miércoles, 26 de febrero de 2014

2014 - Entrevista





Gira internacional: España.

Madrid: 29/5/2014: Teatro Circo Price 
Barcelona: 31/5/2014: Festival Primavera Sound




Entrevista realizada por correo electrónico con Marina Rossi, publicada en el periódico español el 25 de febrero de 2014.


Edición Brasil



 

“O pensamento conservador pode abordar coisas que as esquerdas recalcam”

● Em entrevista ao EL PAÍS, Caetano Veloso fala sobre política, as manifestações sociais, os Black Blocs e, claro, sua música, que ele considera "limitada"

● Os discos preferidos de Caetano Veloso

Marina Rossi - São Paulo - 25 FEV 2014




Caetano Veloso, durante um show. / Marcos Hermes

De seu nome, saiu o verbo Caetanear, na canção Sina, de Djavan. De sua imagem, saiu a música Debaixo dos Caracóis dos seus Cabelos, uma homenagem feita pelos amigos e cantores Erasmo Carlos e Roberto Carlos, quando Caetano estava no exílio, em Londres, na década de 1970. Ainda assim, Caetano Veloso se considera limitado. Acha que nenhum de seus discos é satisfatório para ele.

Em Outras Palavras, o músico se diz pouco responsável no trato com a música. Apesar disso, a Bossa Nova de Caetano é assim: uma mistura de música popular brasileira com a Bahia sob pano de fundo – sempre – misturado a um rock e pop originais. Ou não. Seu Som estrangeiro é bem recebido por diversas culturas do mundo por onde ele se apresenta. Ele Transa por universos desde os Beatles até artistas novatos brasileiros. Talvez por isso, sua música seja assim, livre de amarras e rotulagens. Algo meio Sem Lenço e Sem Documento.

Atualmente, Caetano trabalha na turnê de seu disco Multishow Ao Vivo - Caetano Veloso - Abraçaço, lançado em janeiro em CD, vinil e também disponível no iTunes. Em abril, começa a turnê internacional, que vai até junho, com shows em Madri, no dia 29 de maio no Teatro Circo Prine, e em Barcelona, no dia 31 de maio, no festival Primavera Sound.

Em entrevista concedida por e-mail ao EL PAÍS, o cantor de 71 anos, nascido na cidade baiana de Santo Amaro, falou sobre sua música, cultura, política, a Copa do Mundo, os Black Blocs e o envelhecimento. "Uma pessoa pode ser muito mais feliz aos 70 do que foi aos 20 anos", disse. Para Caetano, a vida manda um Abraçaço.

“Ao longo dos anos, cheguei à conclusão de que os estrangeiros aplaudem mais. O que não quer dizer que gostem mais

Pergunta - Você interpreta e grava hits dos Beatles, Michael Jackson, Nirvana e faz parcerias com artistas mais novos como Maria Gadú. Quais são os elementos que você acredita que fazem da sua música tão fresca, ao mesmo tempo que é um clássico da Música Popular Brasileira (MPB)?
Resposta - Vejo as coisas com menos otimismo do que você. Admiro enormemente outros músicos, mas a mim próprio me considero limitado. Talvez a impressão de frescor que você descreve venha do fato de eu não ser muito responsável no trato com a música.

P - Você acha que falta ousadia na MPB hoje?

“Não podemos conceber o mundo sem a presença cultural dos Estados Unidos.

R - Não. O pessoal do funk carioca experimenta muito. E é muito audacioso na abordagem de temas sexuais. Por outro lado, você encontra um Thiago Amud, que tem atitude vanguardista culta e excelente tratamento técnico. Também os jovens rappers, como Criolo e Emicida, apresentam trabalho inovador e formam um vasto público.

P - Você vai tocar no Primavera Sound em maio. Poderia contar um pouco sobre o que planeja levar para o festival?
R - Vou partir do que estou fazendo agora: a versão para palco do trabalho feito no disco "Abraçaço", junto à bandaCê, formada por Pedro Sá (guitarras), Ricardo Dias Gomes (baixo e eventuais teclados) e Marcelo Callado (bateria). Somos como uma banda de rock muito enxuta fazendo coisas novas e velhas, todas ligadas ao que venho apresentando há décadas. O resultado não é rock global e sim uma coisa rarefeita que, se os brasileiros terminaram por captar muito bem (os shows no Brasil fazem muito sucesso com um público de várias gerações), não sei quão inteligível pode ser para não-brasileiros.

P - Qual é a maior diferença entre o público brasileiro e o público estrangeiro?

“Centenas de milhares de pessoas nas ruas não significa que a maioria dos brasileiros rejeitam a Copa

R - Ao longo dos anos, cheguei à conclusão de que os estrangeiros aplaudem mais. O que não quer dizer que gostem mais. Os brasileiros já nos conhecem de perto e são um pouco blasé, além de os públicos de outros países terem uma noção de educação que os leva a pelo menos aplaudir suficientemente, se não há nítida desaprovação ou desinteresse. Eu costumava dizer que os brasileiros tinham, em média, menos proteína e ficavam com os braços cansados de bater palmas. Em Buenos Aires ou Milão, San Francisco ou Copenhague, os aplausos são maciços. E veja: isso de um artista que é conhecido no Brasil e pouco conhecido fora dele.

P - Muitos dos seus discos (Transa, Araçá Azul, Qualquer Coisa) figuram nas listas dos "melhores discos brasileiros da história", feitas por revistas especializadas em música, como a Rolling Stones. De todos eles, existe um que seja o seu preferido?
R - Antigamente eu dizia que meus favoritos eram Joia e Transa. Mas era assim porque eu não ouço meus discos para comparar. Livro, Circuladô, Cê, Fina Estampa" são discos posteriores àqueles e que, na minha memória, são ao menos tão bons quanto. Seja como for, nenhum é realmente satisfatório para mim.

P - Você menciona em seu livro - Verdade Tropical - que se dependesse de você, Elvis Presley e Marilyn Monroe nunca teriam se tornado estrelas. Você acredita que ainda temos uma cultura americanizada?

“Sempre olhei com desconfiança a ligação automática entre artistas e esquerdas

R - Eu, sozinho, não teria contribuído para o sucesso desses grandes artistas americanos. Mas isso é me descolar da realidade. Não podemos conceber o mundo sem a presença cultural dos Estados Unidos. Nossa cultura, hoje, é mais americanizada do que nunca: vivemos num mundo em que o inglês predomina, as guerras de força internas da cultura de massas dos Estados Unidos são vivenciadas em profundidade pelos receptores e atores culturais de todo o mundo.

P - Se as últimas manifestações estivessem ocorrendo na década de 1960, 1970, em qual lugar das ruas você estaria?
R - Nunca fui um ativista. Participei de manifestações contra a ditadura nos anos 1960. Eu simpatizava, de longe (uma amiga quase me levou para mais perto), com a luta armada em 1968, porque desejava uma esquerda alternativa à ortodoxia comunista orientada por Moscou. Mas nunca me vi praticando atos violentos. Tenho amigos jovens que saíram às ruas em junho e julho. Nenhum deles praticante de depredações. Quando das grandes manifestações do ano passado, a única ação a que me liguei foi a tentativa de pacificação radical das ruas, proposta por meu colega músico Sidney Waismann. Fomos falar com o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, e, em seguida, com os garotos da Mídia Ninja, um grupo de mídia alternativa. Uma moça Black Bloc, muito bonita, deu entrevista ao grupo de mídia alternativo e foi fotografada por uma revista de grande tiragem. Eu tinha escrito, em minha coluna de jornal, sobre sua beleza. Os meninos da Mídia Ninja me disseram que a garota tinha gostado do que eu escrevera. Eles me pediram para tirar uma foto para eles darem à garota. Já diante da câmera, um deles me pediu para amarrar uma camisa preta sobre o rosto, para ficar como ela aparecia nas fotos. Atendi. À noite, em casa, vi que eles tinham postado minha foto. Todos os articulistas de direita disseram que eu apoiava os Black Blocs. Mas tinha sido um atitude ingênua. Agora, faz pouco mais de uma semana, dois pobres rapazes soltaram um rojão em resposta à presença da polícia aqui no Rio e um cinegrafista de TV foi mortalmente atingido. Eles não eram Black Blocs e tudo indica que não miraram o jornalista. Mas a imprensa reagiu de modo enfurecido e permitiu toda sorte de simplismo na interpretação do fato.

P - Acha que as manifestações contra o Brasil sediar a Copa são legítimas? Qual é a sua posição sobre isso?

“Eu votaria em Marina Silva, se ela tivesse conseguido criar o partido que planejou

R – O povo adora futebol mas não está se sentindo bem com essas desproporções. Quem reclama tem toda razão em reclamar. Centenas de milhares de pessoas nas ruas não significa que a maioria dos brasileiros rejeitam a Copa. Mas a maioria esmagadora aprovou os protestos, quando arguida em pesquisas de opinião. O coração dos brasileiros está dividido. Na Copa da Confederações o Maracanã ficou cheio, mas houve protestos no seu entorno, com enfrentamento da polícia. A frase "Não vai ter Copa" é repetida nas ruas e nas redes sociais. Sabemos que vai ter Copa. Mas não será a apoteose que se esperava quando o Brasil, que tinha sido capa de The Economist, era visto como a bola da vez.

P - Em uma de suas colunas no O Globo, você diz: "Nem acho que o conservadorismo seja necessariamente um mal". Você sempre pensou assim, ou acha que no últimos anos tem estado mais ponderado?
R - Sempre olhei com desconfiança a ligação automática entre artistas e esquerdas. Mas sempre estive mais para a esquerda. Aprendi com meu pai, que temia os anticomunistas por ter visto a ação de grupos fascistas nacionais, que seguiam Mussolini e Hitler nos anos 1930. Além disso, desejo que se superem as estruturas opressivas de todo tipo. Não tenho temperamento conservador. Mas desde o final dos anos 1960 me vi obrigado a pensar com mais responsabilidade sobre essas questões. E percebi que o pensamento conservador pode abordar muitas coisas que as esquerdas recalcam. Acho perigoso e empobrecedor que esquerdistas só leiam autores de esquerda.

P - Como você vê o cenário político nesse ano eleitoral? Já tem candidato a presidente?

“Envelhecer implica uma decadência física sem volta e isso tem de ser encarado pelo que é

R - Eu votaria em Marina Silva, se ela tivesse conseguido criar o partido que planejou. Tenho grande respeito pelo seu histórico e votaria nela em homenagem a isso. Gosto de todos os outros candidatos. Conheço Eduardo Campos por ele ser parente de grandes amigos meus. Ele fez muito bom governo em Pernambuco. Aécio Neves também fez excelente governo em Minas Gerais. Gosto de Dilma, embora ache que o governo dela não tenha conseguido ser muito produtivo. Dadas as condições internacionais e as amarras políticas internas - além dos preconceitos ideológicos - ela parece agora mais representar uma saturação do período PT de nossa república. É quase certo que ela se reelegerá, no entanto. Se for assim, tomara que ela tenha forças para mudar as políticas. Há quem diga que, diante da grande instabilidade, Lula vai voltar. Se ele voltar, não tem pra ninguém. Há rumores de que um partido mais à esquerda apresentará candidatura de peso. Se isso acontecer, vou prestar muita atenção ao novo quadro. Desejo é que, seja quem for, algo possa se dar que faça bem ao Brasil.

P - Sobre a questão das biografias (Em 2013, o grupo Procure Saber, do qual Caetano e outros artistas fazem parte, saiu em defesa de uma revisão na lei que permite a publicação de biografias não-autorizadas), qual é a sua posição hoje? Se eu, por exemplo, quisesse publicar uma biografia sua, como você reagiria?
R - Reagiria com isenção. Nunca mudei a respeito. Todos os meus amigos sabem que sou, por princípio, pelas biografias livres. Muitos deles não são. No Procure Saber minha posição era diferente da maioria. Mas detestei o modo como a imprensa tratou o caso. E não acho que a mera supressão dos artigos 20 e 21 do Código Civil seja solução madura. As questões levantadas pelos meus colegas são pertinentes e devem ser discutidas com serenidade.

P - No documentário Uma noite em 67, você fala que uma das coisas que mais sente falta da juventude é da elasticidade do corpo. Quais outras saudades você tem da juventude?
R - Essas são as saudades mais fortes. A alegria física da juventude é uma verdade incontornável. Meu corpo era mais elástico e tudo nele se recuperava mais rapidamente. Envelhecer implica uma decadência física sem volta e isso tem de ser encarado pelo que é. Faço shows e discos e canções, vivo, não me dedico a lamentar a perda da juventude, mas não posso negar o que é evidente. É verdade também que nada diz que essa alegria física básica sustente a felicidade pessoal de ninguém. Nem que o envelhecimento impeça a alegria e o prazer de estar vivo. Uma pessoa pode ser muito mais feliz aos 70 do que foi aos 20. Há muitos fatores que contribuem para a felicidade. Ter conseguido muitas coisas, realizado algumas e superado outras mais é experiência que raramente os jovens podem ter

P - O Sol (jornal publicado durante a ditadura militar no Brasil) já não existe mais, mas os jornais nas bancas de revista ainda te enchem de alegria e preguiça?
R - Eu tinha mais preguiça na época em que escrevi a canção. Hoje leio ao menos dois jornais diários. Naquela época eu quase não lia nada nos jornais. A alegria, no entanto, é semelhante. Olho a banca de revistas nos aeroportos e fico excitado. E recebo os dois jornais que assino com animação e curiosidade. Todos os dias. A imprensa produz uma alegria social básica. Nem todas as querelas que a gente tem com ela podem empanar isso.



 
Os discos preferidos de Caetano Veloso

De muitas músicas é feito o repertório de Caetano Veloso. "O pessoal do funk carioca experimenta muito. E é muito audacioso na abordagem de temas sexuais", diz, dando um exemplo do que anda ouvindo. "Por outro lado, você encontra um Thiago Amud, que tem atitude vanguardista culta e excelente tratamento técnico. Também os jovens rappers, como Creiolo e Emicida, apresentam trabalho inovador e forma um vasto público", completa.

Em sua lista, Caetano elenca, além do funk, o axé music, "a música popularesca do carnaval da Bahia, que pega uma tradição que era forte no Rio dos anos 1950 e a reatualiza repetidas vezes, desde os anos 1970", explica. "Gosto de coisas que são fenômenos comerciais. E encontro espírito de busca na geração de meu filho, Moreno, e em alguns muito mais jovens. Música popular é uma forma de divertimento que sempre foi forte no Brasil".

Apesar do gosto eclético, o músico fez uma lista para o EL PAÍS dos seus discos preferidos:



 
● Caymmi e seu violão (1959), de Dorival Caymmi

 
● Chega de saudade (1959), O amor, o sorriso e a flor (1960) e João Gilberto (1961), os três primeiros álbuns de João, que inauguraram o que se chamou de bossa nova

 
● Ben (1972), de Jorge Ben



● Clube da Esquina (1972), de Milton Nascimento e Lô Borges


 
● Ou não (1973), de Walter Franco


 
● Brasileirinho (2003), de Maria Bethânia


  
● Coisas (1965), de Moacir Santos


 
● Quem é quem (1973), de João Donato



 
● Falso brilhante (1976), de Elis Regina


 
● Recanto (2011), de Gal Costa


 
● O passo do Lui (1985), dos Paralamas do Sucesso


 
● Cabeça dinossauro (1986), dos Titãs


"Isso se tivermos que nos ater aos álbuns, que só aparecem depois da invenção do LP", diz.  

"Há discos de apenas duas canções, em 78 rotações, em que apenas uma, em geral, se tornou sucesso, e que não podem estar fora de nenhum lista: Adeus batucada, de Carmen Miranda; vários de Orlando Silva; vários de Ciro Monteiro; vários de Jackson do Pandeiro; vários de Luiz Gonzaga; a série de sambas de Noel Rosa cantados por Aracy de Almeida"

1935 - Carmen Miranda



Edición España
  
 



“El pensamiento conservador puede abordar cosas que la izquierda reprime”


● En entrevista con EL PAÍS, Caetano Veloso habla sobre política, manifestaciones, el Mundial y, por supuesto, de su música, que considera "limitada"


Marina Rossi - São Paulo - 25 FEV 2014

De su nombre salió el verbo Caetanear, en la canción Sina, de Djavan. De su imagen salió la canción Debaixo dos Caracóis dos seus Cabelos, un homenaje de sus amigos y cantantes Erasmo Carlos y Roberto Carlos, cuando Caetano estaba en el exilio, en Londres, en la década de 1970. Aun así, Caetano Veloso se considera limitado. Dice que ninguno de sus discos le acaba de gustar del todo.



En su disco Outras Palavras, el músico se considera poco responsable en el trato con la música. A pesar de eso, la Bossa Nova de Caetano es así: una mezcla de música popular brasileña con Bahia –siempre– como escenario mezclado con un rock y pop originales. O no. Su Som estrangeiro es bien recibido por diversas culturas del mundo donde se presenta. Él se mueve por universos como el de los Beatles y por el de nuevos artistas brasileños. Tal vez por eso su música sea así, libre de amarras y etiquetas. Algo como Sem Lenço e Sem Documento.



Actualmente, Caetano trabaja en la gira de su disco Multishow En vivo - Caetano Veloso - Abraçaço, lanzado en enero en CD, vinilo y también disponible en iTunes. En abril comienza la gira internacional, que durará hasta junio, con shows en Madrid (el día 29 de mayo en el Teatro Circo Price) y en Barcelona (el día 31 de mayo, en el festival Primavera Sound).



En una entrevista concedida por correo electrónico a EL PAÍS, el cantante de 71 años, nacido en la ciudad bahiana de Santo Amaro, habló sobre su música, cultura, política, el Mundial, el movimiento de protesta de los Black Bloc y el proceso de envejecer. "Una persona puede ser mucho más feliz a los 70 de lo que lo fue a los 20 años", dice. Para Caetano, la vida le manda a uno un Abraçaço (un gran abrazo).

A lo largo de los años, llegué a la conclusión de que los extranjeros aplauden más. Lo que no quiere decir que les guste más

Pregunta. Usted interpreta y graba hits de los Beatles, Michael Jackson, Nirvana y colabora con artistas más nuevos como Maria Gadú. ¿Cuáles son los elementos que hacen de su música algo tan fresco y que, a la vez, sea un clásico de la Música Popular Brasileira (MPB)?

Respuesta. Veo las cosas con menos optimismo que usted. Admiro enormemente a otros músicos, pero yo me considero limitado. Tal vez la impresión de frescura que describe venga del hecho de que no soy muy responsable en el trato con la música.



P. ¿Cree que hoy en día falta osadía en la MPB?

R. No. La gente del funk carioca experimenta mucho. Y son muy audaces en el abordaje de temas sexuales. Por otro lado, te encuentras a Thiago Amud, que tiene actitud vanguardista culta y excelente tratamiento técnico. También los jóvenes raperos, como Criolo y Emicida, presentan un trabajo innovador y tienen un público amplio.



No podemos concebir el mundo sin la presencia cultural de EE  UU


P. Va a tocar en el Primavera Sound en mayo. ¿Qué planea llevar al festival?

R. Voy a partir de lo que estoy haciendo ahora: la versión para escenario del trabajo realizado en el disco Abraçaço, junto a la banda Cê, formada por Pedro Sá (guitarras eléctricas), Ricardo Dias Gomes (bajo y teclados) y Marcelo Callado (batería). Somos como una banda de rock muy pequeña haciendo cosas nuevas y viejas, todas conectadas a lo que vengo presentando hace décadas. El resultado no es rock global y sí una cosa leve que, si los brasileños terminaron por captar muy bien (los shows en Brasil tienen mucho éxito con un público de varias generaciones), no sé cuán inteligible puede ser para no brasileños.

P. ¿Cuál es la mayor diferencia entre el público brasileño y el público extranjero?

R. A lo largo de los años llegué a la conclusión de que los extranjeros aplauden más, lo que no quiere decir que les guste más. Los brasileños ya nos conocen de cerca y son un poco más indiferentes, además de que los públicos de otros países tienen una noción de educación que le lleva a, por lo menos, aplaudir lo suficiente, a no ser que no haya una nítida desaprobación o desinterés. Yo solía decir que los brasileños tenían, en general, menos proteína y se les cansaban los brazos al aplaudir. En Buenos Aires o Milán, San Francisco o Copenhague, los aplausos son firmes. Y vea: eso lo dice un artista conocido en Brasil y poco conocido fuera.

Centenas de miles de personas en las calles no significa que la mayoría de los brasileños rechacen la Copa

P. Muchos de sus discos (Transa, Araçá Azul, Qualquer Coisa) figuran en las listas de los "mejores discos brasileños de la historia" hechas por revistas especializadas en música, como la Rolling Stone. ¿Tiene algún preferido?

R. Antiguamente decía que mis favoritos eran Joia y Transa. Pero era así porque yo no oigo mis discos para comparar. Livro, Circuladô, Cê, Fina Estampa son discos posteriores a eso y que, en mi memoria, me parecen igual de buenos. De cualquier forma, ninguno me satisface realmente.



P. Usted menciona en su libro Verdade Tropical que, si dependiera de usted, Elvis Presley y Marilyn Monroe nunca se habrían convertido en estrellas. ¿Cree que aún tenemos una cultura americanizada?

R. Yo no habría contribuido al éxito de esos grandes artistas americanos. Pero eso es despegarme de la realidad. No podemos concebir el mundo sin la presencia cultural de Estados Unidos. Nuestra cultura, hoy, está más americanizada que nunca: vivimos en un mundo en que el inglés predomina y los receptores y actores culturales de todo el mundo viven con intensidad las guerras de fuerza internas de la cultura de masas de EE UU.


Sempre miré con desconfianza la conexión automática entre artistas e izquierda

P. ¿Si las últimas manifestaciones de Brasil estuvieran ocurriendo en la década de los sesenta y setenta, en qué lugar estaría?

R. Nunca fui un activista. Participé en manifestaciones contra la dictadura en los sesenta. Simpatizaba, de lejos (una amiga estuvo a punto de acercarme más) con la lucha armada en 1968, porque deseaba una izquierda alternativa a la ortodoxia comunista orientada por Moscú. Pero nunca me vi practicando actos violentos. Tengo amigos jóvenes que salieron a las calles en junio y julio. Ninguno de ellos destrozaba nada. Con las grandes manifestaciones del año pasado, la única acción a la que me uní fue a la tentativa de pacificación radical de las calles, propuesta por mi compañero músico Sidney Waismann. Fuimos a hablar con el secretario de Seguridad de Río, José Mariano Beltrame, y, después, con los chicos de Mídia Ninja, un grupo de periodistas alternativo. Una joven Black Bloc, muy guapa, dio una entrevista al grupo y fue fotografiada por una revista con mucha repercusión. Yo había escrito en mi columna del periódico sobre su belleza. Los chicos de Mídia Ninja me dijeron que a la chica le gustó lo que había escrito. Me pidieron que me hiciese una foto para dársela. Ya delante de la cámara, uno de ellos me pidió que me tapase el rostro con una camisa negra, para aparecer como ella en las fotos. Acepté. Por la noche, en casa, vi que habían publicado mi foto. Todos los columnistas de derecha dijeron que yo apoyaba a los Black Bloc. Pero lo mío había sido una actitud ingenua. Ahora, hace poco más de una semana, dos pobres muchachos soltaron un petardo, en respuesta a la presencia de la policía aquí en Río, que golpeó mortalmente a un cámara de televisión. Ellos no eran Black Bloc y todo indica que no atacaron al periodista. Pero la prensa reaccionó enfurecida y permitió toda suerte de simplismos en la interpretación del hecho.



P. ¿Cree que las manifestaciones contra que Brasil sea anfitrión del Mundial son legítimas? ¿Cuál es su posición?

R. El pueblo adora el fútbol pero no se siente bien con las desproporciones. Quien reclama tiene toda la razón. Centenas de miles de personas en las calles no significa que la mayoría de los brasileños rechacen la Copa. Pero una inmensa mayoría aprobó las protestas cuando les preguntaron en las encuestas de opinión. El corazón de los brasileños está dividido. En la Copa Confederaciones el Maracaná se llenó, pero hubo protestas en los alrededores, con enfrentamientos con la policía. La frase "No habrá Mundial" se repite en las calles y en las redes sociales. Sabemos que va a haber Mundial. Pero no será la apoteosis que se esperaba cuando Brasil, que había sido portada de The Economist, se veía como el país de moda.

Yo votaría a Marina Silva, si hubiera conseguido crear el partido que planeó

P. En una de sus columnas en el diario O Globo usted dice: "No creo que el conservadurismo sea necesariamente un mal". ¿Usted siempre pensó así, o cree que en los últimos años ha estado más ponderado?

R. Siempre vi con desconfianza la conexión automática entre artistas e izquierdas. Pero siempre estuve más a la izquierda. Aprendí con mi padre, que temía los anticomunistas por haber visto la acción de grupos fascistas nacionales, que seguían a Mussolini y Hitler en los años 30. Además, deseo que se superen las estructuras opresivas de todo tipo. No tengo temperamento conservador. Pero desde el final de los sesenta me vi obligado a pensar con más responsabilidad sobre esas cuestiones. Y me di cuenta de que el pensamiento conservador puede abordar muchas cosas que la izquierda reprime. Considero peligroso y empobrecedor que los izquierdistas solo lean autores de izquierda.



P. ¿Como ve el escenario político en este año electoral? ¿Ya tiene candidato a presidente?

R. Yo votaría a Marina Silva si ella hubiera conseguido crear el partido que planeó. Tengo gran respeto por su historial y votaría por ella como homenaje. Me gusta el resto de candidatos. Conozco a Eduardo Campos porque es pariente de grandes amigos míos. Tuvo un buen gobierno en Pernambuco. Aécio Neves también tuvo un excelente gobierno en Minas Gerais. Me gusta Dilma, aunque creo que su Ejecutivo no ha conseguido ser muy productivo. Dadas las condiciones internacionales y las amarras políticas internas -además de los prejuicios ideológicos- Rousseff parece representar ahora una saturación del periodo del Partido de los Trabajadores de nuestra República. Sin embargo, es casi seguro que será reelegida. Si es así, ojalá tenga fuerzas para cambiar la política. Hay quien dice que, ante la gran inestabilidad, Lula va a volver. Si regresa, no hay disputa. Hay rumores de que un partido más a la izquierda presentará una candidatura de peso. Si eso sucede, voy a prestar mucha atención al nuevo escenario. Mi deseo es que, sea quien sea, pueda darse algo que haga bien a Brasil.

Envejecer implica una decadencia física sin marcha atrás y eso tiene que ser encarado como lo que es

P. Sobre la cuestión de las biografías (En 2013, el grupo Procure Saber, del que Caetano y otros artistas forman parte, salió en defensa de una revisión de la ley que permite la publicación de biografías no autorizadas), ¿cuál es su postura hoy? Si yo, por ejemplo, quisiera publicar una biografía suya, ¿cómo reaccionaría?

R. Reaccionaría con imparcialidad. Nunca cambié al respecto. Todos mis amigos saben que estoy, por principios, a favor de las biografías libres. Muchos de ellos no lo son. En el grupo Procure Saber mi posición era diferente de la mayoría. Pero detesté la manera en la que la prensa trató el caso. Y no creo que la mera supresión de los artículos 20 y 21 del Código Civil sea la solución madura. Las cuestiones propuestas por mis compañeros son pertinentes y deben ser discutidas con serenidad.



P. En el documental Uma noite em 67 dice que una de las cosas que más echa en falta de la juventud es la elasticidad del cuerpo. ¿Qué otras cosas echa de menos de su juventud?

R. Esas son las carencias más fuertes. La alegría física de la juventud es una verdad irrefutable. Mi cuerpo era más elástico y todo en él se recuperaba más rápidamente. Envejecer implica una decadencia física sin marcha atrás y eso tiene que ser encarado como lo que es. Doy conciertos y hago discos y canciones, vivo, no me dedico a quejarme de la pérdida de la juventud, pero no puedo negar lo evidente. Es cierto también que nada dice que esa alegría física básica sostenga la felicidad personal de nadie. Ni que el envejecimiento impida la alegría y el placer de estar vivo. Una persona puede ser mucho más feliz a los 70 de lo que lo fue a los 20. Hay muchos factores que contribuyen a la felicidad. Haber conseguido muchas cosas, realizado algunas y superado otras es una experiencia que raramente los jóvenes pueden tener.



P. O Sol (periódico publicado durante la dictadura militar en Brasil) ya no existe, pero los periódicos en los quioscos... ¿aún le llenan de alegría y pereza?

R. Tenía más pereza en la época en la que escribí la canción. Hoy leo al menos dos periódicos al día. En aquella época casi no leía nada en los diarios. La alegría, sin embargo, es parecida. Miro el quiosco en los aeropuertos y me deja excitado. Y recibo los dos periódicos a los que estoy suscrito con animación y curiosidad. Todos los días. La prensa produce una alegría social básica. Ni todas las quejas que la gente tiene contra ella pueden empañar eso.