1/6/1966 |
10/6/1966 |
12/6/1966 |
Sérgio Cabral (17 de maio de 1937/14 de julho de 2024) |
31/7/1966 |
5/11/1966 - JORNAL DO BRASIL |
6/11/1966 - JORNAL DO BRASIL |
7/11/1966 - O GLOBO |
30/6/1967 - JORNAL DO BRASIL |
Maria Bethânia e Tuca |
“Encontrei esse convite de Maria Bethânia. De 1967, quando ela apresentou "Me disseram" com Rosinha de Valença ao violão, e abriu espaço para que eu mostrasse duas ou três músicas minhas, entre elas "Não muda, não".
Obrigada, Maria, pela generosidade com aquela compositora iniciante de 19 anos.
[Joyce Moreno, Instagram, 2022]
Thereza Aragão - Foto acervo Iris Ferreira Torre |
São Paulo, domingo, 20 de fevereiro de 2005
FERREIRA
GULLAR
Fim de papo
Tenho a vaidade de dizer que pertenci ao grupo de
artistas e intelectuais que contribuíram para que o público da zona sul do Rio
de Janeiro passasse a valorizar os sambistas das escolas de samba.
Já no CPC, no comecinho dos anos 60, esse grupo fez
as primeiras aproximações, promovendo pequenos shows na sede da UNE, no
Flamengo, e depois ajudando a organizar o célebre espetáculo de música popular
brasileira no Teatro Municipal, até então templo intocado da música erudita.
Cartola faz alusão a esse feito num samba célebre.
Mas foi no teatro Opinião que o grupo deu expansão
a esse trabalho de valorização do samba. Seu espetáculo de estréia, o show
"Opinião", com Nara Leão, Zé Kétti e João do Vale, mostrava esse
propósito de juntar, sem preconceitos, a música do sertão com a do morro e da
classe média carioca. Em seguida, Thereza Aragão criou "A Fina Flor do
Samba", espetáculo às segundas-feiras que apresentava à gente da zona sul
os compositores, cantores, passistas e ritmistas das escolas de samba, quase
todos eles artistas anônimos, apesar de talentosos.
Nada disso ocorreu por acaso. Nós éramos, já
naquele tempo, assíduos freqüentadores dos ensaios das escolas, em especial a
Thereza, que conhecia pessoalmente cada um daqueles artistas, de Monarco a Nega
Pelé. E, nos dias de desfile, estávamos juntos todos na arquibancada, onde
éramos dos primeiros a chegar: Vianinha, Armando Costa, João das Neves, Pichín,
Denoy, León Hirszman, Paulo Pontes... E o grupo foi crescendo à medida mesmo
que o prestígio do samba de escola se ampliava nas hostes de Copacabana e
Ipanema.
Em "A Fina Flor do Samba", o público da
zona sul teve a oportunidade de ouvir, cantados por seus autores, os lindos
sambas de Silas de Oliveira, Cartola, Darcy da Mangueira, Marçal, muitas vezes
acompanhados pelos melhores ritmistas da bateria de suas respectivas escolas.
Um dos maiores sucessos das noites de segunda-feira no "Opinião"
foram as exibições de Nega Pelé, passista notável por suas virtudes de
dançarina e seu corpo elegante. Um empresário da noite, atraído pelos elogios
que ouvira, veio ao nosso teatro e contratou-a para se apresentar num show que
logo estrearia no Copacabana Palace.
Nossa identificação com as escolas de samba era
tanta que, por inspiração de Vianinha, chamamos Sérgio Cabral para colaborar na
elaboração de um espetáculo que se chamaria "O Samba Pede Passagem".
Como o show continha muitas críticas à ditadura militar, foi proibido pela
censura e nunca estreou. Mas isso não impediu que as noites de samba do
"Opinião" continuassem a mostrar à zona sul -mesmo porque o teatro
Opinião ficava em Copacabana, no shopping center da rua Siqueira Campos- o
talento dos morros e subúrbios cariocas, como Martinho da Vila, Noel Rosa de
Oliveira e Paulinho da Viola, que estreara há pouco no show "São Quatro
Crioulos", no teatro Jovem.
Da admiração passou-se à participação: a própria
Thereza criou uma ala "de brancos" na Acadêmicos do Salgueiro. Mas
até aí ninguém pretendia se tornar a estrela da escola e, sim, apenas,
experimentar a alegria e a glória de tomar parte naquela esplêndida festa
popular. Todos, homens e mulheres, esforçavam-se para aprender a "sambar
no pé". Muitos o conseguiram, especialmente as mulheres, mas nenhuma delas
jamais pretendeu tomar o lugar da passista da escola à frente da bateria. É a
diferença que há entre identificação, reconhecimento do mérito alheio e
usurpação.
Até eu me tornei letrista de um samba-enredo! Mas
um samba que nenhuma escola cantaria, ainda que meu parceiro fosse nada mais
nada menos que Silas de Oliveira... Trata-se do samba-enredo da peça criada por
Dias Gomes e escrita por nós dois e que se chamou, em sua primeira versão,
"Dr. Getúlio, Sua Vida e Sua Glória". A letra tinha que ser escrita
por um dos dois autores da peça, porque teria função essencial na dramaturgia
do espetáculo. Escrevi por estar mais afeito ao gênero, já que sabia de cor
quase todos os sambas-enredo das grandes escolas.
A peça se desenvolvia como um desfile de escola de
samba, com suas alas, destaques e alegorias, narrando o complô armado para pôr
abaixo o presidente da escola, que, no desfile, encarnava a figura de Getúlio
Vargas. No final, em vez de o presidente se suicidar, como ocorreu na
realidade, na peça é assassinado pelos pistoleiros da ala das Aves de Rapina...
Na segunda versão, montada em 1982, a peça passou a se chamar
"Vargas", e o samba-enredo foi composto por Chico Buarque e Edu Lobo.
Mas por que estou aqui a relembrar estas coisas?
Para deixar claro que nunca tive e não tenho nada contra a participação de
"brancos" no desfile das escolas. Tampouco me sinto obrigado a não
ver que isso hoje serve a muitos interesses, que, na maioria dos casos, não são
os dos sambistas e das comunidades onde essas escolas nasceram. Não, não sou
nostálgico dos desfiles que duravam 14 horas, mas os vivi com emoção -a emoção
que falta hoje à marcha acelerada das escolas, que, como disse o mestre
Jamelão, não deixa a passista sambar. Sim, sou nostálgico dos grandes
sambas-enredo do passado, porque os cantei com emoção -a emoção que falta aos
de hoje, os quais, por isso mesmo, ninguém sabe de cor. Enfim, pouco ou nada
tenho a ver com esse cansativo desfilar de alegorias, custeado por nós, para o
enriquecimento e a glória dos bicheiros.