECIAL DO RITCHIE, GOSTARIA QUE VOCÊ FALASSE DA OUTRA CONVIDADA ESPECIAL DO DISCO QUE É A ELZA SOARES. COMO HARMONIZAR AS PARTICIPAÇÕES DE UM ROQUEIRO E DE UMA SAMBISTA EM VELÔ?

R - Eu acho que Velô é até um disco muito unitário, com um som bastante uniforme, mas pra minha cabeça não há dificuldade nenhuma em harmonizar as presenças de Elza Soares e Ritchie, porque os dois são maravilhosos, cada um num departamento da minha cabeça. Sendo que Elza Soares é um projeto maior. Eu tenho vontade de fazer um trabalho grande com a Elza Soares e já tenho conversado com ela sobre isso. Eu acho que Elza Soares precisa cantar muito mais e fazer um disco da grande cantora que ela é. Eu tenho falado isso com ela, a gente tem conversado pouco ma pouco e ela fica animada querendo fazer. E eu vou começar a batalhar esse lance, porque eu acho ela o máximo e precisa fazer uma coisa assim de altíssimo nível, de nível internacional, um disco moderno, lindo, que eu acho que ela pede e deve fazer. Então por causa de estar conversando muito com ela sobre isso, eu como gravei essa canção chamada Língua meio falada, meio funk, meio samba, com a presença dessa coisa de samba muito forte e fala em Mangueira e ela é mangueirense e eu acho ela a cantora mais genial de samba do Brasil, eu chamei ela: Elza você canta comigo esse negócio? Ela ficou super contente de cantar, veio, fez e arrasou. Uma das coisas mais geniais do disco são esses pequenos momentos em que a Elza participa. É uma coisa maravilhosa. Isso eu fico orgulhosíssimo de ter feito e de fazer, porque ela é o máximo.


P – LOGO QUE VOCÊ FORMOU A BANDA NOVA, VOCÊ DISSE QUE A BANDA DEVERIA SER NOTICIA E UM NOME. VOCÊ ACERTOU: A BANDA NOVA MERECEU TODA SORTE DE ELOGIOS DA CHAMADA ESPECIALIZADA, AO CONTRARIO DE A OUTRA BANDA DA TERRA, QUE SEMPRE FOI MUITO PIXADA. VOCÊ TAMBÉM COMEÇOU A ACHAR QUE PRECISAVA DE UMA BANDA MAIS À ALTURA DE SEU TRABALHO?

R - Na verdade quem no levou mais foram os meninos de A Outra Banda da Terra. Porque A Outra Banda da Terra encontrou muita resistência, muita reação contra, tanto na área critica, quanto na área propriamente musical. Houve muita desconfiança da competência, porque era uma coisa toda feita na base da soltura e assim uma relação de músicos, não a partir da eficácia como executantes, mas a partir do tipo de relação que a gente tinha entre nós. No principio houve uma reação muito forte contra, inclusive do público. Por o primeiro disco que a gente fez juntos que foi o Muito foi um fracasso total. A crítica arrasou, o público comprou pouquíssimo, vendeu muito pouco, ninguém falou bem. Hoje em dia as pessoas acham que é maravilhoso. Tem Terra, Sampa, todo mundo elogia, mas na hora que saiu foi um arraso, todo mundo anarquizou com o disco.
Entre Outras Palavras e Uns subiu o prestigio de A Outra Banda, os músicos subiram individualmente, cada um deles começando um trabalho individual. O pessoal começou a ver que era um som assim diferente de todos os outros sons, que eram produzidos pelos grupos no Brasil, porque era especial, particular que só podia ser aquela, entendeu? Que tinha um jeito de ser próprio, uma liberdade, transpirava essa coisa de afeto e de individualidade, nada tecno-pop, totalmente espontâneo. Mas acontece que essa banda, o0s membros dessa banda, depois da gente trabalhar muitos anos juntos – uns seis anos - alguns deles já estavam começando um trabalho individual, como o Vinicius Cantuária, que tá com um trabalho super conhecido, com sucesso nas paradas, o Arnaldo Brandão com o Brilho, o Bolão que também teve um sucesso nas paradas, eles estavam querendo trabalhar e sobretudo o Vinicius Cantuária ele queria que eu mudasse o som. Que eu fizesse a experiência de fazer um som tecnicamente mais amarrado. E que pra isso eu combinasse com músicos de outro tipo, que eu escolhesse, inclusive obedecendo as certas indicações do Vinicius Cantuária e do Arnaldo Brandão. Quer dizer, de certa forma a Banda Nova é também um dos aspectos do som de A Outra Banda da Terra. Não é uma coisa que se contrapõe a ela,. O resultado é realmente empolgante, porque a gente no final de contas terminou reunindo duas coisas: uma que é a eficiência técnica, a competência musical e o tipo de padrão do mercado de música, que não era o estilo de A Outra Banda da Terra, com uma particularidade muito própria de originalidade que A Outra Banda da Terra tinha. Então a gente conseguiu uma coisa realmente muito grande. Sob esse ponto de vista eu acho muito vitoriosa essa transação. Agora, tem umas coisas que eu tenho saudade. Na época de A Outra Banda da Terra nunca sentia que era trabalho. E agora as vezes eu tenho que sentir. Eu acho bom também, porque eu fico aprendendo novas dimensões da coisa.


P – VOCÊ COMENTOU ANTES DE ESTREAR O SHOW EM SÃO PAULO QUE VELÔ TERIA O MÁXIMO DE LOUCURA NA CONCEPÇÃO E O MÁXIMO DE RIGOR NA FEITURA. VOCÊ SEGUIU A RISCA ESSA CONCEPÇÃO NA PRODUÇÃO DO DISCO?

R - Com A Outra Banda da Terra a gente vinha pro estúdio assim com o Bolão com cinco namoradas e bebida e conversa, tocava de qualquer jeito, ficava se abraçando, se beijando, cantava, uma história, uma coisa, tudo assim sem muito ... botando as exigências assim meio de lado, ah! eu preferia que fosse assim, mas isso aqui vai assim, o outro deixava pra lá, eu mesmo deixava. Ficava assim tudo gostoso, daquele jeito bem humano, bem pessoal, mas a gente nunca se empenhava em dizer assim: "vamos trabalhar com disciplina pra isso sair limpo, certo". Já a Banda Nova é tudo assim bem disciplina pra sair tudo limpo, certo, exigência. Na mixagem mesmo, o Ricardo, que está produzindo o disco junto comigo, mixando aí vinha o Gordo ouvir e dar opinião, remixar, porque o Gordo achava que tal coisa devia ser um pouquinho mais assim ou não sei que lá um pouquinho mais assado.. Eu acompanhava toda a mixagem - bem isso eu também fazia nos outros discos - mas de todo modo nesse caso aqui tem alegria e trabalho , mas é trabalho também, entendeu? O trabalho é feito com alegria na maioria das vezes mas é com o sentido de trabalho. E no tempo de A Outra Banda da Terra mesmo o trabalho não era feito com sentido de trabalho. Mas eu acho também que a própria temática das canÇões leva a isso porque no tempo de A Outra Banda da Terra - durante aquele período todo - apesar de algumas canções serem de queixa e reflexão, mas de todo modo a postura dominante era a postura do prazer, a postura assim ... sei lá, da entrega ao prazer, ao desejo e não ao principio de realidade ao trabalho e ao dever, não tinha quase nada disso. E agora o espírito critico está muito mais presente nas letras e um certo tom mais assim de ... mais parecido com o tom dos homem adulto, maduro. Enquanto que o tom anterior era muito mais adolescente e mais, enfim juvenil, também mais feminino, sob esse ponto de vista, mais assim, sei lá, doce.


P – A GENTE VIVE UMA ÉPOCA DE INDEFINIÇÕES. VELÔ, NO ENTANTO, COMPARADO COM OS SEUS TRABALHOS MAIS RECENTE, É O MAIS DEFINIDO. VOCÊ NÃO DEIXA DUVIDAS SOBRE O QUE VOCÊ QUER E PENSA. O QUE VOCÊ PRETENDEU AO LANÇAR VELÔ NESSE MOMENTO DA VIDA BRASILEIRA?

R - Eu acho necessário, quando a gente tem muita indeterminação social, a gente se tornar de ser o mais claro possível pra ajudar as coisas caminharem. Porque num momento de indeterminação, que pode ser muito frutífero para o Brasil, então a gente tem necessidade natural de ser mais explicito, mais claro, mais nítido nas posições. Enfim, de ser mais responsável. O fato da gente ser responsável numa certa medida nos leva a tomar um tom de quem é responsável no momento em que a coisa,tá muito indeterminada. Enquanto que, em momentos em que há demasiada determinação indesejável você trazer mais indeterminação pra cabeça é melhor, porque de certa forma você equilibra. Mas isso não é feito assim planejadamente. Cheguei a ter intenção de fazer como estou fazendo, mas uma vez que já tinha visto que estava nesse caminho. Se tornou uma intenção, mas eu não dei assim "vou fazer coisas bem nítidas, porque o ambiente não está muito nítido. Na verdade quando eu pensei em fazer coisas bem nítidas o ambiente não estava tão confuso ainda, mas eu já estava na intuição. É uma coisa de você sentir assim ... você se inclina mais por um estilo e termina você vendo que aquilo tem uma atualidade, até uma utilidade pública. Então eu terminei tendo a intenção de fazer uma coisa mais definida mesmo, tanto formalmente quanto conteudisticamente, o trabalho do Velô, o show e o disco é mais definido.


P – VOCÊ FALOU EM INTUIÇÃO. ESTOU ME LEMBRANDO DE UM COMENTÁRIO DO TARSO DE CASTRO NA FOLHA ILUSTRADA DEPOIS DA ESTRÉIA DE VELÔ. ELE DIZIA: “JÁ ESTA FICANDO MONÓTONA ESSA HISTORIA DE CAETANO ESTAR SEMPRE MUITO À FRENTE DOS OUTROS”. VOCÊ CONCORDA?

R - Não, às vezes eu sinto que algumas coisas eu saquei antes e dei o toque, mas nem sempre. Muitas pessoas sacam muitas coisas muito antes de mim e me impressionam muito. Eu poderia citar vários nomes, mas de todo modo eu acho que tenho uma capacidade de harmonizar muitas coisas diferentes e de talvez começar a digerir algumas coisas um pouco antes de determinados grupos que vão me ouvir. É somente isso. É verda de, não há nada que eu veja em mim no que eu faço de tão arrojadamente precursor como, por exemplo, o que o Jorge Mautner fez nos anos 60, tanto em canções quanto em literatura, em atitudes, em coisas que ele disse, nem por outro lado, como a vanguarda formal da poesia concreta ou a literatura de José Agripino de Paula ou o teatro que ele fez, em 68 em São Paulo, e Maria Ester Stockler. Sobretudo eu não poderia deixar de reconhecer que o Gil, na maioria das vezes, viu as coisas antes de mim. Inclusive me disse as coisas antes em muitos dos casos e eu tive a capacidade de mediar, de meio traduzir pra moçada. Eu não posso ter a pretensão de que eu estou sempre na frente. Nem sempre é uma vantagem. Nesses casos que eu falei, eu achei que foi vantagem. São pessoas que viram antes coisas que eram preciso e bom que fossem vistas antes. As profecias todas são mentirosas, quer dizer, elas são invenções. Você inventa uma coisa e faz com que ela aconteça. As profecias tem que se auto cumprir. Esse é o único modo delas se cumprirem. Esses são os profetas, quer dizer, eu sou, nem sou un falso profeta, nem sou um profeta. Mas acho que muitas vezes eu tenho sido arauto de algumas coisas que vieram a interessar a um grupo, que me ouviu falar em determinado momento, então às vezes dá essa impressão, mas não tenho a pretensão.


P – OLHANDO VELÔ MAIS A FRENTE, JÁ COM A DIMENSÃO HISTÓRICA QUE ELE ADQUIRIU, VOCÊ O COLOCARIA AO LADO DOS MOMENTOS MAIS MARCANTES DA SUA CARREIRA, COMO FOI A AFSE TROPICALISTA, POR EXEMPLO?

R - Eu acho que Velô é um momento assim marcante de mais alta definição, como foi também aquele período do tropicalismo. Mas tem períodos de baixa definição, quando as coisas não são muito marcantes, não são marcas de kilômetros na estrada. Mas tem períodos da estrada que são mais belos e mais agradáveis, a marca de quilômetro na estrada não é a coisa mais importante da estrada nunca. É importante, pode ser também importante por outras coisas que se ... enfim se você precisa saber em qual quilômetro está uma coisa importantíssima, então a marca de quilômetro é muito importante. De todo modo é importante pra você saber aonde está. Agora a estrada é continua ... Eu acho que Velô é um marco. Mas os marcos são marcos ... os marcos são marcelos ...


P – VOCÊ DIZ QUE FAZ MÚSICA POPULAR COMERCIAL PRA TOCAR NO RÁDIO. ACHO DIFÍCIL A GENTE ENGOLIR ESSA SUA PRETENSA IGUALDADE COMPARANDO COM AS MÚSICAS DO TIPO “PADRÃO FM” QUE ESTOURAM POR AÍ.

R - Quando eu falo que o que eu faço é música popular comercial, eu estou apenas lembrando a cada instante as pessoas, que o que eu faço é realmente isso. Tem pessoas que as vezes escrevem contra mim, reclamando não sei o que como se eu tivesse a pretensão de que a coisa que eu faço fosse uma coisa mais nobre do que isso. Não, não é. Pode ser até muito mais importante, por alguma razão que eu desconheço do que coisas que são consideradas nobres. Mas eu não sei. IT'S NOT FOR ME TO SAY... não sou eu que devo dizer isso, porque não sei, realmente não sei, não posso saber, não posso julgar porque eu estou de dentro da coisa. O fato é que quando eu digo assim "o que eu faço é música popular comercial" é pra determinar, quer dizer, o que eu faço é isso, música comercial urbana, pra tocar no rádio, vender o disco, isso é o que eu faço, ê a minha profissão, esse tipo de produtor que eu realizo. Eu entrei nessa profissão da maneira convencional, normal, contratado por uma gravadora, gravo os disco, é isso mesmo. São gravadoras que já existiam no Brasil desde quando eu era pequeno, eu já gostava de músicas que já tocavam no rádio, que eram gravadas nos discos. Eu sou desse mundo da música industrial para a diversão das massas e é nessa área que eu me expresso. E é dentro desse mundo que eu ajo. Pode ser até que eu queira mudar, dizer "agora eu quero escrever uma peça de teatro", como o Chico Buarque fez. Então vai trabalhar com um material mais nobre como é o texto teatral, que é nobre tradicional, não é indústria de disco pra diversão das massas. Enfim... você vai competir não com Ray Charles, mas com Shakespeare, não com Charles Aznavour, mas com Racine, quando você escreve uma peça de teatro. E eu estou mesmo é competindo com Charles Aznavour com Ray Charles. Agora, eu acho o Ray Charles um gênio, não acho o Charles Aznavnur um gênio. Mas isso é o meu mundo. Eu acho o Bob Dylan o máximo, os Beatles uma coisa fenomenal, acho os Rolling Stones uma coisa magnifica, sobretudo eles no palco. Aquilo no final dos anos 60, inicio dos 70 e agora em 81 quando eles voltaram realmente genialmente, eu acho o que há de melhor no teatro mundial da segunda metade do século XX, não vi nada que se pudesse comparar aquilo, acho a melhor coisa sobre o palco é show dos Rolling Stones, porque eu gosto desse ambiente. Mas eu sei que é ambiente de música comercial popular, de entretenimento para as massas. Assim como o cinema que é uma arte vulgar, industrial, de divertimento para as massas. Agora eu acho Fellini um gênio, acho Chaplin um gênio, acho Eisenstein um gênio, acho ... a gente chama gênio a quem a gente quer, acho Bergman às vezes genial, às vezes chato, mas o fato é que eu trabalho nessa faixa mesmo. Pra mim ela tem uma importância enorme, eu acho que tem essa relação com a sociedade, isso pra mim é bonito, porque tem um lado meio pedagógico e meio educacional e ao mesmo tempo meio deflagrador de coisas e também conflitante, criador de conflitos, gerador de contradições, na área social mesmo e isso me interessa. Como eu não gosto de política nem de sociologia, mas eu gosto da sensação das relações com a sociedade. Eu jamais me identifico com o artista que é especialista naquela arte que o atraiu. Alguns são geniais nisso. De certa forma toda a poesia concreta de São Paulo é uma radiçalização desse tipo de atitude. Quer dizer, o sujeito é especialista em poesia, então ele trabalha longe das relações imediatas do problema da sociedade. Agora, o sujeito que grava um long play, pra tocar em todas as rádios do Brasil e ainda grava uma chamadinha pra fazer propanda do long play, dá entrevista a 500 jornais por ano, fala, faz disco, canta no Globo de Ouro, no Chacrinha, no Bar Academia da TV Manchete, nos programas mais cafonas, no Silvio Santos, em todo lugar, todo mundo vê esse sujeito, ouve as canções que ele canta, são outros estímulos, são outras coisas que mexem com esse sujeito, entendeu? Eu me identifico com o papel que eu mesmo cumpro, porque o que aconteceu comigo é que eu sempre me senti inclinado para esse negócio. Eu tenho amigos, por exemplo, o Julinho Bressane, ele é cineasta, ele adora cinema e faz aquilo como um especialista do cinema, pra pessoas que entendam de cinema. Se for uma coisa realmente bem sacada pode mexer, no caso da poesia, do cinema e da música - de certa forma o Arrigo Barnabé trabalha assim - pode mexer com a música em todas as épocas, pode ser uma referência importante para séculos, mas exatamente porque vai no cerne da questão cinematográfica, ou musical ou poética. E eu não faço a coisa na área da passagem mesmo, do consumo, do rádio, da FM, do disco, do sucesso. Eu sei disso e não nego. É diferente do artista especializado, separado. Enquanto artista põe o mundo entre parênteses para fazer uma coisa que vai ter talvez uma relação mais profunda com esse mesmo mundo. Talvez. Esse talvez é que angustia msuita gente. Mas é verdade, é um talvez mesmo. É um talvez mesmo de fato.


P – VOCÊ PODERIA FALAR SOBRE AS CIRCUNSTÂNCIAS E O AMBIENTE MENTAL EM QUE FORAM COMPOSTAS AS CANÇÕES DE VELÔ. ALGO ESPECIAL?

R - O que tinha de especial realmente era essa mudança de situação profissional em parte por determinação minha em parte pelo acaso de A Outra Banda ter que se desfazer, e eu estar querendo ... eu faria uma coisa mais organizada e estruturada, mais nítida e também diferente de algum modo, ainda que A Outra Banda continuasse comigo. Mas o fato de A Outra Banda ter saído radicalizou ainda mais essa transformação. Então, a coisa que mais mudou mesmo, o ambiente em que eu compus as canções, o ambiente mental em que eu compus essas canções novas foi o fato de ter mudado objetivamente a minha situação profissional. Eu queria fazer uma coisa diferente e aí mudou tudo. Muda a Banda, também a Marcinha que trabalhava comigo há anos saiu nesse mesmo periodo, então o ambiente profissional mudou. Eu fiquei de certa forma numa situação mais desconfortável, mais difícil no início. E de uma certa forma eu também queria falar de difículdades, já desde antes, eram canções que eu queria mais críticas e mais séria, sob um certo ponto de vista. Agora, eu não me lembro direito. Eu fiz umas canções antes do verão na Bahiá e outras depois que eu voltei do verão. Mas todas foram feitas não durante as férias de verão realmente. Nas férias de verão na Bahia, aliás eu fiz uma coisa diferente do que faço nos outros anos, eu bebi muito, dormi tarde, não fiz música nenhuma, não fiz nada, deixei tudo pra fazer quamdo eu voltasse. A canção Sorvete eu fiz a música e metade da letra antes do verão, quando eu fui pras férias na Bahia, todo dia eu dizia pelo menos vou terminar essa música, nem isso eu fiz, não fazia nada. Quando eu voltei, eu pensei: como é que eu quero fazer um trabalho todo novo se eu nem fiz o repertório que eu imaginei mais ou menos. Aí peguei e fiz novas canções. A letra do Sorvete - que ficou batizada de Sorvete porque não tinha nome - eu náo tinha terminado a letra e não tinha a palavra sorvete no meio nem nada, eu dizia "aquela sem nome" e os meninos botaram o naome Sorvete, porque tem a história de um sorvete sem nome. E a gente começou a chamar ela de Sorvete. Foi a última que eu completei a letra, botei a palavra sorvete arranjando um jeito. De modo que essa música Sorvete começou a ser composta no início e terminou no final de tudo. E é uma canção tola aparentemente, não é tola, é bonita a bessa, mas é assim uma canção boba. Já O Quereres eu fiz assim de uma rajada e é a que eu mais gosto de todas. A canção que eu mais gosto é O Quereres. Eu fico emocionado ainda hoje, já fiz uma porção de vezes, toda vez que eu canto fico emocionado. Pra gravar, eu fiquei emocionado, eu gravei de uma. vez. Cheguei no estúdio pra botar voz no Quereres - eles tinham levantado o play back pra eu botar a voz em cima - entrei e perguntei "O Quereres está aí?" tá, então solta. Ele experimentou a minha voz, soltou e cantei. Quer dizer, eu entrei no estúdio e em três minutos estava gravada a canção. Eu cantei do princípio ao fim e é a gravação que está no disco. Direto, porque eu adoro ela. Eu acho essa música linda.


P – VOCÊ ACHA QUE ESSE PERÍODO DE DIFICULDADES QUE VOCÊ PASSOU REFLETIU NO ESTILO DAS CANÇÕES?

R - Então tinha uma porção de coisas assim de dificuldades minhas no período que eu posso também ligar ao estilo das canções e ao impulso que me fez ser capaz de fazê-ias, como as fiz. Mas, eu não sei dizer. Eu queria fazer canções mais ou menos assim. O que eu tomei como base foi o clima de duas canções do Uns que eu adoro: Eclipse Oculto e Peter Gast. Essas duas canções são as canções mais modernas do Uns, juntamente com Uns, que é uma canção que eu adoro também, sobretudo Eclipse Oculto e Peter Gast, nessa ordem , porque Eclipse Oculto é a canção que eu mais gosto do Uns e é uma das minhas canções que eu mais gosto de sempre. Eu disse assim, se eu fizer as coisas como saiu Eclipse Oculto, eu vou fazer um repertório como eu quero. Tanto que são as duas canções que entraram no show. Mas elas que me impulsionaram para o estilo das canções que estão no show e no disco. A única coisa que ficou em dúvida no início, eu pessoalmente não sabia se ia botar Shy Moon, mas logo que o Richtie disse que gostava da letra e que gravaria comigo, eu fiquei a fim de gravar. E depois Comeu eu não queria incluir, porque achei que iria dar e era uma canção que me interessava menos. Mas depois ficou bonita a gravação e na vedade eu gosto da canção, mas não sei. Se tivesse que tirar uma eu tiraria essa. E Nine Out of Ten que é a única canção antiga que entrou no disco. Mas o resto do critério foi simples, as canções novas serão gravadas. O disco é feito das canções novas mais Nine Out of Ten.


P – PULSAR TAMBÉM É NOVA?

R - Eu fiz uma vez para um livro, uma caixa de poemas do Augusto de Campos. Pra área de música popular comercial ela é inédita e nova. Ela tinha uma versão fechada, de tiragem pequena na área da poesia erudita.


P – SE NÃO ME ENGANO FOI O OKKY DE SOUZA QUE FEZ UM COMENTÁRIO NA REVISTA VEJA DIZENDO QUE QUEM QUISESSE OS ARTISTAS CONSAGRADOS DEVERIA EVITAR AS LOJAS DE DISCOS E SE DIRIGIR AS SALAS DE ESPETÁCULOS, PORQUE OS ARTISTAS, PRESSIONADO PELA OBRIGATORIEDADE DE GRAVAR UM LP ANUAL, ACABAM DANDO PALIDÁS AMOSTRAS DO QUE SÃO CAPAZES NOS DISCOS. VOCÊ CONCORDA?

R - Em primeiro lugar eu não gosto desse negôcio de reclamar de obrigatoriedade de gravar um disco por ano, porque eu queria gravar cinco por ano. Eu acho que eu tenho uma restrição de só gravar um disco por ano. É claro que eu não ia querer ficar o ano inteiro no estúdio, nem encher o rádio e a cabeça das pessoas com a minha voz. Mas eu gosto de gravar e gosto de fazer canções, de ouvi-las gravadas de fazer discos. Mas acho que fazer um disco por ano seja muito. Também nunca tive o problema da obrigatoriedade, você pode transar no contrato, quer dizer, você tendo uma carreira mais ou menos estabelecida, tendo um mínimo de diálogo com as gravadoras, você arma o seu contrato da maneira que você quiser. Há uma possibilidade de você fazer um contrato sô de um ano, faz um disco só, depois você faz outro quando quiser, pode fazer um contrato mais ou menos em aberto quanto a essas questões. Há mil possibilidades. De todo modo não acho que isso seja tão restritivo nem que tenha causado, de todo modo não causou nenhuma baixa da qualidade das canções em disco nem das gravações. Na realidade, todo mundo quer gravar no minimo um disco por ano. Eu falo que eu quero gravar cinco, porque eu acho que todo mundo quer gravar dezessete por ano e finge que acha um horror ter que gravar um. Nao tem nada de horror. Não é ruim, imagina. Você ter que ir pro banco todo dia? E contar dinheiro dos outros e ter que ir todo dia. Agora, reclamar que tem que gravar um disco por ano, uma coisa que você quer na verdade, que está louco pra fazer, eu acho isso uma reclamação boba.


P – VOCÊ SE REFERIU A QUEM TEM UMA CARREIRA MAIS ESTABELECIDA E POR CONSEQUENCIA TEM MAIOR POSSIBILIDADE DE DIALOGAR COM AS GRAVADORAS. MAS QUEM NÃO CHEGOU AINDA NESSE LUGAR?

R - Quem não tem uma relação de trabalho definida com as gravadoras, que não pode tá ditando moda "sô quero gravar meio por ano", não tem contrato com as gravadoras e não está ainda em relação de trabalho estabelecida. Então está querendo um contrato, tá querendo gravar. Então não vai se incomodar de gravar um disco por ano. Quem tem fama, tem diálogo com as gravadoras pode fazer as barganhas que bem quiser. Eu acho que essa questão de um disco por ano é a última das questões pra você botar como um problema. Eu vejo nas críticas "eles são obrigados a gravar um disco por ano e por isso ficam coitadinhos ..." não tenho pena nenhuma. De mim? Por isso? Não, não tenho. Eu acho isso uma demagogia da crítica. Completa.


P – ESSE ANO, COM VELÔ, VOCÊ CONSEGUIU TER A CRÍÍÍTICA DO SEU LADO. É MAIS CONFORTÁVEL?

R - É. É claro que é. Eu acho muito mais confortável, do que ter gente falando mal da gente e tal. Quer dizer, eu sempre tenho alguém falando mal de mim, quando não é a crítica, vem outras pessoas, artistas, criadores, intelectuais ou jornalistas famosos. Sempre tem alguém chiando contra mim. E agora também no Velô teve. Décio Pignatari fez uma verdadeira campanha.


P – NÃO LEMBRO QUEM DISSE QUE VOCÊ, COM VELÔ, APLICOU UM DESMOLARIZANTE XEQUE MATE NA SONOLENTA CONFEITARIA MUSICAL DA M.P.B. VOCÊ TAMBÉM ACHA ISSO?

R - Eu diferentemente de toda a crítica e de grande parte dos meu colegas, eu sou otimista com relação ao que é música popular no Brasil e ao que pode ser, o que não quer dizer que será, mas pode ser. Ao que é, eu já sou otimista e ao que pode ser eu sou mais otimista ainda. Então, essas coisas de achar que é tudo uma porcaria, eu não acho. Eu não sinto isso. Eu acho que a música popular no Brasil ... se tem uma coisa no Brasil que é boa é a música popular. Talvez seja a coisa no Brasil que melhor anda, a música popular, a Varig e a TV Globo.


P – TEM UMA FRASE SOLTA NO PROGRAMA DO SHOW VELÔ: "PRE 64, PÓS 84". O QUE VOCÊ QUER DIZER COM ISSO?

R - Isso eu gosto que fique sem explicação, porque dá o mistério: ''Pre 64, pós 84'' tem tanta carga de coisas nisso aí. Tem várias coisas: pre 64 dâ logo uma idéia de antes da revolução militar, do golpe político que mudou a organização política do pais, em 64. Então pre 64 é uma coisa de antes disso. E pós 84 é como se, de certa forma, nós tivéssemos que saber viver depois disso. E fazer com que seja realmente depois disso. Tem um lado político evidente pra mim. Por outro lado tem também uma coisa de frescor pra mim, como se esses anos todos ... em fazendo o VELÔ eu me senti de novo assim como eu estava antes tudo, esses anos todos como se estivesse carregado das cargas, das perguntas e respostas que eu fiz a mim mesmo e aos outros e dei e respondi, enfim ... de toda a complexidade desses anos. Então é um ladó pessoal também. Depois de 84 ser um impulso novo, 1984 é um ano que é mitológico por causa do livro do George Orwell. O que é mais? Eu pensei em várias coisas, mas não estou me lembrando de todas. Mas eu acho que as outras pessoas se lembram de muitas coisas em falando isso: "pre 64, pós 84", não é assim que está lá? É bacana. Também essa volta do rock como uma coisa forte, fresca é muito bacana. Isso também é uma coisa de 84 em diante. A gente tem que agora aprender a tramar sentindo que é pós tudo isso.


P – NESSE SENTIDO VELÔ, MAIS DO QUE UM DISCO E UM SHOW, É UMA LUZ.

R - Com fé em Deus.

[Disco-Entrevista, Philips 2809-165, novembro 1984]












 
 
 






 
 
 









 


 



 
 
 
 
 



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1984
Revista "Amiga" - n° 760
12 de diciembre de 1984





 
 
 
 






 
 
 
 


 





 
 






























Bibliografía

NAVES, Santuza Cambraia. Velô de Caetano Veloso. Rio de Janeiro: Língua geral, 2009. 1ª edición. 99 páginas.



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