martes, 1 de mayo de 2018

2015 - ROGÉRIO DUARTE - O TROPIKAOSLISTA



"Rogério Duarte foi uma das pessoas mais importantes na minha formação pessoal, intelectual e estética"

[Caetano Veloso]



02/11/2015

Filme sobre baiano Rogério Duarte tem estreia mundial em Salvador

Exibição ocorre nesta segunda-feira durante XI Panorama Coisa de Cinema.

Sessão será seguida por conversa com diretor no Espaço Glauber Rocha.


Do G1 BA

Filme sobre multiartista baiano Rogério Duarte será exibido nesta segunda-feira
Foto: Natália Reis / Divulgação

O documentário Rogério Duarte, o Tropikaoslista, de José Walter Lima, terá a primeira exibição mundial nesta segunda-feira (2), às 20h30, no Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha, em Salvador. A sessão integra a programação do XI Panorama Internacional Coisa de Cinema e será seguida de bate-papo com o diretor.

A estreia tem significado especial, pois o complexo de cinemas tem na fachada uma das criações mais conhecidas e reconhecidas do artista, a rosácea concebida para o cartaz do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha.

Sinopse

O filme retrata a trajetória de uma das figuras seminais das artes e do pensamento brasileiro dos últimos 50 anos. Um dos criadores do Tropicalismo, Rogério sempre esteve por trás - e sempre à frente - de tudo que havia de mais moderno e contemporâneo na cultura brasileira nas décadas de 1960 e 1970. É como disse Glauber Rocha a Caetano Veloso, em certa ocasião: Não esqueça Caetano, que por trás de todos nós está Rogério Duarte.


Serviço

Exibição do documentário "Rogério Duarte, o Tropikaoslista"

Quando: 2 de novembro (segunda-feira)
Horário: 20h30
Quanto: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia)
Onde: Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha (Salvador)




Documentário fecha a segunda temporada do Cineclube Walter da Silveira, com sessão gratuita às 17h


“Rogério Duarte, o Tropikaoslista” terá sessão sábado, na Sala Walter da Silveira (Salvador)

Dezembro 15, 2016
Por Kátya Elpydio

Com a aproximação das comemorações dos 50 anos do Tropicalismo, a Sala Walter da Silveira vai receber, no seu último Cineclube do ano, no dia 17 de dezembro (sábado), o documentário Rogério Duarte, o Tropikaoslista, às 17h, com entrada franca para o público. A sessão também vai contar com um bate-papo entre o realizador do documentário, Walter Lima, e o músico Paquito, com mediação do ator e diretor da Diretoria de Auviovisual (Dimas) da Funceb, Bertrand Duarte.

O gestor explica que o documentário narra a história do grande design e um dos protagonistas e mentores da Tropicália, polifórmico e universal, segundo o próprio Rogério, que, “em diálogo com parceiros como Chico e Caetano, tornou-se o grande esteta da Tropicália, criando de capas de álbuns antológicos a cartazes de filmes como o de Deus e o diabo na terra do sol, de Glauber Rocha”.

Bertrand comenta que, apropriando-se da receita antropofágica de Owald de Andrade, o Tropicalismo quebrou paradigmas, devorou guitarras elétrica do rock e as temperou com as raízes das tradições nacionais, resultando num poderoso eco e conquistando o Brasil, apesar da ditadura militar. “Com o enunciar dos seus 50 anos de história, além daqueles que ocuparam o proscênio e que já reconhecemos o seu brilho e talento, outros personagens contribuíram essencialmente para a sua formação”, considera.
E é com espírito de bandeirolas e cordões que este último Cineclube Walter da Silveira exibe o filme que conta as andaças de um navegante atrevido, que confunde-se com o maior movimento musical brasileiro após a Bossa Nova, conclui o diretor da Dimas. “É proibido proibir, e salve Rogério Duarte!”

Sobre o projeto – O Cineclube Walter da Silveira exibiu 11 clássicos do cinema de oito nacionalidades diferentes, desde julho de 2015, contemplando a obra de uma dezena de grandes cineastas, reunindo um público de quase mil pessoas na Sala Walter da Silveira, tradicional sede das exibições.
O Cineclube é um projeto de difusão e formação desenvolvido pela Diretoria de Audiovisual (Dimas), da Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB), entidade vinculada à Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SecultBA).  

Rogério Duarte, o Tropikaoslista (BRA, 2015)
Direção: Walter Lima
Duração: 90 minutos
Classificação: 14 anos

Sinopse – Rogério Duarte é um dos nomes mais importantes da Tropicália, movimento cultural brasileiro da década de 60. O artista plástico foi um dos primeiros a denunciar publicamente as torturas cometidas no regime militar. Durante a ditadura, a sua atuação política e seus feitos culturais mobilizaram muitos artistas e inspiraram toda uma geração.
Serviço:
Cineclube Walter da Silveira
Quando: 17 de dezembro (Sábado), às 17h
Onde: Sala Walter da Silveira (Rua General Labatut, 27 – Barris)
Ingresso: Entrada franca
Debate após a sessão com o realizador do documentário, Walter Lima, e o músico Paquito. Mediação: Bertrand Duarte.


2016 - Edgard Navarro e José Walter Lima - Foto: Facebook



ROGÉRIO DUARTE, O TROPIKAOSLISTA





Sábado, 24 de junho de 2017
17h30 –
Debate com o diretor José Walter Lima

Documentário de longa metragem que investiga a vida e obra de Rogério Duarte tentando encontrar o cara que está por trás do personagem.

O documentário tem como objetivo retratar a trajetória de uma das figuras das artes e pensador brasileiro mais seminais dos últimos 50 anos.

Músico, compositor, artista gráfico, um dos criadores do Tropicalismo, Rogério sempre atrás – e sempre à frente – de tudo o que era mais moderno e contemporâneo na cultura brasileira nos anos vitais de 1960 e 1970. Como Glauber Rocha disse a Caetano Veloso em uma ocasião: “não se esqueça que por trás de todos nós existe Rogério Duarte”.

Com:
Caetano Veloso, Gilberto Gil, Paquito, Carlos Rennó, Armandinho , Luiz Caldas e Diogo Duarte.

FICHA TÉCNICA
– Direção: José Walter Lima
– Roteiro: José Walter Lima e Roberto Torres
– Direção de Fotografia: Pedro Semanovschi
– Montagem: Bau Carvalho


2016 | 87 min. | cor | documentário | DCP | legendas em francês









26/4/2018



O ESTADO DE S.PAULO


Rogério Duarte é tema do belo e revelador documentário ‘Tropikaoslista’
Crítico mais feroz do tropicalismo viveu em uma espécie de exílio dentro de seu próprio país desde que resolveu romper com a própria via marginal que ajudara a criar na contracultura
Julio Maria, O Estado de S. Paulo
29 Abril 2018 | 06h00


O filho de Rogério Duarte foi quem deu o primeiro sinal. Ao encontrar o cineasta José Walter Lima em um supermercado, foi direto. “Meu pai está morrendo. Faça alguma coisa por ele.” Walter Lima fez então o que poderia fazer de melhor. Seu filme sobre a vida do tropicalista mais marginal da história, um homem tão à frente de seu tempo que o tempo de hoje ainda não o alcançou, ficou pronto a tempo de ser mostrado para o próprio personagem. A primeira sessão caseira foi marcada para um 2 de novembro, Dia de Finados.

“Eu não vou”, respondeu Duarte. “Vocês estão querendo me matar antes da hora.” Ele já sentia o tempo acabando, vítima de um câncer que o corroía lentamente. A exibição foi marcada então para um mês depois. Rogério Duarte assistiu ao filme com atenção e não fez nenhum grande comentário. “Ele não disse que gostou”, recorda o diretor. No dia 14 de abril de 2016, aos 77 anos, a história do baiano de Ubaíra, desenhista, músico, escritor e designer gráfico, chegava ao fim.

Rogério Duarte. Pensamento veloz não era entendido mesmo por parceiros
Foto: 02 FILMES

O filme de Walter Lima o reconstrói para uns e o ergue para a maioria. Rogério Duarte viveu em uma espécie de exílio dentro de seu próprio país desde que resolveu romper com a própria via marginal que ajudara a criar na contracultura. A Tropicália, para ele, não passou de um belo esboço de resistência e chamamento à transformação, iniciada por ele e Hélio Oiticica e desvirtuada a partir do momento em que Gil, Caetano, Mutantes e outros figurões não percebem estar se tornando parte do mainstream.

Esvaziada de seu conteúdo político original, a Tropicália se torna um adorno estético que serviria muito bem à carreira desses músicos e às suas respectivas gravadoras.

Ele não diz claramente nada disso que está posto no parágrafo acima, mas nem tudo se trata de liberdade interpretativa do repórter. Duarte é delicado com o tema, porque Gil e Caetano serão seus amigos até a morte. Na última terça (24), Gil disse o seguinte: "Rogério foi meu amigo, meu parceiro, fizemos muitas coisas juntos, tivemos, ao longo de muito tempo, especulações compartilhadas sobre o mistério da vida, sobre Deus, sobre as religiões e o papel delas no mundo. Rogério foi um grande parceiro.” Os dois, Gil e Caetano, aparecem cantando no filme em sua homenagem.

Eles não dão depoimentos, mas quase ninguém dá. Essa foi uma opção do diretor. “Eu não queria fazer um filme como se fazem todos os documentários. Deixei que apenas Duarte falasse.”

“Ele diz que a Tropicália era mais contundente no início, com Oiticica”, lembra Walter Lima, que foi amigo do artista por anos. No filme, Duarte diz que algumas ideias do tropicalismo foram simplesmente abandonadas, como o figurino, que seria desenhado por Lina Bardi. “O Guilherme (Araújo, empresário de Gil e Caetano nessa época) comprava roupas em Londres, na Carnaby Street, e acabou ‘beatinizando’ o tropicalismo”, ele diz, na crítica mais contundente já feita sobre o movimento (o beatinizando vem de Beatles mesmo). “Na medida em que o establishment reincorporava o tropicalismo e o colocava a seu serviço, eu disse: ‘Estou fora’.”

Duarte, um comunista de convicção entre 1962 e 1964 (“até o dia em que veio a realidade e acabou a magia”), acabaria sendo preso e torturado. Seria o primeiro, junto ao irmão Ronaldo, a fazer denúncias com relação aos militares. Antes disso, já despontava com sua genialidade gráfica. Durante um debate com influentes pensadores, dentre eles Caetano Veloso, Hélio Oiticica e Ligia Pape, pediu a palavra para atiçar combustível em uma fogueira. “Vocês estão aí falando de arte, pintura, sei lá o quê. Mas ninguém precisa ir ao museu para ver arte não. Vá até o túnel novo e veja lá o grande anúncio de alistamento militar que foi borrado por um cara que jogou uma lata de tinta vermelha sobre ele.” A discussão esquentou pelo viés político, e Duarte provocou ainda mais. Ele não queria discutir ideologia, mas estética, forma, cores, intervenção. Poucos acompanhavam a velocidade de seu raciocínio.

Em outro momento, se voluntariou para experimentos com LSD. Ao chegar diante de um médico, o doutor o mediu e logo deu o diagnóstico. “Você não. Se você tomar, não volta.” A loucura se manifestaria na solidão. Ao sair da prisão, depois da tortura, ele se lembra – mas o filme não se alonga no assunto – dos dias em que ninguém queria saber de sua companhia por medo de ser associado a um nome subversivo. “Ninguém mesmo”, reforçou. Foi quando pirou. Anos mais tarde, viria a doença, e sua abordagem sobre esse último episódio da vida é, de novo, único. “A doença me curou”, dizia. Foi ali que repensou sua relação com o tempo e parou para poder fazer o que gostava. “Comecei a fazer músicas e registrei umas 200 no meu computador.”


Feitos de Rogério Duarte

Anos 1960
Deixa a Bahia, segue para o Rio de Janeiro e começa como aprendiz de Aloisio Magalhães.

1962
Passa a ser integrante do Partido Comunista e se torna coordenador do CPC como militante. 

1964
Assina o cartaz do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol. Sua arte se torna símbolo do cinema nacional à época e do início da era da pós-modernidade. 

1965
Além de se tornar amigo de Glauber Rocha e de se apaixonar por sua irmã, a atriz Anecy Rocha, passa a conviver com músicos, artistas plásticos e outros cineastas. Faz capas de discos históricos para Caetano Veloso, Gilberto Gil e Jorge Mautner.

2016
Morre de câncer em Brasília.




O GLOBO

ROGÉRIO DUARTE - O TROPIKAOSLISTA 



POR RUY GARDNIER

25/04/2018







Rogério Duarte é uma figura fundamental para a arte brasileira dos anos 60 e 70. Sua trajetória é colada a gênios dos diversos campos artísticos revolucionados com a voracidade oswaldiana do tropicalismo. Como artista gráfico, fez o antológico cartaz de “Deus e o diabo na terra do sol” e algumas das capas mais bonitas da música brasileira (“Cantar” de Gal Costa, “Qualquer coisa” de Caetano, diversas para Gilberto Gil), além de ser amigo e parceiro criativo de Hélio Oiticica, Glauber Rocha, Caetano, Gil e muitos outros. Em seu percurso de vida, foi preso e torturado pela ditadura militar, abraçou a religiosidade do Bhagavad Gita (que traduziu para o português do sânscrito), foi professor na Universidade de Brasília e fazendeiro no interior da Bahia.

O mérito e o demérito de “Rogério Duarte — O tropikaoslista” é tentar dar conta de todo esse percurso multifacetado. Não aparece apenas o Rogério Duarte da junção do design com a arte de vanguarda, ou da concepção, da execução e da cumplicidade na criação das principais obras do tropicalismo, mas também o homem de fora dos holofotes, do fazendeiro que não devasta os recursos naturais e do professor que se gaba de ter ficado craque em produção cultural na UnB. Essa aposta faz com que o espectador obtenha uma espécie de “Rogério Duarte por inteiro”, e isso cria amplidão de olhar para avaliar suas ideias e seu caminho artísticoexistencial. No entanto, a convencionalidade da narração, o viés didático da montagem e a colocação dos momentos mais chamativos no início tornam a duração pesada. Imprescindível como documento, mas um filme sobre Rogério Duarte jamais poderia ser careta.



Filme em cartaz ajuda a delinear o legado intelectual de Rogério Duarte


O designer e escritor foi uma das figuras-chave do tropicalismo

POR RODRIGO SOMBRA, ESPECIAL PARA O GLOBO

29/04/2018





Rogério Duarte, do filme "O tropikaoslista", de José Walter Lima - Divulgação




Um ano antes de morrer, o designer e escritor Rogério Duarte (1939-2016) sonhava em ser lembrado como um homem santo. Imaginava desprender-se do corpo e ver o próprio túmulo convertido em sítio de peregrinação. “Virão romarias aqui me visitar: ‘Aqui morou aquele asceta, Rogério, que foi um santo do pau oco’”, ele ri, balançando-se na rede da sede de sua fazenda em Santa Inês, interior da Bahia. A cena pode ser vista no documentário em cartaz “Rogério Duarte — O Tropikaoslista”, de José Walter Lima, e é emblemática da personalidade do artista, acostumado a jactar-se de seus feitos, mas também, nos momentos de leveza, capaz de rir da própria imodéstia. Então com 76 anos, magro, com uma boina enviesada na cabeça e um chumaço grosso de barba branca no rosto, Rogério é visto em boa parte do filme à vontade: rezando, ao violão, entre os animais no pasto, registros raros de uma vida notabilizada pela reclusão.

Rodado em 2015, o filme recupera o essencial da história de um dos ideólogos do tropicalismo, célebre por conferir identidade visual às capas de disco do movimento. Perpassa as atividades de Rogério como designer da UNE, a criação do icônico cartaz de “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964), a tortura sob o regime militar, as colaborações com Hélio Oiticica, e o mergulho definitivo na cultura hinduísta a partir da década de 1970. Um dos meios pelos quais se aproxima de seu protagonista é através da amizade com figuras como Glauber Rocha e os membros do grupo tropicalista. Porém, à diferença de documentários biográficos nos quais a personagem se faz presente nos depoimentos daqueles com quem conviveu, Lima opta por um relato depurado. Nele, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Paquito e Carlos Rennó comparecem lendo textos ou tocando músicas escritas por ou inspiradas no ex-parceiro, mas deles não escutaremos qualquer testemunho. É Rogério o único entrevistado do filme.

Lima e Rogério se conheceram na juventude e chegaram a morar juntos num apartamento em Copacabana, nos anos 1970. Autor de documentários sobre artistas como o músico Walter Smetak e o pintor Sante Scaldaferri, o diretor conta ter encontrado em seu personagem mais recente um comportamento profissional arredio.

— A gente quebrava o pau às vezes — relembra Lima, embora cenas de conflito não apareçam no filme — Rogério sempre foi de extremos. Às vezes ele falava “Eu sou muito importante, você não sabe com quem está falando”. Ao mesmo tempo dizia: “Você quer me documentar? Não sou nada, sou um fracassado”. Rogério tinha depressões terríveis, mas tinha dias em que estava ali, alegre.

Uma das preocupações do filme é delinear o pensamento de Rogério. Dispersas em entrevistas e ensaios, suas reflexões ganham nova encarnação no cinema.
Rogério deixou Salvador em 1960, aos 20 anos, e já ocupava posição destacada na intelligentsia carioca quando, anos mais tarde, Gil e Caetano chegaram ao Rio. Sua insubmissão aos ideários dominantes na política e na arte anteciparia o gosto pelo escândalo assumido posteriormente pelos outros tropicalistas.

— Ele já tinha uma envergadura intelectual que contribuía para um enriquecimento dos nossos modos de a ler realidade — relembra Gil ao GLOBO. — A configuração do que viria a ser a atuação tropicalista tinha muito a ver com essa dimensão que ele adquiriu na nossa vida. E sem medo da especulação intelectual como elemento escandalizador.

O gênio iconoclasta seria temperado com a conversão ao hare krishna. Com o tempo, sua prática religiosa se faria sentir como exercício intelectual no aprofundamento de seus estudos de sânscrito. Deste empenho resultariam publicações importantes, como a primeira tradução direta do épico hindu Bhagavad Gita, editada pela Companhia das Letras em 1998.

O interesse pela Índia, ao lado do xadrez e das partidas de ping-pong, era uma das afinidades entre Rogério e Moreno Veloso, seu afilhado.

— Era uma aventura ser afilhado de Rogério, porque ele era múltiplo, como fica evidente no filme. Poderia chegar na sua casa como hare krishna dançante, ou de terno e gravata como professor universitário. E todas essas vertentes eram o meu padrinho — ri Moreno.
Rogério tinha na música uma de suas áreas de atuação menos conhecidas.

— Acho que ele não se tornou um músico mesmo porque duvidava um pouco da capacidade que teria de se comunicar verdadeiramente com os públicos através da música — diz Gil.

Seu estudo de peças clássicas era acompanhado da produção de canções, entre elas “Gayana”, gravada por Caetano em seu último álbum de estúdio, Abraçaço (2012), e uma das únicas composições de Rogério a vir a público. Moreno recorda que pouco antes de morrer, ele dedicava-se a construir seu próprio violão.

Curiosamente, os desdobramentos mais recentes da obra de Rogério poderão ser sentidos no campo musical. Sob regência de Aldo Brizzi e participação de membros do Cortejo Afro, Gil prepara ópera inspirada no “Gitagovinda — A Cantiga do Negro Amor”, poema de Jayadeva traduzido e publicado de forma independente por Rogério em 2011. Escrito no século XII, o texto narra as peripécias eróticas de Krishna e figura nos píncaros da literatura indiana.

— Gosto da cultura vedanta. As interfaces entre deuses e homens, entre as coisas do mundo da beatitude celestial e as coisas mundanas — comenta Gil, a respeito do Gitagovinda.

Com estreia prevista para 2019, o espetáculo coroa o vínculo entre os companheiros de geração, cuja amizade configurou uma célula de investigação dos mundos orientais entre os tropicalistas.




CULTURA

Documentário resgata vida e obra de Rogério Duarte

27/04/2018 / Folhapress
CLAUDIO LEAL

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Num poema, o tropicalista Rogério Duarte (1939-2016) se declarou marginal porque "a margem fica dentro do Rio". Nome influente nos bastidores da contracultura no Brasil, à margem e dentro da tropicália, o designer baiano tem a sua trajetória apresentada pelo documentário "Rogério Duarte, o Tropikaoslista", de José Walter Lima, em cartaz nos cinemas.

A conversa exuberante de Duarte fascinou artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Hélio Oiticica e Glauber Rocha, dos quais se tornou um colaborador menos oculto do que gostava de alardear em defesa de sua marginalidade. 

Foi também criador do cartaz de "Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber, e das capas de discos tropicalistas de Gilberto Gil, Caetano Veloso e Jorge Mautner e Gal Costa, obras-primas do design nacional.

Ele se dizia mais próximo da estética de Oiticica, com quem organizou a mostra coletiva "Apocalipopótese", em 1968.

"Conheci Rogério no Solar da Fossa (pensão em Botafogo), no Rio, nos anos 1960. Resolvi fazer o documentário quando soube que ele estava muito doente [com câncer de garganta]", diz Lima, 69, ex-produtor do projeto de livro "Musicor", jamais concluído por Duarte na década de 1970. 

O diretor baiano de "O Tropikaoslista" foi assistente de direção de "Meteorango Kid" (1969), de André Luiz Oliveira, célebre longa do cinema marginal cujo cartaz psicodélico é assinado por Duarte.

Lima conferiu protagonismo ao designer na narração de sua própria vida, enquanto os parceiros tropicalistas surgem como intérpretes. Caetano canta a canção "Gayana", de Duarte -incluída no álbum "Abraçaço", de 2012-, e Gil toca a sua recente "Não Tenho Medo da Vida", nascida de um papo com o amigo.

"Procurei fugir da mesmice do documentário em que todo mundo fala. Como Rogério era brilhante, quem tinha que falar era ele mesmo. Optei pelo que poderia chamar de doc-arte, um cinema poético-político", diz o diretor.

O pensamento anavalhado de Duarte brilha em alguns trechos do documentário, que refaz um itinerário artístico traumatizado pela tortura sofrida ao lado de seu irmão Ronaldo, depois de sequestrados pelo Exército na saída da missa de sétimo dia do estudante Edson Luís, em 1968.

Sua contribuição à contracultura tem uma face visível, o design (cartazes do cinema novo -"A Idade da Terra", "Grande Cidade" e "Opinião Pública", do cinema marginal -"Cara a Cara"- capas de discos e desenho do jornal alternativo Flor do Mal.

A outra é refletida na obra alheia, influência exercida em diálogos livres de cerimônias.
"Há um componente político na tropicália que foi um pouco esquecido. Se formos falar do nosso tropicalismo, da tropicália do Hélio [Oiticica], também do Caetano, sem dúvida nenhuma... Não essa coisa que diz que é da música popular, que virou grife meio colonizada, também muito importante, mas [que] não tem a mesma contundência de protesto, de manifestação, de revolução, de transformação no nível político", afirma Duarte no filme.

Perto do fim, não parece autoindulgente: "Chafurdei na lama mesmo, entendeu? Não é humildade dizer isso, não. Porque quem sabe de mim sou eu. Sei o quanto sou luxurioso, mesquinho, avarento, invejoso, pirado, desconfiado e qualquer coisa a mais que você possa botar. Covarde, mentiroso... Acontece que eu não gosto [de ser assim]".

Ele morreu em 2016, mas chegou a ver o filme pronto, em Salvador, num sítio hare krishna, movimento ao qual pertencia desde os anos 1970.

Duarte traduziu do sânscrito o "Bhagavad Gita" e o poema "Gitagovinda", de Jayadeva -este, "A Cantiga do Negro Amor", deve virar uma ópera musicada por Gilberto Gil e Aldo Brizzi, maestro italiano. 

A viúva, Telma Duarte, quer organizar uma retrospectiva de sua obra gráfica e musical. Lima defende a atualidade do biografado: "É preciso fazer uma nova revolução cultural, mas agora uma permanente".





Cartaz original do filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), de Glauber Rocha

1965

1966

1966

1966

1967

1967


1968 - Capa do álbum

1968 - Capa do álbum

1969 - Capa do álbum

Cartaz do filme "Meteorango Kid, Herói Intergaláctico" (1969), de André Luiz Oliveira


1974 - Capa do álbum

1974 - Capa do álbum

1981 - Capa do álbum

2003 - Capa do álbum
















No hay comentarios:

Publicar un comentario