No Rio,
Roger Waters dá entrevista a Caetano Veloso sobre "onda fascista”
Caetano Veloso entrevista Roger Waters - Imagem: Reprodução/Mídia Ninja |
Do UOL, em São Paulo
23/10/2018
Caetano
Veloso entrevistou na noite desta terça (23/10), em sua casa no Rio, o músico
Roger Waters, que está em uma polêmica turnê no Brasil e se apresenta na
capital fluminense nesta quarta (24). A gravação vai ao ar nesta quarta, a
próxima edição da coluna do baiano na plataforma alternativa Mídia Ninja.
"O
assunto foi o fascismo, claro, a onda que está vindo no mundo", adiantou
ao UOL a produtora Paula Lavigne, mulher de Caetano. Em sua coluna sobre
política, o cantor já entrevistou em vídeo nomes como Ciro Gomes e Manuela
d'Ávila.-
A
relação entre Caetano e Roger Waters se tornou mais próxima em 2015, quando o
ex-Pink Floyd pediu ao brasileiro, em carta, que cancelasse seu show com
Gilberto Gil em Tel Aviv, em Israel, por motivações políticas.
"As
políticas coloniais e racistas de Israel têm devastado a vida de milhões de
palestinos (...) Eu imploro a você [Caetano] para não proceder com sua
participação", escreveu o britânico em uma segunda mensagem.
Em
resposta, Caetano Veloso agradeceu pela "atenção e o esforço"
dedicados para lhe esclarecer sobre a política na região, mas afirmou que a
apresentação não seria cancelada.
Roger
Waters a Caetano Veloso: "Pessoas boas também votaram em Adolf
Hitler"
Renata
Nogueira
Do
UOL, em São Paulo
26/10/2018
Caetano
Veloso e Roger Waters discutiram política, economia, história, meio-ambiente e
rock and roll em uma longa entrevista de 37 minutos divulgada nesta sexta-feira
(26/10) pela Mídia Ninja.
Na
conversa, os músicos refletem sobre a atual situação do Brasil e do mundo, com
a população cada vez mais dividida por causa das figuras que estão no poder. No
papo, Waters diz ter lido os jornais locais e se informado sobre Jair
Bolsonaro, candidato do PSL à presidência da República que vem sendo
publicamente criticado nas apresentações do ex-Pink Floyd, em turnê pelo
Brasil.
"Só de brincar
com a ideia de ter alguém como Bolsonaro como presidente de seu país seria
impensável se você tivesse qualquer sentimento social, político ou humanitário,
ou educação de qualquer tipo. Porque só pelo o que o cara fala, ele se afunda
com suas próprias palavras. Com esse papo de que o que nós precisamos é de mais
armas, o que precisamos é entrar nas favelas para matar todo mundo e que vai
ficar tudo bem, isso é uma completa falta de senso e só vai servir para atrasar
esse grande país. Porque o Brasil é um país maravilhoso", disse Waters.
O
roqueiro britânico usa várias referências para validar seu discurso. Para ele,
a culpa da atual situação do Brasil e do mundo vem das ideias neoliberais,
agravadas pelo ego daqueles que estão no poder. "Mesmo com essa extrema diversidade cultural e de manifestações, o
motivo das pessoas estarem nesse estado de desespero é por causa da economia
neoliberal [...] Eles dizem com todas as letras: 'Me dê o poder e eu irei
destruir tudo', e está escrito em tudo o que eles acreditam. Bolsonaro, e
Trump, e os outros."
Recuperando
a história da colonização nas Américas, ele ainda disse entender o
sentimento de insatisfação e lamentou o desprezo pela liberdade
individual. "Alguns dos grandes poderes, sendo os Estados Unidos o
principal deles, não aceitam a ideia de que uma Lei Universal possa ser uma
coisa boa. Isso tende a acontecer quando você é o cara com a arma."
Caetano Veloso entrevista Roger Waters em seu apartamento no Rio de Janeiro Imagem: Divulgação |
Nazismo em pauta
A Alemanha de Hitler também não foi esquecida pelo
britânico, que reforçou para que as pessoas não se esqueçam do ano de 1933,
quando o ditador alemão assumiu o poder. "Para
qualquer um que estudou autoritarismo, economia neoliberal e história, qualquer
um que meio que leu um livro sobre qualquer uma dessas coisas, ou qualquer um
que tem consciência do que aconteceu na República de Weimar na Alemanha em
1933, isso é brincar com fogo", disse ele sobre a tendência eleitoral
no Brasil.
Caetano então falou de desilusão ao observar
"pessoas boas" votando em Bolsonaro. "Muitas pessoas boas estão votando em Bolsonaro porque elas estão
iludidas por ideias doidas", disse o baiano.
"O que eu posso dizer a essas pessoas boas é que elas precisam se
lembrar de 1933, eu tenho certeza de que boas pessoas votaram em Adolf Hitler
também. E foram eleições democráticas. E quando ele chegou ao poder, eles
tiveram o Incêndio de Reichstag e, de repente, tudo mudou. Não havia mais leis,
só uniformes marrons e vingança. É um caminho super perigoso ter todas essas
pessoas boas pensando em votar em Bolsonaro", refletiu o entrevistado.
Vale lembrar que a produção artística de Roger
Waters desde os tempos de Pink Floyd tem total relação com sua própria história.
Seu pai, que foi do partido comunista inglês e depois se definia como
pacifista, morreu em combate durante a Segunda Guerra Mundial, em 1944, quando
Waters tinha apenas cinco meses de vida.
"Tudo o que Marx escreveu, na verdade, aconteceu na trajetória da
minha vida", disse o inglês. "No país mais rico do mundo [Estados Unidos], as pessoas estão
vivendo em barracos. É apavorante! Não têm condições de pagar planos de saúde,
não podem pagar nada. Não têm vida e não me surpreende que estejam revoltadas.
O triste de tudo isso é que eles não estão revoltados com as pessoas que estão
fazendo isso, eles acabam de eleger uma delas. Trump é o cara que fodeu vocês,
assim como o Bolsonaro".
Roger Waters posa ao lado de Caetano Veloso, Paula Lavigne e a equipe da Mídia Ninja no Rio de Janeiro - Imagem: Divulgação |
Música como voz
Conduzindo a entrevista, Caetano Veloso lembrou
ainda que ambos são contemporâneos, viveram sua juventude na década de 1960, e
agradece Roger Waters pela contribuição social com sua música. "Rock and roll era uma bobeira cultural
até os britânicos chegarem. Eu me lembro muito bem. Quando ganhou respeito
intelectual, trouxe um monte de temas que não estavam sendo ditos até então. E
isso foi chamado de contracultura. E o rock and roll foi quem puxou esse
movimento", agradeceu o brasileiro.
Roger Waters já havia falado sobre as vais e a
divisão do público em seus shows por causa da atual situação política do Brasil
ao "Fanástico", da TV Globo, e ao jornal "Folha de S.Paulo". O encontro do ícone da MPB brasileira com o ex-Pink Floyd,
no entanto, é de longe a mais longa entrevista divulgada, com poucos cortes de
edição. "Nós poderíamos sentar e
falar disso até o sol raiar. Eu só espero que o sol realmente venha. Isso seria
ótimo", conclui o roqueiro no encerramento.
A conversa com Roger Waters foi gravada na última
segunda-feira (22) no apartamento de Caetano Veloso no Rio de Janeiro, um dia
antes de Roger Waters se apresentar na cidade. A turnê, que também já passou
por São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Salvador, continua com um show em
Curitiba neste sábado (27) e outro em Porto Alegre na terça-feira (30).
27/10/2018
"Também houve pessoas boas a votar em
Hitler"
Caetano
Veloso esteve à conversa com Roger Waters durante a passagem do músico
britânico pelo Brasil, onde foi vaiado após criticar o
candidato de extrema-direita à presidência daquele país, Jair Bolsonaro.
Os
dois músicos aproveitaram o encontro para falar não só de política brasileira
mas também mundial, e das muitas divisões que se fazem sentir hoje em dia na
sociedade.
Roger
Waters, que afirma ter-se informado acerca de Bolsonaro antes de o criticar em
palco, afirmou que só o elegeria para líder quem não tivesse "qualquer
sentimento social, político, humanitário ou educação".
"Ele
afunda-se com as suas próprias palavras. Essa ideia de que o que é preciso é
mais armas, que precisamos de entrar nas favelas para matar toda a gente e
ficar tudo bem, é uma enorme falta de senso e só irá servir para atrasar este
grande país", disse o baixista.
Para
Waters, as grandes culpadas do estado atual de coisas no Brasil e no mundo são
as políticas neoliberais dos últimos anos. E lamentou, falando da colonização
do continente Americano, o sentimento de insatisfação e o desprezo pelas
liberdades individuais que se faz sentir.
Juntamente
com Caetano, Waters fez também passar a ideia de que nem todos os que votam em
Jair Bolsonaro são más pessoas. Para o músico brasileiro, "há muitas
pessoas boas a votar Bolsonaro porque estão iludidas por ideias loucas",
ao que o ex-Pink Floyd replicou que "também houve pessoas boas a votar em
Hitler".
"Essas
eleições foram democráticas. E, quando ele chegou ao poder, houve o incêndio no
Reichstag e tudo mudou. Já não havia leia, só camisas castanhas e
vingança", comentou.
E
não esqueceu, igualmente, a América de Trump: "Há pessoas a viver em
barracas no país mais rico do mundo. Não têm condições para pagar planos de
saúde, nada. Não me surpreende que estejam revoltadas. O pior é que não estão
com as pessoas que lhes fizeram isso, acabaram de eleger uma delas: o Trump foi
quem os lixou, assim como o Bolsonaro o fará", lamentou.
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