domingo, 15 de diciembre de 2024

2024 - CAETANO&BETHÂNIA - Turnê

 

Agenda 2024


3, 4, 10 e 11 de agosto: Rio de Janeiro (Farmasi Arena)

7 de setembro: Belo Horizonte (Estádio Mineirão)

21 de setembro: Curitiba (Pedreira Paulo Leminski)

28 de setembro: Belém (Estádio Mangueirão)

25 e 26 de outubro: Recife (Classic Hall)

9 de novembro: Brasília (Arena BRB Mané Garrincha)

16 de novembro: Fortaleza (Arena Castelão)

30 de novembro: Salvador (Casa de Apostas Arena Fonte Nova)

14, 15 e 18 de dezembro: São Paulo (Allianz Parque)

 

Agenda 2025


8 de fevereiro - Salvador (Casa de Apostas Arena Fonte Nova)

15 de março: Rio de Janeiro (Farmasi Arena)

22 de março: Porto Alegre (Arena do Grêmio)



14 de março de 2024

Sobre a turnê Caetano&Bethânia

Claudio Leal

 

A turnê Caetano & Bethânia tem um significado especial para a música popular brasileira, para a história dos dois irmãos e para os fãs que sonham em vê-los em um só espetáculo. Nascidos em Santo Amaro, no recôncavo baiano, Caetano Veloso e Maria Bethânia são reconhecidos como artistas essenciais à formação cultural de várias gerações, com trajetórias projetadas para além da música, inspirando criadores em todas as partes e em todas as artes. 

Esse reencontro histórico em arenas do país permite a cada espectador uma visão ainda mais clara da força criadora de Caetano e Bethânia, unidos desde a infância pela memória de canções. Na família Veloso, falou mais alto a sugestão de Caetano para o batismo da irmã como “Maria Bethânia”, nome extraído de uma música de Capiba cantada por Nelson Gonçalves.

A voz de Bethânia seria um dos motores da entrega de Caetano à vida de compositor. A história dessa partilha musical se iniciou há 60 anos, no show “Nós, por exemplo”, no Teatro Vila Velha, em Salvador, em 1964. Ainda muito jovens, numa fase de revelação de caminhos para a música brasileira, eles surgiram como artistas inseparáveis de sua geração, no meio do agito das artes na capital baiana, ao lado de Gal, Gilberto Gil, Tom Zé, Roberto Santana, Alcyvando Luz, Djalma Corrêa, Fernando Lona, Piti e Perna Fróes. Bethânia despontava, porém, como uma cabeça acima de movimentos, determinada a criar um projeto estético fiel às suas paixões musicais profundas. Antes e depois do tropicalismo, Caetano seria um tradutor fraterno dessa poética. 

Com a mudança de Santo Amaro para Salvador, em 1960, os irmãos se tornaram cúmplices nas descobertas de uma grande cidade, da literatura de Clarice Lispector e de seus destinos artísticos. Juntos, experimentaram o teatro, a música e o cinema. Caetano era então o guia urbano de Bethânia, ainda saudosa da vida e da alma santamarenses. Em sua ida para o Rio de Janeiro, onde substituiu Nara Leão no espetáculo Opinião em 1965, Bethânia viajou acompanhada de Caetano, atendendo ao pedido do pai, José Telles Velloso. O sucesso da cantora teria consequências na história da música popular e no desenvolvimento das carreiras de Caetano, Gal e Gil. 

Aos 18 anos, ela avisou ao irmão que dali para frente definiria sozinha seu rumo no mundo. Mas, desde então, suas trajetórias artísticas não deixaram de estar entrelaçadas. Caetano compôs mais de 30 canções para gravações originais de Bethânia, pensando no alcance de sua voz e em sua presença cênica. Ainda na juventude, esse arco de belezas envolveu “Sol Negro” (em duo com Gal Costa) e “De Manhã” e se desenvolveria em joias como “Gema” e “Reconvexo”, um hit da “destemida Iara”. 

Mesmo canções registradas pelo próprio Caetano ganharam versões de forte marca autoral de Bethânia, como “Tigresa”, “O Ciúme” ou “Sete Mil Vezes”. Em “Um índio”, nos Doces Bárbaros, a cantora reivindicou para si a utopia indígena de Caetano. Não à toa, o escritor argentino Julio Cortázar suspeitava que os dois irmãos eram uma só pessoa. 

Em seis décadas de carreira, Caetano e Bethânia sustentaram um pacto artístico silencioso, uma identidade atemporal que aflorou em momentos decisivos: no álbum “Drama” (1972), produzido por Caetano, relevante para seu aprendizado em estúdio no retorno do exílio; na formação do grupo Doces Bárbaros, em 1976, quando Bethânia aglutinou seus manos baianos; no show que virou disco ao vivo, em 1978; em duos pontuais em suas discografias e – impossível esquecer – nas festas familiares no quintal de dona Canô, em Santo Amaro. 

Além de fazer letras, por vezes incorporando frases literais de Bethânia (“Baby” nasceu assim), ele também vestiu com melodias os poemas de Waly Salomão destinados à Abelha-Rainha. Com ela, aprendeu a amar a jovem guarda de Roberto Carlos. Esse elo musical e existencial ganhou um sentido elevado em tempos sombrios. No exílio em Londres, em 1971, Caetano cantou para o Brasil: “Maria Bethânia, please send me a letter”. Na pandemia, como mensagem contra a tristeza repentina do mundo, a irmã sugeriu que ele cantasse “Noite de Cristal”, que clama por “dias de outras cores”. A canção entraria no álbum “Meu Coco”, de 2021. 

A identificação mútua originou pontos brilhantes na criação do compositor, que chegava a traduzir melhor suas próprias emoções a partir da presença dramática da irmã. Caetano tem sido um decifrador do mito artístico de Bethânia dentro e fora dos palcos. Nessa linhagem de canções, podem ser lembradas “Drama” (“minha voz soa exatamente/ de onde no corpo da alma de uma pessoa/ se produz a palavra eu”), “Tapete Mágico” (“no palco Maria Bethânia desenha-se todas as chamas do pássaro”) e “Motriz”, em que ambos celebram a voz da mãe, Canô, como a matriz de um dom (“em tudo a voz de minha mãe/ e a minha voz na dela”). Em “Vaca Profana”, a irmã é sinônimo de intensidade amorosa: “Quero que pinte um amor Bethânia”. 

Em outros momentos, seus projetos artísticos levaram para o mundo os amores, as festas, as alegrias e as dores dos nascidos em Santo Amaro. Em “Purificar o Subaé” (1981) os irmãos cantaram pela salvação do rio de sua aldeia, falando em nome de todos os rios de todas as aldeias. 

Fiel a uma história de tantos desejos, a turnê Caetano & Bethânia vai apresentar em todas as regiões do país a eternidade poética de duas vozes que nos ajudaram a viver, mudar e pensar nosso tempo. A festa, a devoção, o canto de Canô, a dança do irmão Rodrigo Velloso, o som do Recôncavo, o samba da Mangueira, Gal, o raio de Iansã, alto astral, lindas canções: Caetano & Bethânia.

 


14 de março de 2024


Allianz Parque, São Paulo 

Caetano&Bethânia

Claudio Leal


O show “Caetano & Bethânia” significa uma conquista geracional e uma renovação da presença dos irmãos nos palcos. Estrelas da constelação surgida nos anos 1960, Caetano e Bethânia preservam uma inteligência poético-musical de encher olhos e estádios, com domínio do pensamento e da performance de alcance popular, sem confrontos com vertentes mais recentes do pop. Caetano, aos 82 anos, e Bethânia, aos 78, estão no palco como artistas únicos que simbolizam a história coletiva de uma geração singular na música moderna.

É importante olhar Caetano enquanto Bethânia canta. A expressão cênica de Bethânia, rara cantora a produzir marcos no teatro brasileiro (“Rosa dos Ventos”, “Drama”, “A Cena Muda”), não é nenhum segredo. Mas, aqui, ela atinge uma dimensão inédita. A cantora-atriz essencializa os gestos, para se projetar no espetáculo audiovisual, e preenche os estádios com a sua voz. Tornou-se assim a nossa mais expressiva atriz de multidões, sensual e trágica. Pensei num instante maluco: Bethânia é a realização da utopia do “teatro de estádio” de Oswald de Andrade e Zé Celso. Olhei Caetano e percebi que, ao contemplar a irmã, ele parecia pensar sobre o mito teatral de Bethânia. Caetano pode ter instantes malucos no meio de cenas grandiosas. 

O roteiro incorpora núcleos e motivos familiares expandidos em leituras multiculturais do Brasil. Tudo é uma questão pessoal. Nada é só uma questão pessoal, e o show se abre a visões panorâmicas. Os irmãos saem de uma cidade de interior (“Motriz” e “Não identificado”), celebram as religiosidades, alcançam a “Tropicália” e chegam ao pessimismo de “Marginália II”, de Gil e Torquato (“aqui é o fim do mundo”). O imaginário religioso não se restringe a igrejas e terreiros, e há espaço para o sebastianismo de “Um Índio”, crença mais oculta. O samba de roda do recôncavo, introduzido por “13 de Maio” no segmento inicial, surge como uma versão amplificada dos aniversários de outro irmão, o festeiro Rodrigo Velloso, no quintal da casa de Santo Amaro.

O show cruza as trajetórias dos irmãos e clareia os caminhos pessoais, representados também pelas canções de sucesso radiofônico, que demonstram a complexidade da vida comercial de ambos. 

A junção de “Fé” e “Reconvexo” foi uma sábia reunião de duas canções nascidas da ira, afirmativas de sensibilidades brasileiras inspiradas pelo sagrado e profano. Além disso, as cidades e as irmandades da alma: Rio-Mangueira, Bahia e Sampa-tropicalismo; Gil e Gal. No figurino, os orixás.

Caetano cria o ponto de tensão do show. Na hora do louvor evangélico “Deus Cuida de Mim”, a plateia é menos acolhedora e conversa fiado. Embora o crescimento de igrejas neopentecostais me preocupe mais em uma perspectiva pessimista, reconheço sua coragem de enfrentar o próprio público, de inocular a dúvida e a dissonância, como “agent provocateur”. Para Caetano, espetáculos dessa envergadura não fazem sentido sem esse grão de sal. Na turnê com Gil, “As Camélias do Quilombo do Leblon” cumpriu um papel análogo. Contestador ou contestado, ele continua a ser a mais influente inteligência artística do país. 

“Caetano & Bethânia” é o mundo que uma família pode absorver, expandir e cantar.

 


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