domingo, 28 de enero de 2024

1996 - 3° PANORAMA PERCUSSIVO MUNDIAL - PercPan

 

Organizado por Gilberto Gil e Naná Vasconcelos.

Gal Costa, Elza Soares e D. Ivone Lara no Festival de Percussão em Salvador.





29/3/1996 - Foto: Adenor Gondim





São Paulo, quinta-feira, 28 de março de 1996

PercPan cultua o samba do planeta

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA


Tambores africanos e brasileiros procuram uma língua comum, no show de abertura do 3º Panorama Percussivo Mundial, hoje à noite, em Salvador, Bahia.

Até sábado, o tradicional Teatro Castro Alves receberá atrações nacionais e estrangeiras, com destaque para o percussionista senegalês Doudou N'Diaye Rose, que toca pela primeira vez no país.

A abertura desta noite também promete uma rara atração. Dividindo a direção artística do evento, Gilberto Gil e o percussionista Naná Vasconcelos vão reeditar uma parceria que não acontecia desde o verão de 1973, quando Gil acabara de voltar do exílio em Londres.

"É uma alegria incrível poder tocar de novo com o Gil", comemora o percussionista pernambucano, que se mudou para os EUA logo após o primeiro encontro.

Depois de coordenar o PercPan do ano passado, Naná sentiu necessidade de uma edição um pouco mais voltada para a música brasileira. Já com o auxílio de Gil, escolheu para 96 o mote "Samba da Minha Terra", emprestado do clássico samba de Dorival Caymmi.

"Esse verso de Caymmi é bastante amplo para englobar a idéia de um samba do planeta, o samba de várias terras", explica Gil.

"No Senegal, você tem o 'sabá', um ritmo com o mesmo significado do samba. Foi com ele que Doudou compôs o hino nacional do seu país. Já na Nigéria, você encontra o 'juju' ", compara Naná.

Segundo o percussionista, o festival terá várias surpresas. A começar da canção, ainda sem título, que Gil acabou de compor e deve ser exibida amanhã, no segundo show da dupla. "É algo na linha de 'Filhos de Ghandi', mas com a minha levada", adianta Naná.

Surpresas também não devem faltar durante a noite de encerramento, no sábado, quando Naná e Gil pretendem provocar encontros dos músicos estrangeiros com os brasileiros, sem ensaios prévios.

Além de Doudou Rose, o elenco internacional tem mais destaques. Originário da ilha de La Reúnion (próxima a Madagascar), o africano Granmoun Lélé é autor de mais de 200 canções e também estréia em palcos brasileiros.

Já o norte-americano Glen Velez é um compositor e professor de formação erudita que se especializou em instrumentos de percussão, especialmente alguns semelhantes ao pandeiro, encontrados no Marrocos, na Argélia e na Índia.


Presença feminina


Naná diz estar satisfeito por poder realizar um festival com forte presença feminina.
 

Além das cantoras Gal Costa, Elza Soares e Dona Ivone Lara, também participam do elenco dois jovens grupos femininos de Salvador: o Bolacha Maria (formado por Carlinhos Brown) e o Didá (criado por Neguinho do samba, do Olodum).

Preocupado com o problema da educação musical, Naná fez questão de incluir dois grupos formados por crianças: o carioca Herdeiros da Vila Isabel e o pernambucano Maracatu Nação Erê. "O festival pode ajudar a abrir a cabeça dessa garotada, que é o futuro da música", diz.

O elenco brasileiro se completa com o grupo instrumental mineiro Uakti, que costuma utilizar instrumentos artesanais feitos com tubos de PVC, vidro e outros materiais.

Naná não quer perder a chance de iniciar uma parceria com os mineiros. "Também vou tocar alguma coisa com eles", promete.

Os workshops promovidos pelo festival com os artistas do elenco acontecem pelas manhãs e à tarde, até amanhã, no Castro Alves.




São Paulo, segunda-feira, 1 de abril de 1996

Ivone Lara rouba a noite em Salvador


CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM SALVADOR


A sambista carioca Dona Ivone Lara foi a atração mais aplaudida na segunda noite de shows do Percpan (Panorama Mundial de Percussão).

O festival vem sendo realizado no Teatro Castro Alves, em Salvador.
Com uma bela seleção de sambas, variando entre o partido alto e o pagode, Dona Ivone mostrou que as verdadeiras raízes desse gênero já estão bem distantes do samba plastificado que se ouve atualmente nas rádios.
Arrancando gritos, cada vez que exibia seu rebolado na boca do palco, a veterana sambista fechou o show com "Sonho Meu", senha para a entrada de Gal Costa.

Carisma de Gal

Em uma participação muito curta, mas com o carisma de sempre, Gal cantou uma seleção de sambas-de-roda, incluindo "Remelexo" e "Marinheiro Só". Deixou a platéia pedindo mais.

Acompanhando Gal, o grupo feminino Bolacha Maria também agradou com suas fusões de rap, repente, hip-hop e forró.

É mais uma invenção do explosivo Carlinhos Brown, com boas chances de extrapolar a cena pop baiana.


Granmoun Lélé

Outra esperada atração da noite foi o percussionista Granmoun Lélé, da ilha da Reunião (na costa oriental da África).
Seu grupo hipnotizou a platéia com ritmos e danças frenéticos, que foram proibidos durante séculos pelos colonizadores franceses.
Já o norte-americano Glen Velez, especialista em pandeiros de vários cantos do mundo, não chegou a entusiasmar, com três improvisos um tanto monótonos.
Simpáticos, os garotos do Maracatu Nação Erê (de Pernambuco) acabaram ficando mais tempo no palco do que o necessário. Precisam de mais vivência musical.


Primeira noite

O 3º PercPan foi aberto na quinta-feira à noite, com os Herdeiros de Vila Isabel, jovens ritmistas cariocas dirigidos por Armando Marçal.

Também se apresentaram Elza Soares e o Didá, grupo de garotos que combina percussão, vocais e coreografia africana.

Outra atração foi o trio mineiro Uakti e, em seguida, o senegalês Doudou N'Diaye Rose, acompanhado por 15 percussionistas.

Antes mesmo da última noite do PercPan, que prometia para sábado um encontro de todas as atrações exibidas quinta e sexta, já era possível reconhecer o sucesso desta edição.


Público mais amplo

Naná Vasconcelos e Gilberto Gil acertaram ao abrir mais o leque sonoro da programação, elegendo o tema "Samba da Minha Terra".

Esse recurso estratégico permitiu que um público bem mais amplo, embora atraído pelos vocais de Gal Costa, Dona Ivone Lara e Elza Soares, pudesse também entrar em contato com a arte de grandes percussionistas.

Foi exatamente isso que se viu no Castro Alves: um público respeitoso e sem preconceitos, curioso por culturas diferentes da sua.

O 3º PercPan provou que, neste final de século, os purismos musicais não levam a quase nada. É um festival que tem tudo para continuar. E que já poderia pensar em atingir outras capitais do país.






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