Revista de poesia e arte de vanguarda editada
por Torquato Neto e Waly Salomão.
Foi editada em 1972 mas lançada somente em 1974, como "primeira edição única"
Foi editada em 1972 mas lançada somente em 1974, como "primeira edição única"
Waly Sailormoon/Waly Salomão |
Ivan Cardoso e as Ivanps |
Poema de Caetano Veloso |
Maqueta Revista Navilouca - Archivo Lafuente - Foto: Ivan Cardoso |
1975
Revista Amiga
n° 267
2 de julho de 1975
Fotos: Francisco Jorge
7/6/1975 |
VELOSO, Caetano. Alegria, Alegria – Uma Caetanave organizada
por Waly Salomão. 1ª edición. Rio de Janeiro: Pedra Q Ronca Edições e
Produções Artísticas, 1977. 220 pág.
Pág. 147
FRANCHETTI, Paulo y PÉCORA, Alcyr. Caetano Veloso – Literatura Comentada. São
Paulo: Abril Educação, 1981. 114 pág.
Fotos da edição
Foto: Abril Press |
Foto: Abril Press |
Foto: Irmo Celso |
Foto: Arnaldo da Silva |
Textos: Pág. 37 / 38 / 39 / 40
de tentativa de simulação
de salada de treino de
sais eram (espelho) maresias
eram olhe (pés, mãos) onde anda
nada
do
ainda soam doen
no meu coração de poeta romântico
no meu coração de poeta romântico
antigo amor
(sempre entre o mar e aquilo que o mar espelha)
(sempre entre o mar e aquilo que o mar espelha)
as palavras
primeiro tentando
roubar os nomes às coisas, logo costurando-
se/os/as (oh meus
olhos estão acostumados e moverem-se horizontal-
mente por causa do
mar e da escrita, por exemplo).
contemplar aqui há milênios
amaranilanilinalinarama - troca
d'olho - amaré,
amarel anil: verde perto (o poeta augusto na pitu-
ba, fora da barra,
'69) há milênios sentemplar o perto e branco do pa-
pel um horizonte de
letras o horizonte das letras um horizonte de le-
tras o infinito
sempre continuado horizonte das letras mas a profun-
didade dos números
um horizonte superfície flor d'água de letras e a
profundidade
abissal dos números o vértice da poesia ah o vértice
da poesia é o
vértice da poesia que quero trazer para esta pá contu-
do o mesmo mar que
tudo contudo para esta o mesmo mar que tudo
espelha se espalha
(variante: o mesmo mar que tudo espalha se espel-
ha) nesta página do
meu repertório oiro repercutecute cinco letras
cinco - o vórtice
da poesia o antigo sonho de viagem dos poetas de
trazer
transparência fundura abismo adivinhação vertigem ao pa-
pel plano das
palavras escritas à horizontalidade morta das letras à
retilínea mudez delas
oh os poetas inventaram inventarão para sim
mesmos o mito de
que as assim palavras foram antes som de ser pa-
lavras - alma:
alga: lama mal amalgamada - som como a mágica
música som como a
alma do mundo que temos os olhos separados
dos ouvidos), velando
e revelando o talvez nome sem nome que as coi-
sas têm de nós
dentro:
evadeus se duma quando o céu todo se
desconstela diadão: é aqui
que s'urge o
personave freminino. ger'um dia. vem sanhassonhando,
cantarrolando
aurorabaixo, assabiando. andorindo, passarando pas-
so-perto.
- "à tarde, quando de volta da serra
com os pés sujinhos de terra
vejo a cabocla passar" –
- asparece o
presonagem maculino.
!- "as flores
vêm pra a beira do caminho pra
ver aquele jeitinho
que ela tem de caminhar"
rasto de gente
abaianada
- "e quando
ela na rede adormece
e o seio moreno
esquece de na camisa ocultar"
O dele olhar apenas
guimarãesroça (15) a dela epidorme.
- "à noite de
seus cabelos os grampos"
quando tudo
muricoça lagartrisca, sapode, tudo cobra, tudo
louva-deus, tudo,
deus pôs, maripousa borbolentamente.
- "somente com
o nome dela na boca
pensando nessa
cabocla
fica um caboclo
acordado."
essa angústia que o paralisava ao crepúsculo deve-se apenas ao fa-
essa angústia que o paralisava ao crepúsculo deve-se apenas ao fa-
to de ele ser o
personagem central deste livro. este livro é a maldi-
ção daquele menino
na medida em que é a salvação do seu autor.
ou:
morbia um cigarro num dos cantos da boca
enquanto palarvas es-
carriam pelo outro.
arredação, nojo ornamentiras - e aqui vai uma
homenagem ao meu amigo
e proeta michael chapman, gigante de
portobello, único
jornalista e único jornaleiro do “daily liar” -, em-
sourdescia aos
berros das palredes de exgosto, no dactilogro amado
ar falto do raio de
enganeiro. nesse mamento de glandeza, o nosso
pessonhagem se
esporrama na caldeira e pensa, tanaz: o brasil arde. R
eparaliza no olear
as duras únicas pernas da esgarrindo-se novisca
extasiária e fá-la:
deus te abençoe, minha filha. e trepois: ai minha
filha, ai minha
filha, ai minha filha. reticente-se cheio de vilhice,
fardigado estica os
suspensérios e quase escrouve: a moral brasilei-
ra vai ganhar muito
com isso. enquanto lá fora tarachimbunda a li-
xeiratura machonal.
(16)
(15) “guimarãesroça” é um trocadilho com o nome de um dos grandes
escritores brasileiros surgidos após o movimento modernista, o mineiro João
Guimarães Rosa, cuja criação, como se sabe, incidiu fortemente sobre o universo
rural doBrasil. Além dessa referência explícita a Guimarães Rosa, uma série de
outras “dissimulações” no texto acabam por remeter a ele. Como de outras vezes,
o desenvolvimento do discurso de Caetano realiza o seu próprio caminho através
de seguidas referências a outros discursos, mais ou menos facilmente indentificáveis.
(16) Verifique como este último parágrafo, em quase todas as suas
palavras alteradas, faz intervir imagens sexuais.
ENTREVAVISTA
a que você atribui
o fato de ter a opinião pública o distinguido?
- Meu pecado muito
originalquando eu nasci um anjo torto desses
uma pedra no meio do caminho
vai que é mole eu sou o lobo mau eu
sou o lobo mau eu sou o tal tal
tal tal tal (17) talvez quem sabe terei eu
apenas setenta centímetros de
altura faltame-há uma perna neste
país não meu filho né pois é né
será né meu coração vaga né pois é
né e diria inclusive aqui e
agora minha idade verdadeira né é né e
agora josé a minha idade
verdadeira é a idade da pedra polida e
pronto né de todas as minas de
bahias de onde venho assim
cansado de que marcha de que
samba das minhas minas bahias gerais de to-
das todos os meus amigos são
reencarnações de lampião de dom bos-
co de rodolfo valentino de
akenaton eu né eu não eu sou a reencar-
nação de um cujo nome não
consta homem neolítico e por isso.
você já viu algum disco voador?
- Só de fotografia.
o que acha do LSD?
- Certa feita eu tomei um LSD,
uns amigos vieram, eu tinha que
fazer essa experiência, eu
tomei um, cê sabe, achei uma boa droga.
que acha de Millôr Fernandes?
- Prefiro Nelson Rodrigues.
você assegura que esteve nos
aposentos do Papa Paulo VI?
- Y lo puedo probar. No tengo miedo de esos que no tienen el cora-
- Y lo puedo probar. No tengo miedo de esos que no tienen el cora-
ge de poner la cara. He dicho
que dormi con el Papa y lo pruebo. Por-
que yo tengo el corage de poner
la cara. Yo no soy un henano, soy
un niño. Para aquellos que
hicieron lo que hicieron con mi madre,
con mi madre, MI MADRE,
señores, no se puede hacer una cosa de
esas a una madre, para esos yo
ofresco mi deprecio. Algunos dicen
que yo soy comunista, que yo
soy un hombre de isqui-quierdas; pero
mi filosofia es la filosofia
pura, la filosofia del amor, de la sonrisa y
de la flor. Tampoco soy un
hippy o participo del movimiento de la bossa
nova. Soy un niño y soy
sociólogo sicólogo filósofo matemático místi-
co bailarino escritor dentistta
poeta y etc. etc. etc. No soy un henano
y no tengo miedo. Gracias,
Señor. (18)
você é antes de tudo um forte
ou não passa de um mestiço neurastê-
nico do litoral?
- O nosso machonalismo é merdavarelo e puti.
- O nosso machonalismo é merdavarelo e puti.
(17) As imagens do “anjo torto”
e da “pedra no meio do camino” remetem a dois dos mais conhecidos poemas de
Carlos Drumond de Andrade (a primeira imagem tendo sido inclusive retomada em
um poema de Torquato Neto, poeta fundamental no movimiento da Tropicália) As
imagens seguintes (“eu sou o lobo mau, eu sou o tal”) referem-se a uma das canções
de Roberto e Erasmo Carlos do tempo da Jovem Guarda, manifestação cuja importância
nos rumos da música popular brasileira Caetano jamais deixou de reconhecer.
(18) Neste trecho Caetano se
utiliza do castelhano, mas como você certamente notou esta não é a única língua
que ele va empregando ao longo dos seus textos. Procure discernir a função que
essa assimilação de línguas distintas, algunas vezes em uma mesma frase, pode
ter para o sentido geral destes textos.
Contracapa |
Novembro / 1985
[do livro Ivan Cardoso – O Mestre do Terrir, 2008]
Capítulo XIV
Navilouca – O Almanaque dos
Aqualoucos
Ivan
Cardoso
O Torquato Neto veio com a idéia de fazer a Navilouca em 1971. Ele convidou o Waly Salomão para ser o co-editor e me chamou para ser o fotógrafo. Foi outra coisa inesperada, porque eu não tinha experiência quase nenhuma. Já me garantia na fotografia, mas não era profissional, tinha apenas começado a me exercitar. A Navilouca teve grande importância porque reuniu os principais expoentes da vanguarda da época. Segundo o Décio Pignatari, foi a primeira publicação pop-construtivista feita no Brasil. Foi por causa da Navilouca que me aproximei do Luciano Figueiredo e do Óscar Ramos. O Luciano já morava na casa do Óscar, no Cosme Velho, onde foram feitas todas as reuniões editoriais e a programação visual da revista.
Todas as matérias são ilustradas com fotografias. Só não fiz as fotos do Chacal, do Steve Berg, do Caetano Veloso (que não estava no Brasil) e do próprio Torquato. As fotos da Lygia Clark e a do Hélio Oiticica foram feitas pelo Eduardo Clark, filho da Lygia. O resto das fotos todas, incluindo as da capa, eu que fiz. No final, tentava até me esquivar de tirar essas fotos, porque já tinha feito demais. A editora da Navilouca me pagou um viagem a São Paulo, para fotografar os irmãos Campos e o Décio Pignatari. Essa foto ficou famosa porque foi um remake, feito vinte anos depois, de uma foto importante que havia saído na revista Noigandres. A Ana Araújo, mulher do Torquato, sempre disse, em tom de brincadeira, que a Navilouca era um álbum de figurinhas do Ivan Cardoso.
Como o Torquato convenceu o Lúcio Abreu, dono da Gernasa, a editar a Navilouca é que eu não sei. São coisas misteriosas. Depois o projeto da revista ficou encalhado por um longo período. O Lúcio, que era amigo do Torquato dos tempos do Partidão, foi atropelado e isso degringolou o negócio. O projeto da revista só foi retomado após a morte do Torquato e a Navilouca foi lançada em julho de 1974 – com recursos da Polygram, conseguidos graças a influência do Caetano Veloso.
Impulsionado pela repercussão da Navilouca e da série Quotidianas Kodaks, minha carreira como fotógrafo foi meteórica. Fui do zero ao zênite, num piscar de olhos. Havia me tornado um artista da moda. Logo em seguida a Navilouca, fiz fotos que foram capa de alguns discos importantes: o LP Fatal, álbum duplo ao vivo lançado pela Gal Costa; o primeiro disco do Jorge Mautner; e o Araçá Azul, do Caetano Veloso – que considero um dos meus melhores trabalhos para capa de disco. Também fiz as fotos de capa para o primeiro livro do Waly Salomão (o Me segura que eu vou dar um troço); para a antologia póstuma do Torquato, chamada O últimos dias de Paupéria; e para o livro Xadrez de Estrelas, do Haroldo de Campos.
Além das cinqüenta e quatro fotos minhas que ilustram praticamente toda Navilouca, o Torquato ainda incluiu, na contracapa da revista, a reprodução de um trabalho de artes plásticas que eu fazia. Na época, eu enchia uns pratos com tinta óleo vermelha e esperava secar. Quando a tinta secava, formava uma espécie de nata na superfície. Eu pintava o prato todo de preto e, depois, passava uma gilete para deixar a tinta vermelha escorrer. Era uma coisa que remetia, de certa maneira, ao filme do Buñuel. Apesar de ser uma coisa ligada as artes plásticas, o prato que aparece na contracapa da Navilouca foi feito especialmente para a abertura do Nosferato do Brasil. O Hélio achou aquilo o máximo. Foi uma coisa que também foi respaldada pelos poetas concretos.
A Navilouca também está repleta de anúncios e textos que promovem os meus filmes Super 8. Tem dois textos do Oiticica sobre o Nosferato do Brasil e os cartazes do Nosferato e do Sentença de Deus. Na minha parte tem também duas páginas dedicada aos Ivamps. A revista foi feita sem a menor preocupação com custo. Cada um fazia a sua matéria do tamanho que queria. Na Navilouca, as coisas eram feitas, ao mesmo tempo, com muito e nenhum critério. Para você entrar na revista tinha que ser amigo do Torquato ou do Waly.
Tirei todas as fotos de graça, nem os filmes me pagaram. Aliás, ninguém recebeu nada. Esse era um problema que me assombrou durante muitos anos. Até O Segredo da Múmia não ganhei dinheiro com cinema. Quer dizer, depois da fase do Super 8, inventaram uma lei de obrigatoriedade para o curta-metragem e acabei ganhando algum dinheiro. Mas o ato de filmar, para mim, foi sempre por amor ao cinema, por amor à arte. Nos Super 8 então, todo mundo trabalhava de graça mesmo. As pessoas se sentiam participantes daquele movimento e colaboravam para que aquilo desse certo.
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