jueves, 8 de febrero de 2018

2018 - TARSILA do AMARAL





Entrada da exposição “Tarsila do Amaral: Inventing Modern Art in Brazil”, “A Negra”, de 1923 e a tela “Carnaval em Madureira”, de 1924 || Créditos: Reprodução / Divulgação


Tarsila do Amaral: Inventing

Modern Art in Brazil


February 11–June 3, 2018

The Museum of Modern Art 



Antropofagia (1929) e “Abaporu” (1928) dão as boas vindas aos visitantes da exposição “Tarsila do Amaral: Inventing Modern Art in Brazil” || Créditos: Divulgação

Tarsila do Amaral  'Abaporu' 1929. 
Courtesy of El Museo de Arte Latinoamericano de Buenos Aires.



A data da estreia de Tarsila em Nova York coincide com um marco histórico para a arte brasileira.

Em 11 de fevereiro de 1922, foi aberta no Teatro Municipal de São Paulo a Semana de Arte Moderna, na qual artistas e intelectuais apresentaram novas formas de expressão libertas da estética do século 19, regida pela tradição europeia, e abriram caminhos para a invenção de uma arte nacional independente e moderna.


FOLHA DE S.PAULO

ARTES PLÁSTICAS

MoMA expõe obras de Tarsila do Amaral nos anos 1920, como 'A Negra'

Primeira mostra da artista nos EUA é parte de movimento por esquadrinhar raízes do moderno

Silas Martí
NOVA YORK

Ela quase transborda do quadro, os dedos dos pés e o alto da cabeça roçando os limites da pintura. O seio enorme, que pende sobre os braços cruzados, e os lábios carnudos fazem dessa figura despida uma mulher superlativa, com ar de fera enjaulada ou mucama violentada.

Tarsila do Amaral pintou "A Negra" há quase um século, em Paris, num momento em que os modernistas ali ousavam deformar o retrato da realidade buscando seus modelos na chamada arte primitiva das máscaras africanas.

Mas essa figura meio animalesca, de traços superexagerados, nunca foi uma abstração. O retrato real de uma escrava da velha fazenda da família da artista no interior paulista serviu de base visual para essa tela que agora encara uma plateia novíssima.

No segundo andar do MoMA, em Nova York, sua ama de leite diante de uma folha de bananeira é o abre-alas de uma das mostras mais aguardadas na onda de revisão do repertório moderno de uma instituição que tenta esquadrinhar os limites dessa vanguarda desde que apareceu.

E Tarsila em Manhattan, na primeira mostra da artista nos Estados Unidos, responde pela vertente mais exuberante de uma narrativa esgarçada da modernidade.

O estranho poder de fogo de sua pintura se revela de uma tacada só nas duas galerias dessa mostra ao mesmo tempo enxuta e potente --de um canto, é possível observar "A Negra", "Abaporu" e "Antropofagia" em série, os três trabalhos quase nunca reunidos que viraram os alicerces da iconografia brasileira construída pela artista.

Também estão lá algumas de suas paisagens mais surreais e desconcertantes, como "Sol Poente", "Floresta" e "Cartão-Postal", todos delírios visuais da mesma década de 1920 em que árvores e flores ganham contornos roliços em degradês tecnicolor.

Luis Pérez-Oramas, o crítico venezuelano que organiza essa exposição seis anos depois de comandar uma edição marcante da Bienal de São Paulo, comenta que Tarsila, morta aos 86, em 1973, passou a vida arquitetando contrastes entre "a carne da natureza e a carne humana".

Era, no caso, a carne ainda indigesta de "A Negra" e do "Abaporu", a escrava e o canibal que aparecem juntos em "Antropofagia", espécie de apoteose de uma série que retrata o entrelaçamento de instintos feéricos e ilustrados.

MENTE E CORPO

Tarsila, que estudou em Paris com Fernand Léger e ainda viu de perto o auge do cubismo e do surrealismo, nesse ponto parecia romper com a crença dos europeus numa separação estanque entre mente e corpo, o que fez de sua obra a maior tradução visual do pensamento do marido Oswald de Andrade e seu "Manifesto Antropófago".

Mesmo selvagens na superfície, os quadros de Tarsila não negam uma matriz europeia. Bem à moda antropofágica, figuras como o "Abaporu", espécie de porta-estandarte da filosofia oswaldiana, reinventam o repertório gestual de telas clássicas.

Seu homem nu de pernas descomunais descansa a cabeça sobre o punho no mesmo gesto de abandono, preguiça e tristeza de "Melancolia", autorretrato do alemão Albrecht Dürer do século 16, e da jovem nua no centro de "Almoço na Relva", a obra-prima de Manet, do século 19.

Nem mesmo a aparente volúpia abrutalhada de "A Negra" escapa a essas raízes.

Na visão de Stephanie d'Alessandro, também à frente da exposição, o retrato da mucama, capaz de ofender a sensibilidade aflorada dos americanos em tempos de debate racial acirrado, canaliza a pose dos banhistas lânguidos e erotizados de Cézanne.



A artista, em fotografia de meados da década de 1920 – Divulgação

Mas, se Tarsila foi uma espécie de herdeira intranquila e rebelde da tradição europeia, ela também foi o ponto de partida para a outra ponta da modernidade brasileira, que ganhou corpo umas quatro décadas depois do auge de sua fase antropofágica.

"Ela foi a mãe da arte moderna no Brasil", diz a curadora. "É a artista que todos foram investigar mais tarde porque descobriu uma nova linguagem que vai além de um meio-termo entre a arte da Europa e visões do Brasil."

Os contornos e as cores resplandecentes de suas pinturas mais carnavalescas, de corpos transbordantes e paisagens quase lisérgicas, de fato ressurgem nos trabalhos de neoconcretistas como Hélio Oiticica e Lygia Clark, outros dois brasileiros alvos de mostras recentes no MoMA, e na tropicália de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Mutantes.

"Seus quadros falam de uma realidade que transborda dos limites da representação", afirma Pérez-Oramas.

"Tarsila misturou arte moderna com aquilo que a burguesia brasileira de sua época achava desprezível. E isso começou com 'A Negra'. No centro da modernidade brasileira, há um sujeito subordinado, que é negro e mulher. Ela seria a mãe de todos nós."



"A Negra", obra de Tarsila do Amaral
"Abaporu" (1928), de Tarsila do Amaral
Quadro "Antropofagia", óleo sobre tela (1929) de Tarsila do Amaral


"Operarios", óleo sobre tela (1933)



4/3/2018


Ontem em São Paulo com Aracy Amaral, professora da USP, durante o encontro de preparação para o dia 26/3, onde irei ministrar a palestra sobre o trabalho de Tarsila Do Amaral, no @themuseumofmodernart, em Nova Iorque.

O livro VerdadeTropical foi a principal fonte de pesquisa para a primeira exposição sobre a artista brasileira nos Estados Unidos.






24/3/2018 - Caetano em Nova York



24/3/2018 - Caetano Veloso e o curador Luis Pérez-Oramas






Fonte: Facebook 



24/3/2018


26/3/2018












O GLOBO

Cultura



Caetano cita Marielle Franco em palestra sobre Tarsila do Amaral em Nova York



No MoMa, Caetano comentou momentos duros que vivemos hoje no Brasil


Por EDUARDO GRAÇA, ESPECIAL PARA O GLOBO
27/03/2018


26/3/2018 - Caetano Veloso ao lado do curador da exposição Luís Pérez-Oramas
Foto: Eduardo Graça / Agência O Globo


NOVA YORK — “Marielle, presente”. Foi assim que Caetano Veloso terminou na noite desta segunda-feira a conversa de uma hora e vinte minutos que teve no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) com um dos curadores da primeira exposição dedicada a Tarsila do Amaral (1886-1973) nos EUA, Luís Pérez-Oramas.

O cantor e compositor foi aplaudido ao invocar, pausadamente, o nome da vereadora Marielle Franco (1979-2018), assassinada no dia 14, quando respondeu a um questionamento da audiência sobre a identidade nacional e a situação cultural, social e política do Brasil neste momento.

O evento é um dos destaques da programação especial de “Tarsila do Amaral: inventando a arte moderna no Brasil”, que fica em cartaz no museu até a primeira semana de junho, e contou com a presença de pouco mais de uma centena de pessoas no segundo andar do museu, entre eles os artistas plásticos Vik Muniz e Regina Silveira, o músico Arto Lindsay (parceiro de Caetano), e o curador da próxima Bienal de São Paulo, Gabriel Pérez-Barreiro.

— Estamos vivendo momentos muito difíceis e, obviamente, eu tenho que dizer aqui: Marielle presente!

Caetano comentou, ao fim da conversa com Oramas, que a visão de uma de suas obras mais queridas de Tarsila, “A negra” (1923), o emocionou especialmente quando visitou, no domingo, o segundo andar do MoMA:

— Este quadro sempre me tocou, mas quando o vi aqui e agora, chegando do Brasil, ele retratando uma mãe negra, me tocou muito, mais ainda - afirmou, e seguiu: — Tarsila é muito autobiográfica, aquela imagem tem muito a ver com a vida dela, mas também com a do brasileiro. Aquele peito diz muito sobre a amamentação de crianças, negras e brancas, no Brasil.

Perguntado se havia uma música que retratava o Brasil de Marielle, Caetano pensou um pouco antes de responder:

— Nem sei...faz pouco tempo eu achava que era o “Haiti”, mas pode ser “Fora da ordem”.

Caetano afirmou ainda que ficou satisfeito com o evento - bem-humorado, embora fizesse toda sua preleção em inglês, ele tratou de sua dificuldade em entender as perguntas em inglês feitas pelo público, majoritariamente brasileiro, “e em português também, porque a audição já não é mais a mesma” - e honrado com o convite.

E disse que as pontes entre a Tropicália e o Modernismo são muitas, mas que o trabalho de Tarsila especificamente - “um freio delicado, e feminino, ao futurismo vulgar que marcou o início do modernismo no Brasil” - não comoveu os tropicalistas em um primeiro momento.

Imediatamente após a declaração, no entanto, ele lembrou que a descoberta da obra de Oswald de Andrade (1890-1954), “do manifesto antropofágico, e do Abaporu, obra de Tarsila que sintetiza na imagem as ideias do escritor” foram centrais para o movimento:

- Vi “O rei da vela” na montagem de Zé Celso em 1967, foi um tapa na cara e aí mergulhei na obra do Oswald. Tudo o que eu queria dizer em meu primeiro disco solo, “Caetano Veloso” (1968), já estava pronto, dito por ele - afirmou.

Apresentado como "figura lendária" da cultura brasileira por Pérez-Oramas, Caetano respondeu muitas questões do curador sobre episódios narrados pelo artista em seu livro “Verdade tropical” (1997). Também ofereceu uma pensata sobre as cores de Tarsila e fez menção elogiosa à maior especialista da artista no Brasil, a professora Aracy Amaral (“Ela nos alertou: Tarsila não é uma tropicalista, e está certíssima”).

Tratou ainda da importância dos irmãos Campos, Haroldo (1929-2003), mas especialmente as trocas intelectuais com Augusto, para o tropicalismo, e conduziu o público a um divertido e contundente passeio por “O presidente negro” (1926), de Monteiro Lobato (1882-1948), apresentado como um visionário conservador, com o livro tratando tanto da eleição de um presidente negro nos EUA no século XXI, em meio a previsões sobre mídias digitais, quanto sobre eugenia.

Sobre a explosão do tropicalismo nos EUA no momento, especialmente através das artes plásticas, com mostras dedicadas a Helio Oiticica (1937-1980), Lygia Clark (1920-1988) e Lygia Pape (1927-2004) celebradas por crítica e público locais, Caetano lembrou de um outro Rio, quando conviveu com seu amigo Helio:

— Conversávamos sobre coisas da vida, a Mangueira, pessoas que ele conhecia, histórias, e música. Os eventos musicais tomavam o imaginário, naquela época, de todas as classes, e raramente falávamos sobre artes plásticas.





FOLHA DE S.PAULO

Caetano cita Marielle ao visitar mostra de Tarsila do Amaral nos EUA

Artista foi freio delicado e feminino ao 'futurismo vulgar' do modernismo no Brasil, diz compositor

Silas Martí
NOVA YORK

Foi muito sutil, mas Caetano Veloso infiltrou um instante de protesto político dizendo “Marielle presente” ao encerrar sua fala sobre Tarsila do Amaral no MoMA.

Dias depois do assassinato da vereadora, ele disse ver de outra forma outra negra, a visão da modernista de uma ama de leite que abre a exposição.

 
'A Negra', obra de Tarsila do Amaral

“Esse quadro sempre me tocou, mas ver isso agora, chegando do Brasil, ele me tocou mais ainda”, disse. “É uma coisa que o brasileiro entende logo. É uma mãe negra. Aquele peito diz muito sobre amamentação por negras de meninos negros e brancos.”

Foi um dos eventos mais concorridos de uma noite de primavera nova-iorquina. Na plateia, artistas como Vik Muniz e Regina Silveira, o curador da próxima Bienal de São Paulo, Gabriel Pérez-Barreiro, o músico Arto Lindsay, colecionadores e poderosos do circuito artístico da maior metrópole dos Estados Unidos.

Tarsila, disse o cantor, foi um freio delicado e feminino ao “futurismo vulgar” que marcou o surgimento do modernismo no Brasil. E antecipou a mescla de alta e baixa cultura por trás da tropicália.

“Há muitas coisas que ligam o que fizemos e sonhamos em fazer no fim dos anos 1960 com o trabalho de Tarsila”, disse o músico, sentado diante de “Antropofagia” e ao lado do “Abaporu”. “Mas não foi um contato imediato com ela o que nos comoveu.”

Ele disse, no caso, que o interesse pela pintora surgiu depois de ver o “tapa na cara” que foi a montagem de “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade, no Teatro Oficina de Zé Celso, e depois se dar conta que por trás do “Manifesto Antropófago” havia essa mulher chamada Tarsila.

“Quando eu vi, pensei que aquilo era tudo que eu queria fazer no meu primeiro disco, que já estava pronto”, ele contou. “Fui então falar com Zé Celso e foi incrível. O cenário era incrível, e a peça era uma coisa nova, muito agressiva na estética. Isso foi uma coisa muito nova para mim.”

E essa coisa muito nova, tanto para ele quanto para Tarsila, não tinha a missão de negar o passado. Caetano disse que a força da obra da modernista estava no resgate radical de cânones do passado –um refinamento e sofisticação europeias revistos à luz das cores do baú de sua velha fazenda e das flores de papel da infância no interior.

“Outras pessoas seguiram o que chamo de um futurismo vulgar, que tinha a ambição de negar o passado, mas isso foi feito não para dizer que Velázquez não vale nada.


Isso foi feito para dizer que ninguém pode passar incólume por Velázquez”, disse Caetano. “Ela deu mais vida à tradição do que negou.”





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