“O que a gente pode
dizer num momento tão triste nessa perda imensa pra todos.
Gal, você é e sempre vai ser essa luz que
abrange tudo com sua voz de puro cristal.
Cante no paraíso que estiver. A gente te ama pra
sempre.”
Bruna Lombardi,
9/11/2022
GZH
Minha amiga Gal Costa: uma voz tamanha
Estávamos todos na
mesma frequência, caminhando na direção do sol, sem lenço e sem documento, sem
querer repetir os erros de uma sociedade que não nos traduzia
23/11/2022
Agora é o silencio. Porque depois da voz dela se espalhar no ar, depois do mundo cantar junto, depois de fazer a vida ficar melhor e tão mais bonita, depois de você, Gal, só o silêncio.
Um silencio imenso e profundo, onde todas as vozes, os murmúrios, o burburinho das pessoas ficou num outro plano, desaparecendo ao fundo da cena, sumindo dentro de uma súbita neblina que cobriu tudo. De repente o show parou. O palco ficou vazio. No centro, no foco de luz, sua ausência.
Aos poucos sua voz vai ser multiplicada e por todos os lados, como jorros de luz, vamos escutar esse som que vem dos anjos, de algum lugar que é puro deslumbramento.
Os planos da minha memória se sobrepõem. Recebi a notícia ao embarcar e agora, do meio das nuvens, revejo fragmentos de uma história. Gal Costa se foi e com ela se vai uma era.
Um país que tive a sorte de vivenciar, um sonho do qual fiz parte, uma emoção sem fim.
Começa na minha adolescência, descobrindo maravilhada um mundo que falava de paz, amor e liberdade. Uma explosão de idéias e talentos, expressões, roupas, atitudes, liberdade, sexo e música, muita música.
Meu nome é Gal, cantava aquela voz de cristal, um
clima selvagem nas dunas da Gal, cabelos soltos, roupas leves, corpos
flutuantes e um verão que parecia nunca ter fim.
A gente cantava nas ruas e mesmo sem dinheiro pra ir no show sentia a vibração desse novo tempo onde a Gal surgia já icônica.
Esse foi o mundo que me encantou e me deu um norte, um rumo, um pertencimento. Estávamos todos na mesma frequência, caminhando na direção do Sol, sem lenço e sem documento, sem querer repetir os erros de uma sociedade que não nos traduzia.
A vida era jovem e tinha uma proposta. Tinha uma clara filosofia. Uma mudança de valores, a perspectiva da grande transformação.
Era o Brasil anos 70 em plena Ditadura, Censura e Repressão. A Arte era uma forma de resistência, a manifestação de um infinito talento que criou esperança de um mundo possível.
Sobrevivemos de paixão, tesão e alegria.
Nem todos sobreviveram, mas essa é outra história.
Agora aqui, no meio das nuvens, revejo amigos e sei como tudo isso foi me mostrando o caminho. O astral feliz dessa gente linda deu significado pras coisas e foi parte da matéria prima que me faz ser o que sou.
Eu era a menina que queria abraçar toda a extensão do planeta e a Gal explodia sensual na trilha sonora.
O mundo discutia a Revolução Sexual, o Poder do Feminismo, do Movimento Black Power, a Contracultura e tantas outras questões fundamentais para construção de uma nova sociedade.
A poesia concreta nas esquinas de Sampa, o Xingu e suas terras demarcadas graças aos irmãos Villas-Boas, os intelectuais brilhavam, o mundo buscava cultura, inteligência, beleza. Gente é pra brilhar e não pra morrer de fome.
O Ri e eu apaixonados íamos em todos os shows, doces bárbaros, Caetano, Gil, Bethânia, Gal, Chico, Milton Nascimento, Rita Lee, Djavan, Cazuza, Marina. Nessa altura já éramos todos amigos, frequentávamos as casas uns dos outros, bares, conversas, risadas. Tudo perigoso, tudo divino maravilhoso.
Gal, amiga querida, você é pra sempre.
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