martes, 20 de junio de 2023

1995 - MINA D'ÁGUA DO MEU CANTO - GAL COSTA no CARNEGIE HALL

 

24/6/1995


Gal mostra Mina d'água do meu canto nos EUA dia 28 - 16/5/1995
Foto: Beti Niemeyer








28/6/1995 - JORNAL DO BRASIL





São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 1995

Gal Costa diz em Nova York que gravadoras desprezam a MPB

LUÍS ANTÔNIO GIRON
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

A cantora baiana Gal Costa, 49, mostra hoje, no Carnegie Hall de Nova York, seu show "Mina d'Água do meu Canto". Os ingressos para o espetáculo se esgotaram há uma semana.

É uma das maiores atrações do JVC Jazz Festival, tradicional evento de verão que anima a cidade durante dez dias.

"Já tenho um público cativo aqui", diz Gal, no lobby do flat Del Monico, na rua 59, perto do Central Park. "Já não fico ansiosa com uma estréia. É como se eu viesse para cá fazer uma festa. Não é como no Brasil, onde temos uma história, e cada show tem um enorme significado."

O espetáculo compreende um repertório de clássicos de Caetano Veloso e Chico Buarque. Uma banda de sete músicos dá conta de arranjos camerísticos, tendendo para o orquestral, a cargo do diretor artístico do show, o violoncelista Jaques Morelenbaum.

"Mina d'Água do meu Canto" é também o nome do novo CD de Gal, que foi lançado com o show em 10 de maio no teatro Castro Alves em Salvador, percorreu o Nordeste e aterrissou em San Francisco no último sábado. Gal cantou lá para 2.000 pessoas.

"Tinha muito americano na platéia", comenta. "Nas minhas turnês tenho notado que os estrangeiros vão aprendendo aos poucos a cantar nossa música em português. A MPB ensina os outros povos a falar português. A música brasileira vai salvar o português do esquecimento porque difunde a língua através das canções."

Apesar do sucesso de público e da carreira consolidada, Gal não viu seu disco nas lojas de San Francisco.

"Fiquei chateada porque noto que as gravadoras não se dão conta da importância da música brasileira no exterior. É o nosso grande produto de exportação, mas as gravadoras desprezam o que têm. Elas deveriam investir nos lançamentos dos CDs brasileiros no exterior, mas não o fazem."

Ficou de olhar se o novo CD está nas lojas de Nova York no passeio que faz hoje pela cidade. "O que eu mais gosto daqui é a sensação de anonimato", sorri.

"Ando pelas ruas sem que ninguém me reconheça. Quando alguém nota é argentino."

O espetáculo vai à Europa em julho e estréia em São Paulo, no Palace, em 14 de setembro.

É a terceira vez que Gal se apresenta no teatro que lançou internacionalmente a bossa nova em 1962, com o show protagonizado por Tom Jobim e João Gilberto (modelos estéticos da cantora). O primeiro show foi há dez anos.

Mas é a primeira vez que canta na cidade sem a companhia de Tom, morto em Nova York em dezembro do último ano: "Esta era a cidade do Tom, e para mim é muito triste não encontrá-lo mais aqui".

Em memória do mestre, Gal canta hoje três músicas de Tom. Quer também apresentar ao público a faixa-título do disco, composição de Caetano e Chico em homenagem ao maestro.

Outra modificação do show é a exigência do intervalo e da luz branca, sem cenário. "O Carnegie Hall mantém a tradição de casa de concerto", diz Gal. "E eu não deixo de me mostrar como uma concertista, despida dos ornamentos de um show habitual."



O jornalista LUÍS ANTÔNIO GIRON viaja aos EUA a convite da produção do JVC Festival




São Paulo, sexta-feira, 30 de junho de 1995

Gal vira João de saias no Carnegie Hall

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DO ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

Os "brazucas" mais uma vez se curvaram ao Brasil com o show da cantora baiana Gal Costa anteontem no Carnegie Hall, dentro da programação do JVC Festival.

Eles lotaram o teatro, mataram saudades e cantaram os 26 clássicos que Gal reienterpretou ao longo de duas horas.

Ela repetiu como verdade um bordão pejorativo que lhe atribuíram no início da carreira, a de que não passava de um João Gilberto de saias. Agora sim, passados 29 anos da estréia, Gal é o João de saias. Faz 50 anos em 26 de setembro, está no ápice e dali não deve mais se retirar.

O público sedento de português demonstrou que o prestígio internacional da MPB se deve menos às qualidades desta do que à grande diáspora dos brasileiros rumo ao Primeiro Mundo.

O novo CD de Gal, "Mina d'Água do Meu Canto", lançado no Brasil em maio, não está nas lojas e poucas pessoas o conheciam. Como o repertório é de música de Caetano e Chico, a ausência do produto não prejudicou o show.

Gal é identificada em Nova York com Tom Jobim (1927-1994), pois cantou com ele diversas vezes na cidade. Por isso, incluiu duas músicas do compositor no espetáculo: "Corcovado" e "A Felicidade".

Na metade do show, explicou em inglês que ia interpretar uma nova composição de Caetano e Chico, o samba "Como um Samba de Adeus", em honra a Jobim.

A música diz: "Quanto tempo pode durar um espanto?" Gal mostrou que, em se tratando de bossa nova, este pode se eternizar.

Cantou a "soto voce", investindo nos pianíssimos. A tônica do espetáculo foi Gal derivando aos graves e às intensidades discretas.

A amplificação ruim e a tensão do septeto que a acompanhava não foram capazes de encobrir o poder da maior intérprete da MPB.

Fez seu vestido longo lilás de seda dançar com os movimentos sinuosos do candomblé. Explorou cada canção com calma e segurança. Só quebrou o sossego em "Língua" e "Odara".

Essa última música não faz jus ao resto do repertório. O arranjo estereotipado de Jaques Morelenbaum leva bons músicos a agirem no palco como se labutassem num estúdio. Teria sido o fim, se Gal, diante da platéia em pé, não houvesse cantado "Vaca Profana".

Desencorajou o público a acompanhá-la, exceto no refrão do samba "Quem te Viu, Quem te Vê", de Chico. Permitiu que a platéia entoasse em coro o "laralaiá".

Por instantes, o Carnegie Hall se pareceu com o teatro da Record de São Paulo, onde aconteceram os festivais de MPB nos anos 60.

Exibiu uma voz mais ampla, não só construída sobre os superagudos. Gal está mudando de característica vocal; passa de soprano a mezzo, fato que lhe dá maior tessitura, mais alcance.

Juntou o rigor da melodia à temperança dos sentimentos em "O Ciúme" e "
Desalento". Surgiu então a discípula sem ansiedade de João. Levou três décadas para se converter no mestre. Em pelo menos uma noite, conseguiu.



O jornalista LUÍS ANTÔNIO GIRON viajou aos EUA a convite do JVC Festival




30/6/1995 - JORNAL DO BRASIL











No hay comentarios:

Publicar un comentario