viernes, 15 de septiembre de 2017

2013 - BANDA CASCADURA

O GLOBO

10/02/2013

Caetano Veloso
O COLUNISTA ESCREVE AOS DOMINGOS

Salomão e Cascadura

Um dos melhores discos de rock brasileiro de sempre é o novo do Cascadura
Faz duas semanas, comentando aqui o “Gonzaga” de Breno Silveira, escrevi que o show “Luiz Gonzaga volta pra curtir” talvez tivesse sido dirigido por Waly Salomão. Não foi. O diretor foi Jorge Salomão. Waly, segundo o próprio Jorge, só criou o título, que ele logo aprovou. O show foi coisa que ficou marcada na minha cabeça como a oficialização do reconhecimento de Gonzaga por parte da juventude de então. Disse que senti falta de uma referência a isso no filme, como senti falta de Ivan Lins e do Som Livre Exportação. Ao afirmar que a ausência de referências ao tropicalismo não me incomodava, eu não estava renegando. Mal pensei no papel do tropicalismo nesse episódio. Lembro-me de ouvir jovens contraculturais dizerem que os Beatles iam gravar “Asa branca”. Essa lenda revela muito do clima mental da época. O ressurgimento de sons rurais que veio com o rock (e que Ruy Castro deplora em seu livro sobre a bossa nova, por considerar parte do assassinato da grande canção urbana dos anos 1930 e 40) levava a moçada a fantasiar que o campo brasileiro entraria no repertório do topo do pop-rock anglo-saxão.
Faz pouco tempo David Byrne finalmente gravou esse clássico nosso, realizando, com décadas de atraso, o sonho dos malucos de 1968. David pertence ao topo do pop-rock anglo-saxão e, atendendo a convite de Mauro Refosco (que, aliás, está participando de um projeto extra-Radiohead de Thom Yorke, chamado Atoms for Peace), gravou “Asa branca”. Em inglês, como os desbundados dos sixties imaginavam que os Beatles fariam. O delírio dos malucos se realizou. Esse delírio tinha ligações com o tropicalismo.
Gil sempre foi apaixonado por Luiz Gonzaga, não tendo feito sequer uma suspensão desse amor durante a fase heroica da bossa nova, coisa por que eu, um amante de Gonzaga aos 8 anos, tinha passado quando cheguei aos 17. Não que eu desconsiderasse a força de Gonzaga, mas eu a situava num terreno infantil, esquemático e ingênuo. Assim eu o via — sem pensar muito nele — no período bossa nova da minha vida. O tropicalismo trouxe o velho Lua de volta ao meu coração. Sua invenção pop do combo sanfona-zabumba-triângulo tinha tudo a ver com o “Se manda” de Jorge Ben e, portanto, com o que a gente planejava alcançar em nossas criações.
Não estou seguro de que o sonho acalentado pela rapaziada do final dos anos 1960 de que os Beatles teriam gravado “Asa branca” não tenha sido uma das motivações da minha decisão de gravar essa música quando fiz meu primeiro disco londrino. Cantei-a em português exageradamente pernambucano e só com meu violão de náilon, contrastando fortemente com a fantasia dos desbundados. Claro que a razão primeira era a situação de exilado em que me encontrava: a letra com esperança de volta dizia tudo o que eu queria dizer.
A definição da atitude tropicalista teve muitos elementos pernambucanos. Não apenas o amor de Gil por Gonzaga e sua repetidas vezes referida passagem pelo Recife logo antes da virada pop na produção de canções no Brasil. Havia também (e isso sobretudo para mim) a arrebatadora invenção do trio elétrico — e esta não se entende sem a passagem do bloco Vassourinhas por Salvador em 1949: o frevo-hino dessa agremiação recifense virou hino eterno do carnaval baiano. O carnaval eletrificado da Bahia era uma força avassaladora só conhecida dos habitantes de Salvador. Enconrajou-nos a eletrificar nossa música e nos ajudou a chegar perto do rock por caminho muito nosso. E o rock entrou no carnaval, com os trios soando entre heavy metal e progressivo a partir dos anos 1970. A história do rock na Bahia é intensa e rica — e, embora roqueiros precisem opôr-se ao carnaval, ela não existe sem reconhecer-se nele. Não apenas Raul, Marcelo Nova e Pitty sairam para o mundo gritando o rock soteropolitano: o rock já tinha entrado na circulação sanguínea do próprio carnaval.
Quero ser justo: um dos melhores discos de rock brasileiro de sempre é o novo do Cascadura, “Aleluia”. Fico profundamente feliz: Zeca (ainda pequeno) e eu ouvíamos apaixonados o CD dessa banda resistente quando eles gravaram “Nicarágua”. Eles nunca esmoreceram. Agora trazem um trabalho extenso e denso, com rítmica complexa, timbres ricos e interpretações espetaculares de Fábio. É um disco de responsa, que todos os amantes de rock deveriam ouvir. Não deixa de ser significativo que eu o tenha ouvido logo depois de ver Luiz Caldas encerrar noite quente no Fantoches com “Vassourinhas”. O Baiana System também falou da história da guitarra baiana, olhando para o futuro. Há referências ao carnaval em “Aleluia”. Vou ouvir mais. E falar mais. Eu me perco: é que quero ser justo como Salomão.


Em 1968 surgiu uma história de que os Beatles gravariam Asa Branca, composição de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. 








1968
Revista InTerValo
Ano VI - n° 298
Editora Abril

Pág. 16-17



Luiz Gonzaga vai ganhar 50 mil dólares, no mínimo. Isto porque os Beatles decidiram gravar o baião “Asa Branca”. Mas ficar milionário deixou Luiz com um drama de consciência: não lembra com certeza de que a música é mesmo de sua autoria.

– Desde que me conheço por gente – conta ele – Já cantava “Asa Branca”. Naquele tempo, lá no Nordeste, ninguém se preocupava em saber quem tinha feito uma música, nem sabia o que era folclore. Eu cantava músicas dos outros e os outros cantavam minhas músicas, sem preocupações com direitos autorais. Deve haver por ai muita música que inventei, passei adiante e que agora faça parte do folclore nordestino.

Quando Gonzaga tinha 8 anos. já era convidado para tocar sanfona nos “sambas”. Todo mundo gostava de ver o menino tocar “Asa Branca”. Sua mãe, Dona Santana, deixava ele ir, com a condição de que o trouxessem para dormir logo que o sanfoneiro “oficial” chegasse ao baile. Para Luiz Gonzaga, “Asa Branca” sempre foi uma música sua, embora ele não consiga lembrar-se de quando a criou.

Agora, esta música será gravada pêlos Beatles. É um baião simples, feito com apenas cinco notas. Gonzaga não tem medo de que os rapazes estraguem a puieza da melodia: “Eles são muito inteligentes, conhecem música muito bem. Na verdade, sempre senti nas “toadas” deles um pedacinho das nossas. Se analisarmos com atenção a música nordestina, vamos ver que ela tem um quê de música russa, flamenga e mesmo judaica e síria. 0 sertão conheceu muito os sírios e judeus, que andavam com seus jegues carregados de coisas paia vender. Eles influenciaram bastante a música e os hábitos dos nordestinos. Até hoje os sertanejos usam a estrela de Davi nos seus chapéus de couro. Sabe, eu gostaria muito que os Beatles usassem a gaita escocesa no arranjo. Ah. vai ficar uma beleza!”.


A TARDE

CULTURA| Música

Dom, 05/05/2013
Caetano Veloso assiste show da banda Cascadura em Salvador
Lucas Cunha

Caetano conferiu a apresentação da banda de rock baiana no Portela Café
O músico Caetano Veloso, 70 anos, esteve presente ao show da banda de rock baiana Cascadura, que aconteceu na última sexta-feira, 3, na casa de shows Portela Café, em Salvador, ao lado do grupo conterrâneo Sertanília. Após a apresentação, Caetano posou para uma foto com os integrantes do Cascadura.

Em recente artigo, publicado no dia 10 de fevereiro em A TARDE, Caetano elogiou o grupo Cascadura, ao afirmar que o mais recente álbum da banda, "Aleluia", lançado em 2012, era "um dos melhores discos de rock brasileiro de sempre".

Caetano já está em Salvador para a apresentação do show da turnê do disco "Abraçaco" (2012), que acontece no dia 17 de maio, sexta-feira, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves. Os ingressos já estão esgotados.



No hay comentarios:

Publicar un comentario