O GLOBO
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Hiran e Majur, revelações da Bahia, cantam no Rio
Apadrinhados por Caetano Veloso, rapper e cantora mostram seus trabalhos
'Tem mana no rap' e 'Colorir'
Leonardo Lichote
19/03/2019
Hiran e Majur fazem show nesta terça na Audio Rebel Foto: Raphael Vilela / Divulgação |
RIO — Em sua última temporada na Bahia, Caetano
Veloso se encantou com o rapper Hiran e a cantora (ou cantor, já que se
identifica como não binário, ou seja, não se fecha num gênero específico)
Majur. Em seu perfil no Instagram, o compositor postou uma foto entre os dois,
com a benção na legenda: "eu recomendo". Nesta terça-feira, Hiran e
Majur (agora empresariados por Paula Lavigne, mulher e empresária de Caetano)
levam seus shows à Audio Rebel — ele apresenta seu álbum de estreia, "Tem
mana no rap", e ela seu primeiro EP, "Colorir".
— Entre tantas coisas instigantes que vimos durante
o verão na Bahia, o show de Hiran e Majur se impôs como algo que devia ser
visto logo por gente do Brasil todo — diz Caetano. — Hiran é jovem rapper gay
preto que conheci no trio do Baiana System no ano passado. Gostei logo. Majur
apareceu neste verão. Um preto de 1,93m, incrivelmente elegante e agindo como
modelo/estrela ou R&B-diva. Quando cantou, a voz causou estupefação.
“Hiran cresce no palco: a clareza da emissão, a economia entre palavras
e programações. Seu refrão já é palavra-de-ordem na Bahia: 'Burrice pega mas
não vai pegar em mim'. Majur, bem, Majur é voz. E certeza de si. É beleza
baiana demais para eu não me abalar.”
CAETANO VELOSO
Cantor
Gay no ambiente machista do rap
Aos 23 anos, natural de Alagoinhas (interior da
Bahia), Hiran é desde criança um amante do rap ("Minha mãe via comigo
muita MTV, e o primeiro clipe que vi foi de Jay-Z", conta). O rapper não
via no hip hop, porém, um caminho possível para ele e para as questões das
quais queria tratar.
— Sou gay e sempre soube disso. Não conseguia me
ver dentro do rap falando sobre meus problemas. E o rap é um ambiente tradicionalmente
machista, com termos pejorativos pras minas, pras gays. Não tinha ninguém na
minha cidade fazendo isso, nem no meu estado, nem no meu país. Só vi que podia
depois de ver e ouvir (o rapper gay) Rico Dalasam, que foi fundamental pra todo
mundo que veio depois.
Com 16 anos, Hiran começou a cantar em bares — em
casa, escrevia rimas, mas as mantinha guardadas. Até que, numa pequena turnê
que faria como backing vocal de uma banda por Rio, São Paulo e Espírito Santo,
identificou uma oportunidade. Pegou um beat gratuito na internet, escreveu uma
letra, gravou um clipe ("usando roupa da produtora da viagem") e
lançou o single "Choque de bass", que chegou aos ouvidos de Tiago
Simões, que depois produziu seu disco de estreia, lançado em março de 2018. Desde
então, já se apresentou com artistas como BaianaSystem e Larissa Luz
— Gosto de ter meu pé no rap, mas também de levar
pra outros lugares. Meu disco tem funk com flautinha e pagodão com guitarrinha
baiana. Tô aberto a experimentar musicalidades dentro do hip hop.
Cantando desde os cinco anos
Majur começou ainda mais cedo. Bem mais cedo: aos 5
anos, cantava no coro da Orquestra Sinfônica da Juventude de Salvador, e com
ele se apresentou na Janelinha do Natal — tradição no Pelourinho. Chegou a
estudar violino e a participar (e avançar até a etapa nacional) do festival
FACE (Festival Anual da Canção Estudantil), além de cantar no coral de alunos
do colégio da Polícia Militar. Mas, como Hiran, não via a música como uma
possibilidade e foi estudar Design:
— No terceiro período, fui morar na Barra, bairro
superboêmio de Salvador. Montei uma banda e cantei em todos os barzinhos de lá
— lembra Majur, que diz que a faculdade a ajudou muito em seu trabalho de
composição. — Estudei muita Semiótica, as maneiras de falar das coisas. Uso
isso em minhas letras.
A
grande virada de sua carreira veio quando teve a oportunidade de conhecer
Liniker — Majur já cantava suas músicas na noite. A cantora paulista esteve em
Salvador e precisava de um violão para gravar um programa de TV, ela emprestou
e puderam conversar ("Peguei três ônibus, dois Uber e um metrô pra levar
esse violão pra ela, cheguei em cima da hora", conta). De noite, no show
de Liniker, Maju foi convidada de surpresa ao palco para esquentar a plateia e,
mais surpresa ainda, para um dueto com a ídola, em "Tua".
Majur
aproveitou a curiosidade gerada sobre seu nome e lançou, na sequência, um clipe
e seu EP — com participação de Hiran em "Náufrago", o disco une
ritmos afro, soul e eletrônica. Em pouco tempo, se aproximou de Maria Gadú,
Caetano e foi convidada para os trios de Daniela Mercury e Marcio Victor
(Psirico).
—
Canto o amor entre pessoas, tento fugir ao máximo da relação de gêneros nas
minhas músicas. Minha representatividade já tá clara no visual. Não quero
restringir nas letras, minha intenção é atingir diversos públicos de diversas
idades.
Apadrinhada
por Caetano Veloso: conheça Majur, a nova voz da música brasileira
Baiana, negra e de
gênero não binário, artista fala de representatividade, comenta o rápido
crescimento de sua carreira e se emociona ao falar do apoio da mãe: 'Devo tudo
a ela'
Por Juliana Hippertt, Gshow — Rio de
Janeiro
21/08/2019
Majur,
nova voz da música brasileira, tem rápida ascensão em sua carreira
Foto Lucas Nogueira
A
voz, o talento e a presença de uma cantora baiana têm chamado atenção no
cenário musical brasileiro. Majur é
o nome dela. A artista de 1,95 m de altura, negra e identificada de gênero não
binário - não se importa de se referirem a ela como menino ou menina - conheceu
a música em um projeto social aos cinco anos e ali percebeu o que queria fazer
para o resto da vida. Em suas composições, ela abraça a responsabilidade de
representar e empoderar parcelas da sociedade que sofrem preconceito
diariamente. Em pouco tempo, Majur viu sua carreira dar uma reviravolta e
despontar após o destino a levar para as pessoas certas.
"Venho de uma cidade que mais mata LGBT no país e
consegui alcançar o lugar onde estou por um desbravamento desde os meus cinco
anos, quando comecei a estudar música. Fui uma resistente, nunca desisti e
conseguir chegar até aqui é uma vitória muito grande. Mais do que isso, é ser
reconhecido pelo o que você faz de melhor e com amor. Não há felicidade
maior."
Majur é baiana, tem 1,95m de altura, é negra e de gênero não binário — Foto: Lucas Nogueira/Divulgação |
Tudo começou com uma participação improvisada
no show do seu ídolo Liniker, em agosto de 2018, que alavancou sua carreira às
vésperas de lançar o seu primeiro EP "Colorir". Maria Gadú e a esposa Lua Leça curtiram
a cantora, trocaram mensagens e a levaram na casa de Caetano Veloso.
Pronto, Majur foi apadrinhada pelo baiano. A partir daí, a artista não parou
mais. Um de seus trabalhos mais conhecidos foi a participação no single
Amarelo, de Emicida,
ao lado de Pabllo Vittar.
"Até hoje não consegui descrever o quão
rápido foi. Não vi as coisas acontecerem, só fui exposta a Caetano por Gadú e
Lua. A gente se encontrou de coração e alma.
Quando vi, já estava vindo para o Rio de
Janeiro e começando a minha carreira a convite da Paula Lavigne,
esposa dele [que virou sua empresária]. Ainda estou sentindo na pele. Nunca vou
conseguir me acostumar, sempre vai ter aquele friozinho na barriga",
revelou.
Majur ao lado do rapper Hiran e da cantora Maria Gadú Foto: Reprodução/Instagram |
Majur, Maria Bethânia e Teresa Cristina na casa de Caetano Veloso Foto: Reprodução/Instagram |
E
foi através de Caetano que Majur colocou os pés pela primeira vez nos Estúdios Globo. A artista cantou no Altas Horas ao vivo, que rolou no último sábado, dia 17/8, no Rio
de Janeiro. Nos bastidores, ela conversou com
o Gshow sobre sua carreira
e brincou que tentava manter a pose e disfarçar a alegria por estar pela
primeira vez em um programa de TV.
Majur ao lado de Hiran e Caetano Veloso no 'Altas Horas' Foto: Reprodução/Instagram |
Depois
de sua rápida ascensão, Majur deixou Salvador, sua cidade natal, e veio morar
no Rio de Janeiro. Lá na Bahia deixou a mãe, sua fã número um e principal
apoiadora. Com lágrimas de saudade - Majur está na cidade maravilhosa há quatro
meses -, a cantora contou que, hoje, paga o aluguel da matriarca.
"Minha
mãe me ensinou a escrever com cinco anos, catou materiais recicláveis comigo e
com a minha irmã pra gente sobreviver, vendeu picolé na praia, vendeu brinco e
me ensinou a ler de verdade, por isso tenho essa abertura literária para
escrever música. Devo tudo a ela", disse Majur, que prometeu trazer a mãe
para o Rio até o final do ano.
"Hoje pago o aluguel da minha mãe e ela está
feliz, manda mensagem dizendo: 'recebo mesada do meu filho'. A gente nunca imaginou
que poderia chegar nesse lugar. Sonhar é uma possibilidade que a gente tem que
agarrar com força."
Majur e sua mãe, dona Luziane — Foto: Reprodução/Instagram |
Representatividade
Majur usa a música para expressar a diversidade que
está dentro dela. A artista acabou se tornando uma porta-voz de uma parte da
população que quer ser ouvida.
"Já tenho um corpo político por ser negro e
LGBT. Isso já me coloca em caixas da sociedade. Comecei a receber mensagens de
pessoas dizendo o quanto estavam felizes de me ver chegando nesse lugar, porque
eu chegar significa que eles também podem chegar. Representar essas pessoas é
ser um privilegiado. Agora, tenho uma responsabilidade muito grande de me
colocar no lugar de outras pessoas e entender o que está acontecendo para
tentar ajudar da melhor forma, já que estou num lugar de visibilidade",
declarou.
Antes de viver da música
Antes de conseguir viver da sua arte, Majur
estudava Design na faculdade e chegou a trabalhar com telemarketing. No quarto
período do curso, a cantora decidiu levar a carreira musical como sua principal
atividade.
"Quando se é pobre, a única escolha que você
tem é trabalhar para se sustentar. Eu tinha a música como primeira opção,
porém, a minha condição me fazia acreditar que tinha que trabalhar primeiro
para depois pensar no que amava, que era a música. Escolhi Design que é minha
habilidade mais próxima depois da música. Estudei, fiz estágios e meu primeiro
emprego foi de telemarketing."
Primeiro Álbum
O trabalho só está começando. Após lançar o
primeiro EP, há seis meses, Majur promete o primeiro álbum para 2020. Na última
quarta-feira, 14/8, ela lançou uma nova canção, "20ver": "Ano
que vem estarei lançando um álbum, mas não posso falar muita coisa. Vai ser uma
surpresinha. Sempre vou falar de uma forma plural, abrangendo todos os tipos de
pessoas."
Majur pretende lançar o primeiro álbum em 2020 — Foto: Reprodução/Instagram |
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