João
Lutfi [Marília, 18/6/1932 - Rio de Janeiro, 23/7/2020], músico, compositor, cantor, ator e diretor de cinema.
“Adoro Sérgio Ricardo desde o final da adolescência.
Principalmente "Este nosso olhar" e "Pernas" (que, para meu
deslumbre, reouvi na voz de minha irmã Maria Bethânia em seu show mais recente). João Gilberto cantava lindamente
a primeira, mas não a gravou (e deixou de cantá-la cedo) por causa da palavra
"veneno". Era uma recusa estética que soava como uma superstição. Nós
conhecíamos (e amávamos) o Sérgio do LP "A Bossa Romântica de Sérgio
Ricardo". Anos depois, ele estava cantando "Se entrega,
Corisco" e "Manuel e Rosa viviam no sertão / Trabalhando a terra / Com as
próprias mão / Até que um dia, pelo sim, pelo não / Entrou na vida deles / O Santo
Sebastião", e mais "Antônio das Mortes, matador de cangaceiro" e
outros versos ao violão por trás das imagens de Deus e o Diabo na Terra do Sol,
filme de Glauber Rocha, núcleo do átomo do Cinema Novo. Entre a bossa romântica
e esses cantos épicos, estava João Gilberto, que foi quem levou Sérgio ao
marxismo. Sem a intuição profunda (e o conselho) de João, talvez não tivéssemos
"Zelão" nem "Beto bom de bola" nem "O diabo de Lampião".
As bossas e os sambas-canções do começo, no entanto, já bastariam para fazer de
Sérgio Ricardo um gigante.”
[Caetano Veloso, 23/7/2020, Facebook]
PERNAS
Sérgio Ricardo
1960
Sinal verde
Atravessar
pra lá do sol
Triste
o sol
e
uma tristeza em mim,
porém
Surge
ao sol da tarde
Um
par de pernas lindas
Leva
a dona delas
meu
olhar atrás
Meu
bom senso não quer
me
permitir palabras
Sem
que seu olhar
Me
lance uma esperança
O
calor do sol
vem
me inspirar ternuras
por
aquelas pernas
para
a dona delas
Eis
que uma buzina conversível
Chama
para o conforto
as
pernas lindas
belas
como a tarde
vão
se pondo
E
eu devolvo ao sol
A
inspiração
Luz
vermelha no sinal do sol pra mim
Perigoso atravessar pra lá do sol.
Perigoso atravessar pra lá do sol.
1967
1968
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