FOLHA DE S.PAULO
Ilustrada
Quinta-feira,
6 de abril de 1978
Caetano: o essencial é produzir
Paulo
Francis/Nova York
5/4/1978 - Caetano Veloso e Gal Costa partem amanhã para uma temporada europeia. Depois ele vai (sozinho) descansar nos EUA - Foto: M. Pires/Folhapress
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Rio
(Sucursal) - O cantor e compositor Caetano Veloso comentou ontem recente
entrevista do chefe do SNI (Serviço Nacional de Informações),
general João Batista Figueiredo, afirmando que vê equilíbrio em sua resposta
sobre os intelectuais e na referência a Chico Buarque de Hollanda, mas não
concorda de maneira ampla com a opinião do ministro.
“Concordo
com o que o general diz, que nós artistas de maneira geral não estamos armados
tecnicamente para ter uma discussão politica, mas isto não impede de modo algum
que tenhamos uma vida politica e que participemos da vida política”, disse
Caetano, que amanhã, juntamente com Gal Costa, embarca para a Europa para
realizar uma série de concertos em diversos países.
Entre
todas as respostas do general Figueiredo, Caetano Veloso gostou mais da que se
refere aos intelectuais, por tratar de coisas que ele, Caetano, está mais
familiarizado, “suponho que o próprio general não aceita a idéia de que o Chico
Buarque não tenha o direito de se manifestar politicamente”, disse o
compositor.
Muito
à vontade para comentar qualquer assunto e demonstrando estar bem informado
sobre o momento brasileiro, negando assim a imagem de alheamento que lhe
imputam, Caetano Veloso no entanto não abre mão da idéia de que a função do artista é produzir arte, independente da situação da
sociedade em que vive.
O
controvertido cantor, que ao longo dos últimos dez anos teve diversos problemas
com as autoridades brasileiras, diz que estes problemas não ocorreram por
músicas ou posições: “Na verdade eu tive muitos problemas com nada, pois além
de não fazer política meus hábitos estão dentro da lei. Esses problemas vieram
pelo fato de eu estar produzindo arte num momento em que a sociedade estava
conturbada. Nestes momentos conturbados, o artista é atingido”.
5/4/1978 - Foto: M. Pires/Folhapress |
Ele
explica porque a função do artista é produzir: “Numa sociedade qualquer, esteja
ela carente de transformações ou não, a função do músico é produzir música. Se
a sociedade está ou não em mudança é problema geral da sociedade. A situação da
sociedade é uma coisa contingente na determinação do artista, o essencial é
producir, e a sociedade, em qualquer momento, precisa de música para existir,
para viver”.
Caetano
confessa que não está com ansiedade de coisas novas na música brasileira, pelo
menos no sentido inovador dos anos 60, a época que lembra como de “muito quebra
pau”. Na verdade se diz mais conformista, achando que há oportunidade para
conquistar coisas e não inoválas.
“Querer
inovar as coisas à maneira dos anos 60 é querer tirar leite de pedras, isto sim
é redundância pois a criação não é um processo linear, continuo, ela vem de
todas as direções.”
Caetano
tem ouvido muita música brasileira, principalmente, Jorge Bem e um cantor
novato, Cassiano, autor da música “A Lua e eu”. Ele está gravando um novo
disco, que será lançado semanas depois de regressar desta turnê com Gal Costa.
Entre suas músicas novas uma tem o título de “Terra” e outra foi feita para o
filme “A Dama do Lotação”.
Os
dois se apresentam em Roma, Paris, Genebra, Zurique, fazem “shows” para a TV
francesa e Gal grava um disco na França. Ela está muito
tranquila e contente. Apresentará músicas de Caymmi, Tom Jobim e muita dança de
candomblé e depois da temporada passará um período de férias na Espanha,
Caetano ao contrário, viajará para Nova York, não para trabalhar, mas apenas a
fim de “sentir” as coisas que estão acontecendo por lá.
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